Vinte e nove foram as vezes em que autoridades de quase duzentos países se reuniram para salvar a Terra e o resultado é sempre o mesmo. Compromissos descumpridos, acordos rompidos, chiliques retiram delegações dos encontros, falta de dinheiro.
Há dinheiro bastante para sustentar a guerra, para nutrir a indústria de armamentos, para expedições rumo a planetas que, seguramente, não conseguirão hospedar todos os terráqueos quando esta nossa pequena esfera (não é plana, não! Isso é sabido e comprovado há centenas de anos...) já não conseguir atender às nossas necessidades mínimas.
Milhares de pessoas se reúnem. Discutem. Propõem soluções. Fazem manifestações e protestos. Mas, no fundo, a enfermidade da Terra continua e se intensifica.
É óbvio que o projeto humano pode às vezes ser considerado um fracasso. Embora sabendo que não sobrará ninguém se as mutações climáticas seguirem essa rota perversa, as pessoas não se comovem. Continuam a acreditar que a Terra dará um jeito, de que são ciclos naturais que ocorrem periodicamente, ou se consideram impotentes, diante da magnitude da questão.
Não adianta cobrar de nações ricas antecipem suas metas de redução de emissões de gases nocivos ao meio ambiente. Elas não estão preocupadas com a sua reputação. O que interessa é o poderio, é a intensificação dos armamentos, a busca de uma hegemonia perdida, pois o mundo se complicou e as soberanias se diluíram diante do dinheiro que é manipulado por grandes corporações. Há empresas multinacionais – melhor seria dizer “apátridas” – que possuem potencial econômico superior ao da maior parte dos países.
Essas lideranças não se comovem. Têm outra perspectiva existencial. Destinar dinheiro para socorrer nações pobres não está no radar. Significativo que as duas últimas COPs tenham sido realizadas em países exportadores de petróleo. Algo que, sem dúvida, fará com que o Brasil volte a insistir na tese da perfuração na foz do Amazonas.
Diante da situação que se torna aflitiva a cada dia e que piorará muito mais, de acordo com as previsões dos cientistas, é preciso entregar à sociedade civil e às entidades subnacionais a missão do enfrentamento das questões climáticas.
O protagonismo deve ser cidadão. Cumpre invocar o ensinamento clássico de André Franco Montoro: as pessoas não nascem na União, nem no Estado. Nascem no município. É o município que deve fazer aquilo que puder ser feito para adaptar as condições locais, de tal forma que se evitem mortes. O ambientalismo correto é aquele que prioriza as pessoas. São estas as vítimas do aquecimento global, causador das alterações drásticas das condições que funcionaram muito bem durante milênios e que continuariam a atender à humanidade, não fora ela tão insana e insensata.
São os municípios aqueles que sabem qual o território mais vulnerável. São eles que podem priorizar o atendimento às pessoas que ficarão sem suas casas toscas, mal construídas, ocupando espaços insuscetíveis de moradia, como margens de rio e córrego, morros e outros territórios impróprios.
É o prefeito o responsável pela arborização, que deve merecer toda a atenção e empenho, já que o mundo precisa de um trilhão de árvores, o Brasil de um bilhão e toda cidade tem um déficit arbóreo considerável. Não se pode contar apenas com a Serra do Japi, esse tesouro tão ameaçado pela especulação imobiliária e pela insensibilidade da maior parte das pessoas.
Só culpar os países ricos, mendigar como se nada pudesse vir a ser feito, é aquela conversa que não engana mais ninguém. Principalmente a juventude, muito mais sagaz do que a de minha incauta e imprudente geração. Vamos agir enquanto é tempo.
José Renato Nalini é reitor, docente de pós-graduação e secretário-executivo das Mudanças Climáticas de São Paulo (jose-nalini@uol.com.br)