Vivemos rodeados por sons. Ruídos externos, buzinas, celulares, notícias, músicas, vozes. E também ruídos internos…pensamentos acelerados, preocupações, angústias e por aí vai. O silêncio, por sua vez, parece ter se tornado um lugar estranho para muita gente. Basta entrarmos em casa e logo ligamos a televisão. No carro, é automático: rádio ou playlist. Mesmo nos momentos de lazer, buscamos companhia sonora para tudo. Mas será que lembramos como é estar em silêncio?
Silenciar é mais do que a ausência de som. É criar um espaço. Um espaço dentro de nós onde mora a escuta, a clareza, a criatividade, a paz e a reconexão. É nesse silêncio que, muitas vezes, conseguimos nos perceber de verdade.
Hoje, por exemplo, eu estava irritada, impaciente, com a mente agitada. Precisava voltar ao meu centro. Respirei, rezei, pedi clareza. E foi no silêncio que retornei a mim. Que pude entender minhas emoções e, ao invés de reagir no impulso, pude me alinhar. Esse é o poder do silêncio: ele nos traz de volta para “casa”, ou melhor, para dentro.
Estudos científicos mostram que o silêncio é capaz de reorganizar o cérebro. Um deles, publicado no Brain Structure and Function Journal, demonstrou que dois minutos de silêncio aumentam significativamente a atividade no hipocampo, a área associada à memória, ao aprendizado e ao processamento emocional.
O silêncio também modula o sistema nervoso autônomo, principalmente o ramo parassimpático, responsável por restaurar e equilibrar o organismo. Isso significa que, ao silenciarmos, saímos do modo de “luta ou fuga” (sistema simpático) e entramos em um estado de recuperação e presença. O corpo relaxa. A mente clareia. A respiração se aprofunda.
Você já tentou observar sua respiração em silêncio, sem julgamentos? Inspirar, expirar, apenas sentir? Esse simples ato tem o poder de regular o nervo vago, eixo fundamental do nosso bem-estar emocional e fisiológico. Ao respirar com consciência e em silêncio, ativamos circuitos cerebrais de calma e segurança. A mente desacelera, o coração encontra ritmo, o corpo se alinha.
É por isso que a meditação, a oração, o mindfulness e as práticas contemplativas, como caminhar em silêncio ou nadar ouvindo apenas o som da água, são tão potentes. Muitas vezes busco o silêncio me exercitando, sinto isso quase como uma sessão “descarrego”, quando é preciso suar e prestar mais atenção em mim mesma, nos ritmos do meu corpo tanto no exercício, como pós-exercício, é delicioso! São práticas como estas que nos colocam em contato direto com a nossa essência.
Sinto que o movimento em silêncio é um convite à presença. Ao correr sozinha, caminhar em meio à natureza, praticar natação ou fazer alongamentos conscientes, oferecemos ao corpo uma escuta ativa. Percebemos tensões, emoções guardadas, padrões repetitivos e ao mesmo tempo, ganhamos clareza, discernimento e paz.
Nem sempre é confortável. O silêncio, às vezes, nos confronta com o que evitamos sentir. Mas é exatamente por isso que ele é necessário. No silêncio, a verdade aparece e com ela, a possibilidade de ressignificar, de curar padrões necessários.
Silenciar é um ato revolucionário. Num mundo que grita o tempo todo, escolher o silêncio é escolher a si mesmo. É dizer: “me escuto antes de escutar o mundo”. E isso não significa isolar-se, mas aprender a ouvir a própria voz interna antes de seguir qualquer ruído externo.
Talvez a maior forma de cuidado que possamos oferecer a nós mesmos seja criar momentos de pausa, respiração e silêncio. É momento de entendimento para tomar decisões mais conscientes, o espaço para a criatividade florescer, o encontro com a paz que tanto buscamos fora, mas que sempre esteve dentro de nós. Muita saúde a todos.
Liciana Rossi é especialista em coluna e treinamento desportivo, pioneira do método ELDOA no Brasil (licianarossi@terra.com.br)