16 de dezembro de 2024
ESG / Climatech

ESG avança nas indústrias, focado na pegada ambiental

Por Ariadne Gattolini |
| Tempo de leitura: 10 min
Divulgação
Maira Domene da umgrauemeio monitora 20 estados brasileiros, em cinco biomas, com o sistema Pantera

Uma área comparável ao estado de Roraima foi queimada no Brasil entre janeiro e setembro de 2024. Foram 22,38 milhões de hectares – 13,4 milhões de hectares a mais que em 2023. O salto de um ano para o outro foi de 150%. Mais da metade (51%, ou 11,3 milhões de hectares) da área queimada nos nove primeiros meses deste ano fica na Amazônia. Os dados são do mais recente levantamento do Monitor do Fogo do MapBiomas. Essa tragédia anunciada por cientistas e pesquisadores é o cerne das preocupações globais e impacta as relações comerciais mundiais que, tentam através da sigla ESG (meio ambiente, social e governança), trazer mitigações de riscos, com preocupações que vão além do impacto ambiental. Estamos lidando com catástrofes ambientais e, se o impacto das mudanças climáticas era uma previsão futura, 2024, com secas e chuvas intensas, mostrou que a tragédia climática já começou, com previsão de milhões de pessoas afetadas em todo o hemisfério Sul do planeta.

De Jundiaí, uma climatech (startup) tem tentado reverter os prejuízos causados pelos imensos incêndios que atingem nossos principais biomas. Através de um sistema de software, com uso de Inteligência Artificial, a umgrauemeio, consegue detectar precocemente incêndios.

Fundada em 2016 como Sintecsys, a umgrauemeio, nasceu com objetivo de trazer uma solução rápida, prática e eficiente na detecção de focos de incêndios no campo, o que revolucionou esse setor, tendo em vista a ação limitada do monitoramento analógico, até então, a forma mais difundida dessa atividade.

A ideia partiu do Rogerio Cavalcante, atual CEO da empresa, que foi compartilhada com a cofundadora Maira Domene, atual diretora jurídica, com o objetivo de inovar e oferecer uma alternativa mais eficiente e tecnológica para o problema de incêndios. O rebranding ocorreu em 2019/2020, com base no aprimoramento da tecnologia, no sucesso dos resultados e aplicabilidade, ampliando o uso da solução para redução dos incêndios florestais. O nome umgrauemeio é uma referência, um compromisso público firmado em prol da meta limite de aquecimento global 1,5ºC.

Através do software de monitoramento, o Pantera, a empresa opera em 20 estados brasileiros, em cinco biomas, produzindo mais de 15 mil relatórios de detecção de incêndios, evitando, com isso, mais de 100 milhões de reais em prejuízos decorrentes da propagação do fogo descontrolado, bem como eliminar a emissão de 18 milhões de toneladas de CO2.


Marcelo Souza, diretor ambiental do Ciesp-Jundiaí, percebe maior adesão ao ESG nas empresas jundiaienses

“A partir do envio de imagens por câmeras de alta resolução instaladas no topo de torres de comunicação, identificam-se os focos de incêndio de forma automática. Essa identificação é imediatamente notificada aos operadores do sistema para que eles possam agir adequadamente. Cada uma de nossas câmeras instaladas detecta focos de incêndio em menos de segundos. Essa agilidade acelera os protocolos necessários para se combater as queimadas. Há, ainda, a detecção back-up de pontos de calor por satélites, que complementam a proteção das áreas sob nosso monitoramento”, afirma Maira Domene.

Atualmente, são mais de 17,5 milhões de hectares monitorados até o momento no Brasil, 10 milhões em florestas e áreas nativas e 7,5 milhões de agricultura, utilizando mais de 130 torres de monitoramento. A climatech também apoia um dos maiores projetos de preservação ambiental do mundo, o Abrace a Floresta, que traz a solução na proteção das florestas, biodiversidade e comunidades indígenas e do entorno, com 11 torres instaladas, alcançando 2,5 milhões de hectares de mata nativa da região, protegendo a comunidade e 140 mil hectares de territórios indígenas da região. A previsão em redução de CO2 é de 15 milhões de toneladas.

Na região Amazônica, são mais de 2,2 milhões de hectares monitorados 24 horas por dia.
Os esforços da umgrauemeio são para ampliar a área preservada no Pantanal e estender o projeto também a outros parques e reservas nacionais, como por exemplo a Chapada dos Veadeiros (Goiás) e Chapada dos Guimarães (MT), além de áreas da Amazônia.

