Ontem fui ver um lindo recital de piano com a renomada concertista e professora estadunidense Dra. Shelly Moorman-Stahlman e dois pontos me chamaram atenção.
Em primeiro lugar, claro, a apresentação. Um belo programa musical que contou com Bach, Chopin, Rachmaninoff, Ravel e Liszt. E a artista fez muito bem sua parte. A performance, especialmente na linda "Jogos de Água", de Ravel, e na Terceira Balada de Chopin, preencheu os espíritos dos espectadores de bons pensamentos e beleza. E falando no público, esse lotou a sala de ensaios da Orquestra Municipal. Muita gente de muitas idades. Bonito era ver o rosto das pessoas. Todos estavam embevecidos e felizes. A música tem dessas coisas. Preenche a alma. Acalenta o coração.
Mas outro ponto que me chamou a atenção é que, enquanto ia embora de lá na companhia de alguns amigos, não pude deixar de reparar no Espaço Expressa.
As antigas oficinas da Companhia Paulista, antes abandonadas, hoje encontram nova e nobre utilidade.
E antes que comecem as críticas, já digo que sim, falta muito a ser feito. Muita coisa mesmo. Mas ao invés de focar nisso, gostaria de refletir sobre o que temos para hoje. E não é pouca coisa, já que se trata de uma área total de 111 mil metros quadrados, sendo 46 mil deles de área construída iniciada na década de 1890 pela Companhia Paulista de Estradas de Ferro. Eram cerca de 34 edificações que sofreram várias modificações de acordo com o uso que deviam ter para atender as demandas da ferrovia.
Depois da falência da Fepasa, as antigas oficinas da Companhia Paulista foram adquiridas pela Prefeitura Municipal em 2001. Entre 2002 a 2013, segundo consta no site oficial, o espaço ficou sob a gestão da então Secretaria Municipal de Educação e Esportes, passando à responsabilidade da Secretaria Municipal de Cultura, em 2014, e à Unidade de Gestão de Cultura (UGC), em 2017, ano em que também a sede da UGC foi transferida para o espaço.
Trata-se também do único patrimônio material do município com tombamento em nível nacional, pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).
É muita história. E onde antes havia um universo ferroviário, hoje é um espaço com muitas salas para ensaios de dança e música, da orquestra municipal, para corais, dois pianos de cauda (que precisam de um carinho especial), e agora até um belo espaço audiovisual. Sem falar do incrível e lindíssimo museu ferroviário, impecável.
Percebe-se que o espaço ainda está sendo adaptado (há um recado em uma parede: "espaço em transformação"). Mas tudo com muitíssimo bom gosto. Fotos da cidade convivem com placas de sinalização das antigas oficinas, com grafites, relógios e capacetes nas altas paredes. O mobiliário reutilizado devidamente. Os caminhos do trem no chão. Há também, e não posso esquecer, da iluminação do prédio que é incrível, dando destaque à sua arquitetura que mistura o industrial com o neoclássico (se eu estiver descrevendo de forma equivocada, peço perdão aos amigos arquitetos) e a utilização de parte do espaço para a Fatec.
Mas olha... como tudo está ficando bonito.
E não é apenas isso. Para mim, fazer a ferrovia conviver e ser revivida em um espaço agora cultural é uma excelente tacada. Parece haver muito respeito pela história como um todo: das oficinas, da cidade.
Não foi a primeira vez e nem será a última (espero) que eu frequente esse lindo espaço, que tanto potencial tem e que já é considerado.
Um espaço que se expressa.
Samuel Vidilli é cientista social (svidilli@gmail.com)