13 de dezembro de 2025
OPINIÃO

Por que é tão difícil mudar?


| Tempo de leitura: 3 min

Ultimamente tenho repetido com muita frequência para meus amigos e pacientes a frase de um eminente psicólogo e psicanalista, onde diz que “o inconsciente pode ter péssimo gosto, mas uma ótima memória”. Ele se refere a observação do quão aderidas as pessoas são aos seus hábitos e manias, mesmo que elas sejam tóxicas ou prejudiciais.

O momento também é muito propício para esse assunto, pois comemoramos a chegada da primavera, estação que se caracteriza pela mudança de uma condição de quietude e acolhimento do inverno para o renascimento da vida e do movimento em direção ao desenvolvimento e expansão.

Durante o mês falamos sobre o tratamento da obesidade e como novas tecnologias em medicações facilitam o “virar a chave” do nosso corpo e metabolismo para que ele funcione como se estivesse saciado de comida o tempo todo. Isso acaba transformado as dietas de obstáculos intransponíveis para uma obrigatoriedade automática, já que não se consegue comer normalmente com o uso destas medicações, nem que se tente.

Muitos de meus amigos e colegas da área da saúde se vangloriam de “mais uma vitória para a ciência” que traz a vida para a humanidade, tal como Prometeu que nos agraciou com o fogo sagrado. Eu costumo ser um pouco “estraga-festas” e lembro que Carl G. Jüng falava que a ciência é uma excelente ferramenta de descoberta, mas é incapaz de nos dirigir pela vida.

O mesmo C.G. Jüng nos apresentou a existência de uma parte do nosso ser, muito atuante, chamada de inconsciente. Sob este nome, estão várias características que são tremendamente atuantes na nossa vida, mas que são percebidas como acaso e “coincidência” porque, como o nome diz, não temos contato direto, claro e consciente com suas necessidades.

Ele se manifesta nas nossas atitudes e sobre o nosso corpo. Ele atua sobre o nosso sistema nervoso, principalmente nas partes “automáticas”, como digestão e intestinos, sobre o nosso sistema de hormônios, o chamado endócrino.

Nosso corpo aprende as necessidades manifestas (mas não reconhecidas) do inconsciente, que tenta compensar, por exemplo, carências de carinho e acolhimento com uma compulsão por doces. O mesmo corpo se acostuma a liberar a adrenalina por conseguir satisfazer essa carência momentaneamente com um bolo de chocolate e libera neurotransmissores como a dopamina no nosso cérebro para dar-nos o prazer da recompensa.

A esse processo se segue uma emoção de culpa, um sentimento de arrependimento, aberturas para comportamentos de punição (diminuindo a autoestima) e, depois de sofrer com a expiação e a dor, o indivíduo se sente pronto para procurar satisfazer seu desejo novamente com novas crises de compulsão.

Caso esse raciocínio o tenha parecido um pouco intrincado, é porque se trata de algo complexo, mesmo. Aliás, Freud usou essa palavra, “complexo”, para falar destes círculos viciosos da nossa mente.

Ora, por que não paramos simplesmente de agir assim? Nosso corpo é “viciado” na química hormonal envolvendo tudo isso. É dolorosa, mas tem suas partes recompensadoras. Nos acostumamos a viver de migalhas de felicidade, achamos que a vida é assim e estranhamos quando tentamos mudar, mesmo que seja para melhorar.

Moduladores de apetite não resolvem as dores que vêm de um vazio que não é validado, isso é fato. Silenciá-lo tirando o incômodo da obesidade o fará manifestar-se de outra maneira, até que seja ouvido pela consciência ordinária.


Dr. Alexandre Martin é médico, especialista em acupuntura e com formação em osteopatia e medicina tradicional chinesa