Em 2023, o faturamento da umgrauemeio foi de R$ 19 milhões e a estimativa para 2024 é de R$ 24 milhões, com previsão de aumento de receita de 40% a 50% ao ano.

“Nossa atuação não acontece sozinha. Para ela existir, é necessário um trabalho conjunto em diversas frentes, inclusive é preciso considerar as questões climáticas que favorecem ou não a realização do trabalho. Os incêndios e a situação atípica vivenciada neste ano refletem as condições climáticas que temos debatido e alertado há tempos, o que só reforça a importância de priorizarmos o clima e o crescimento sustentável, em linha com o meio ambiente nas agendas mundiais”, afirma Maira.
 
Maturidade de Jundiaí
O diretor de meio ambiente do Ciesp-Jundiaí, CEO da Indústria Fox e presidente do Instituto Nacional de Economia Circular, Marcelo Souza, afirma que o tema ESG vem ganhando aderência no cenário jundiaiense. “Diria que há dois anos 50% das empresas discutiam o tema, mas agora 98% delas entenderam a relevância do ESG para seus negócios”, afirma.

Para Marcelo, as demandas ambientais são os principais motores de mudanças e adequações às regulamentações mundiais. E ele elenca ainda novas formas de administração que chegaram com a sigla. “Aquela forma de ter um CEO centralizador acabou. Hoje, as decisões são tomadas em colegiado, conselhos e comitês de governança. Do ponto de vista ambiental, as empresas estão mais comprometidas com o Net Zero, redução de emissões de GEE, descarbonização e economia circular.”

Entretanto, o diretor afirma que o grande viés do social exige maiores reflexões. “Chegará um momento que iremos perceber que será necessário cortar do lucro do capital para que haja uma maior distribuição social e criação de oportunidades. Vou lhe dar um exemplo, precisamos de creche no contraturno e investir em educação de qualidade. Se eu quiser melhorar esta condição a meus funcionários, é um investimento da minha empresa.”


Marcelo Cereser, diretor-presidente do Ciesp-Jundiaí, afirma que a entidade vem promovendo seminários e encontros para o ESG

O diretor-presidente do Ciesp-Jundiaí, Marcelo Cereser, tem a mesma impressão que Souza. Para ele, o tema tem gerado atenção e comprometimento de seus associados. “Percebemos que as empresas estão preocupadas com o ESG, notadamente no quesito ambiental. Já promovemos dois eventos internacionais sobre o assunto e temos trazido encontros e seminários para disseminar conhecimentos e percebo que a jornada para a descarbonização é uma preocupação iminente e importante, principalmente pelas exigências do mercado de exportação.” 

Böllhoff e as metas de igualdade de gênero
O Grupo Böllhoff, presente em Jundiaí, publica anualmente um relatório global que consolida suas iniciativas de ESG, com avanços nas três áreas da sigla, com estratégias para reduzir o consumo de energia, conservar recursos e minimizar as emissões, além de garantir uma cadeia de suprimentos sustentável. O grupo assumiu o compromisso em ter ações concretas também para a diversidade. Segundo o CEO Flávio Silva, a empresa tem como iniciativa aumentar a proporção de mulheres dentro da companhia. “Queremos fazer com que mais jovens mulheres se interessem por nossos locais de treinamento técnico, fornecendo informações sobre ofertas de capacitação na Böllhoff. Oferecemos às funcionárias oportunidades personalizadas de desenvolvimento, visando aumentar o número de mulheres em cargos de gerência média e superior a longo prazo”, afirma.

O número de mulheres que trabalha no Grupo Böllhoff tem crescido nos últimos anos. A proporção de mulheres na companhia representava 26,7% globalmente em 2022, comparado a 25%, em 2020. Em relação à liderança feminina, o percentual era de 21,3% em 2022 na organização, em relação a 19,5% em 2020.


CEO da Böllhoff, Flávio Silva, afirma que promover igualdade de gênero é meta

Na governança, a Böllhoff adota uma abordagem rigorosa de governança corporativa, com criação de equipe interna de gestão de crises, que se dedica a analisar potenciais cenários e desenvolver medidas preventivas. Exemplo disso foi a ação para reduzir o consumo de gás na sede, em Bielefeld, que resultou em uma redução significativa de 15 a 20% no uso de energia em 2022. A empresa tem gestão de riscos e comitês internos que assessoram a diretoria e garantem que as melhores práticas sejam seguidas em todas as áreas da empresa.

