Estamos todos no mesmo barco. Hoje, uma nau sem rumo. Ninguém quer cumprir acordos solenemente firmados em 2015, para a urgente descarbonização do mundo. Os governos têm mira curta. Enxergam só as eleições, a hegemonia mundial, a conquista dos píncaros da glória. E a humanidade que se vire para o enfrentamento das emergências climáticas a cada dia mais intensas.
O empresariado, que sobreviveu às intempéries e a um Estado que parece ter ojeriza ao lucro da iniciativa privada, precisaria reagir e assumir uma parcela da responsabilidade inexistente no âmbito governamental, com raríssimas exceções.
Também seria importante apoiar projetos mantidos por patrióticos cidadãos que enxergam a realidade e procuram atenuar as condições inóspitas geradas pelo inconsequente uso destrutivo e exterminador dos recursos naturais.
Há bons exemplos. No Jardim Lago II, em Campinas, formou-se a Cidade do Autoconhecimento, considerada verdadeiro oásis imerso na selva urbana daquela cosmopolita “Cidade das Andorinhas”. Pode não ter mais as andorinhas, mas tem o melhor tratamento de água do Brasil, as melhores plantas de reciclagem que dão conta de aproveitar todo o resíduo sólido produzido e devolver fertilizantes, matéria-prima para a produção de novos bens, tudo mantendo o ideal da sustentabilidade.
A “Cidade do Autoconhecimento” é mantida pela Fundação Eufraten, uma organização não governamental cuja missão é promover a educação por meio de atividades socioeducativas, servindo-se do meio ambiente, da cultura e da arte. O local recuperado já foi um desses nefastos “lixões”, de que as cidades brasileiras ainda estão prenhes.
Voluntários de diversas áreas transformam a comunidade e a vida das pessoas. Reflorestam, realizam oficinas socioeducativas, criam hortas comunitárias, fazem bazares beneficentes. As pedras são reaproveitadas para a construção dos espaços destinados a educar com autoconhecimento. Promovem apresentações artísticas das crianças e jovens atendidos, que devolvem com entusiasmo, assim que alguém acredita neles.
A Prefeitura de Campinas elegeu aquela área como zona de compensação ambiental. O grupo cidadão acreditou e hoje ali se encontram mais de três mil árvores, todas espécies nativas e algumas na lista das condenadas à extinção.
Será que Jundiaí não tem áreas devastadas, testemunho do que a negligência ambiental e a ignorância provocam, e que poderiam ser recuperadas se houvesse empenho de indivíduos de boa vontade, conscientes de que o perigo ronda a humanidade como nunca dantes rondou?
A sociedade também descuidou da educação de qualidade e a infância e juventude que não têm família estruturada – a imensa maioria da população – tomam rumos perigosos. A educação é missão da família, da sociedade e do Estado. Educação é algo muito sério para deixar exclusivamente nas mãos do governo. É urgente que todas as pessoas de boa vontade procurem fazer algo para suprir o ensino deficiente, ainda baseado na memorização, sem levar em conta os mais importantes fatores para a adequada formação de uma cidadania participativa: as competências socioemocionais.
Como seria bom pudéssemos também contar, em Jundiaí, com espaços recuperados, antigos “lixões” ou áreas degradadas, com projetos análogos à “Cidade do Autoconhecimento” de Campinas. Afinal, estamos todos na mesma barca furada. Se não tirarmos água, ela nos levará ao fundo.
José Renato Nalini é reitor, docente de Pós-graduação e Secretário-Executivo das Mudanças Climáticas de São Paulo (jose-nalini@uol.com.br)