Assusta-me a “maioridade dos 12 anos”, ou seja, a possibilidade daquela ou daquele que mal saiu da infância escolher ficar na rua, no contraturno escolar, em lugar de se ocupar em algo sob os cuidados de adultos.
Para isso acontecer só é possível com o consentimento do responsável da família. Mais ou menos assim: “Vou perguntar para ele (ela) o que prefere e depois lhe respondo”.
Livre de seus limites, conforme a maneira de sua criação, preferirá a rua com os prazeres que lhe oferece não importam os perigos.
Na rua é possível jogar bola com os que não se enquadram em áreas demarcadas para sua idade, andar de skate e bicicleta,soltar pipa com linha cortante sem horário determinado, encontrar dinheiro perdido nas sarjetas, conversar com os amigos sem ninguém ouvir, brincar com joguinhos no celular e ver outras coisas sem interrupção. É possível ir à pracinha ou ao ‘rapadão’, observar o bar do funk, andar para lugares mais longe, ver os carros dos mais simples aos mais modernos. Na rua há adrenalina, excitação, mistério, coisas proibidas e há, ainda, “evolução” para o mundo dos maiores.
Convites diferentes não faltam.
É possível experimentar um pod, cigarro eletrônico (vape ou vaporizador), considerado mais fácil de usar e mais discreto do que os vapes maiores.Os sabores são muitos como aloe grape, banana ice, algodão doce, uva roxa, maçã verde, menta ice... Existem também os de maconha.
As ruas contêm um mundo diferente e alimentam ilusões de MC Ryan com “Festa em alto mar/ Um brinde pros verdadeiro/ Que nunca falte dinheiro/ Se faltar, nóis vai buscar” ou em conjunto com MC Paiva e DJ Kotim “É sempre assim/ Posso até sair sozinho, mas sozinho não volto/ Tropa sempre mastigando/ Das grandonas que eu mais gosto/ Enquanto ele lança carro, nóis ronca de helicóptero...”. Ou: “Eu entrei no crime porque/ Minha mãe tava sem condições, tá ligado? / (...) Acabou meu plantão na boca, eu vou pro baile curtir (...) Tô fumando altos baseados com os parceiros (...) Este garoto é chamado de aviãozinho ou vapor/ Menor cheio de ódio na boca trafica (...)Pá-pum, pá-pum (...) Droga vende e rende mais que banco de Itaú...”
Que triste não constatar que a rua oferece despenhadeiros com seus prazeres danosos.
Embora possua meus desencantos, sou mais da esperança. Ao não conseguir um olhar diferenciado de menores ou maiores a respeito do que arruína a vida de uma pessoa, coloco-os em minhas preces.
Neste momento reflito sobre uma colocação do padre Márcio Felipe de Souza Alves, reitor e pároco no Santuário Diocesano Santa Rita de Cássia, em sua homilia na Novena do Senhor Bom Jesus em Pirapora. “Somos Peregrinos das Esperança. (...) Quem caminha também se perde. (...) A nossa história, muitas vezes, é marcada por desencontros. (...) Quantas pessoas se perdem nos labirintos da solidão, da indiferença, da ausência de fé. (...) Mas o Senhor Bom Jesus permite que, mesmo depois de nossos desencontros, reencontremos o caminho”.
Que os meninos e as meninas que se iludem com o prazer pelo prazer, consigam se afastar de teias peçonhentas.
Maria Cristina Castilho de Andrade é professora e cronista (criscast@terra.com.br)