Com rigoroso controle ambiental, as metas incluem reduzir ao menos 50% das emissões frente a 2021 nos escopos 1 e 2 de inventário de GEE. No escopo 3, reduzir a emissão de gases junto aos fornecedores e transportadoras (análise crítica da base de fornecedores, incluindo a definição de iniciativas e targets, otimização de rotas de transporte e adoção de veículos de baixa emissão); melhorar a gestão de resíduos e promover a economia circular / zero aterro; monitorar ativamente as emissões, em base mensal, para a tomada de ações e convergência às legislações regionais e metas do grupo; obter pelo menos o Selo Prata na avaliação EcoVadis.

Responsabilidade social na Astra
A tradicional empresa jundiaiense é uma antiga signatária de compromissos de responsabilidade social, apoiadora de projetos de inclusão, educacionais e música. Esse legado, criado pelo fundador Francisco Oliva, tem, em sua neta, Ana Oliva, presidente do Conselho de Administração, uma entusiasta do tema, a ponto de fundar um Instituto, com o mesmo nome do avô, para perpetuar este engajamento social.


Ana Oliva, presidente do Conselho de Administração da Astra, segue as pegadas sociais do avô e cria instituto

Ana tem especial atenção a projetos para mulheres, incluindo o apoio para planejamento familiar de suas funcionárias, com suporte para amamentação e retorno ao trabalho após o nascimento dos filhos. “Sou uma apoiadora da jornada das mulheres e acredito que a diversidade traz inovação.” Hoje, a Astra tem 25% de mulheres em postos de liderança, um marco para a indústria de material de construção. 

Através do Instituto, a empresa também apoia o projeto Cimento e Batom, que capacita mulheres para trabalhar no setor de construção, com cursos de pintura em parede, reparo de parede, gesso, hidráulica e elétrica. Parte desta mão de obra formada passa por processo seletivo nas empresas do grupo. Na área educacional, a Astra promove a Olimpíada da Matemática, além do tradicional Concertos Astra-Finamax e iniciativas de esporte. 

Do ponto de vista de governança, a empresa tem instituído os comitês de assessoria para a diretoria, assim como tem uma agenda em consonância com o Pacto Global da ONU, ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) e metas para a descarbonização.

Dentre as metas ambientais, para uma indústria cujo plástico é sua matéria-prima principal, a Astra inclui o início do inventário de carbono em suas plantas industriais, redução do consumo de água, uso durável e reciclável do plástico, além do investimento em tecnologia para o desenvolvimento do plástico verde. “Queremos, além disso, apoiar a jornada de nossos fornecedores para as certificações ambientais e acreditações necessárias”, afirma Ana.
 
Economia circular na Polimix
A Polimix, empresa situada em Jundiaí e Região, com unidades de negócios espalhadas pelo Brasil e exterior, aposta desde 2015 em economia circular, com o objetivo de transformar resíduos em produtos que possam ser usados como matéria-prima, especialmente na reutilização de pneus fora de condições de uso. A Polimix Ambiental, em Santana de Parnaíba, tem uma avançada tecnologia, transformando pneus inservíveis em negro de carbono recuperado (NCr), óleo industrial e aço para diversas aplicações, reduzindo o passivo ambiental e emissões de CO2.

O processo utilizado não queima os pneus, mas faz uma decomposição térmica, com temperaturas acima dos 500ºC, chamada pirólise. Deste processo, a parte sólida é comercializada novamente, e o óleo é usado para outras aplicações e o gás retroalimenta o combustível dos queimadores.


Thomas Payne, da Polimix, pirólise é processo inovador e deve ser incentivado

Thomas Payne, líder comercial da empresa, afirma que a produção da Polimix tem condição de atender uma demanda de 30 mil toneladas por ano, mas a exigência do mercado é de 400 mil toneladas/ano. “Entendo que o processo de pirólise é o futuro, mas o Brasil não pode ficar à margem desta discussão, sem incentivos governamentais.” Apesar de a empresa pretender duplicar a unidade de Santana de Parnaíba e nos Estados Unidos, Thomas afirma que é hora de o Brasil fazer seu fomento à economia circular. “Somos top 5 em nível mundial de economia circular e qualquer tecnologia de fora pode tirar essa liderança brasileira”, afirma.