13 de dezembro de 2025
OPINIÃO

O discurso da inclusão sem a prática 


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A série Super Homem é muito popular, inclusive, entre os mais jovens. As aventuras do heroi são conhecidas pela sua força física superior à das pessoas. Corajoso, valente, senso de justiça e amor pelos humanos. No entanto, com uma fragilidade que pode ser mortal. Ao ser exposto a pedra Kryptonita, um fragmento mineral radioativo originado pela explosão do seu planeta natal, enfraquece seus poderes, embora seja inofensiva para os terráqueos.

As palavras do vocabulário brasileiro, ultimamente, têm perdido sua simbologia e força exatamente como nosso herói.  São excessivamente expostas, muitas vezes fora de contexto, ou em cenários vagos que fazem com que elas se percam na imensidão de narrativas vazias e superficiais, “xerocadas” em nossa mente, paradoxalmente, desafiando a razão e anestesiando a reflexão.

Vivemos uma era em que se fala cada vez mais sobre inclusão, diversidade, empatia e diálogo. As campanhas são extensamente difundidas pelas mídias sociais, blogs, filmes, livros. Vídeos com imagens emocionantes e até apelativas que tentam capturar a atenção e adesão para causas nem sempre verdadeiras. Na prática, o que se vê é uma contradição entre o discurso e a atitude.

Dizemos que valorizamos pontos de vista diversos, mas interrompemos ou simplesmente ignoramos quem pensa diferente. Parece que a inclusão é seletiva. Compartilhamos frases sobre empatia, contudo, cancelamos colegas que não compartilham as mesmas opiniões ou estilos. Falamos de escuta ativa, mas já entramos em reuniões com julgamentos formados. Hipocrisia relacional? Elegante, polida, com bons argumentos, ainda assim é hipocrisia.

Hipocrisia é “uma palavra derivada do grego com o sentido de dissimulação, fingimento, falsidade. Característica de algo ou alguém que não é honesto; desonestidade: a hipocrisia do discurso” (dicionário da Língua Portuguesa).

As palavras têm vida própria. Cada uma delas com um significado. Podem contar um acontecimento, levantar hipóteses e examiná-las, planejar um trabalho, ou a própria vida, inventar uma história, representar no teatro, criar ou resolver enigmas, traduzir, cumprimentar, orar, imaginar metáforas, poetar, comandar, implorar, comunicar-se com outros, escrever, persuadir, ensinar, prometer, orientar a ação, avaliar comportamentos e pessoas e muito mais ...

Acredito que estejamos nos perdendo no meio de tantas opções. É como se estivéssemos bombardeados pela pedra Kryptonita do Superman, mas aquela que atinge e enfraquece a inteligência humana, e faz com que se deixem levar levianamente pelo contexto externo (influencers), permitindo aflorar o egoísmo ao ponto de se perder a noção de coletividade.

Uma regra de ouro, tão presente em tradições filosóficas e religiosas, propõe uma ética relacional poderosa: “Não faça aos outros o que você não quer que façam a você.” Simples, direto, universal. Uma daquelas máximas que ouvimos desde a infância e que, se fossem realmente aplicadas, poderiam resolver boa parte dos ruídos nos relacionamentos pessoais e no ambiente corporativo.

O que mais afasta as pessoas da ideia de inclusão não é o erro, é a incoerência, o não exercício do pensamento crítico e da reflexão. Os heróis do cinema mantêm-se firmes na prática dos valores humanos, nos lembrando da dualidade terrena, mas é ela que permite que enxerguemos nossas incongruências para nos desenvolvermos para uma coletividade melhor para todos.

Rosângela Portela é jornalista, mentora e facilitadora