21 de novembro de 2024
OPINIÃO

A constante troca de treinadores nos clubes brasileiros


| Tempo de leitura: 3 min

O que Abel Ferreira, Vojvoda e Pedro Caixinha têm em comum?

Além de serem estrangeiros, são treinadores que conseguiram emplacar trabalhos de longo prazo em seus clubes. Estão há alguns anos em suas equipes, e acabam sendo exceções. Tite, por exemplo, foi demitido do Flamengo há uma semana de completar seu primeiro ano de trabalho (mesmo tendo ficado na Seleção Brasileira por duas Copas do Mundo).

A verdade é: existem algumas situações lógicas para que o cenário de demissões de treinadores brasileiros seja tão comum:

1. É muito mais fácil demitir o técnico de futebol e a sua comissão, do que mandar o time inteiro embora, quando o time de futebol vai mal. Por piores que sejam os atletas, prefere-se a troca de um elemento, o treinador, pela praticidade em substituí-lo. Isso tornou-se algo usual.

2. O custo da demissão: rescindir o contrato de trabalho e pagar a multa de um técnico é mais fácil do que o de um jogador, pois os atletas têm direitos federativos envolvidos. Ou seja: se eu demito um técnico, perco dinheiro com sua saída. Mas se faço o mesmo com um atleta, é o patrimônio do clube que vai embora! Lembrando que os clubes preferem ficar com os jogadores, pois podem (como uma mercadoria) repassá-los a algum interessado e faturar alguma receita.

3. A cultura do futebol brasileiro, que vai de “bestial a besta” como outrora disse o técnico Otto Glória. Se o time ganha, não fez mais do que a obrigação e os elogios surgem aos poucos. Se o time perde, a culpa é do treinador e os xingamentos disparam das arquibancadas. Quanto a isso, Zico, maior ídolo do Flamengo, um dia disse, quando questionado se poderia trabalhar como treinador do Mengão: “Eu não suportaria ver a torcida que tanto me aplaudiu, me chamando de burro...”

4. A cobrança por resultados “mágicos”: sem tempo para trabalhar (joga-se no domingo, descansa-se na segunda, viaja-se na terça e joga-se na quarta), a insistência em vitórias torna-se impiedosa. Como colocar a sua filosofia e treinar seu esquema tático, sem tempo para afinar o seu repertório de jogadas? Sobre isso, Pedro Caixinha, numa data-FIFA, disse: “Folga na tabela não é férias, é trabalho; uma oportunidade de treinar com mais tempo que não costumamos ter”.

Por fim, a instabilidade faz com que alguns números absurdos ocorram. O maior deles: o número de treinadores ao longo do século XXI por equipe.

Quem mais trocou técnico entre 2001 e 2024, foi o Vasco da Gama. Foram 55 trocas (dá mais de 2 treinadores por ano), com 40 nomes diferentes (alguns foram demitidos, retornaram mais tarde, demitidos novamente e depois recontratados).

Depois do Cruz-maltino, quem mais trocou de técnico foi o Flamengo: 54 trocas de treinadores (sendo 38 nomes). Mesmo na “fase endinheirada” do Rubro Negro, depois da saída de Jorge Jesus, em 4 anos já tivemos 9 nomes! É muita gente em tão pouco tempo... foram eles: Domènec Torrent, Rogério Ceni, Renato Gaúcho, Paulo Sousa, Dorival Júnior, Vitor Pereira, Jorge Sampaoli, Tite e agora Filipe Luís.

Na sequência de “menos tolerantes aos treinadores”, temos o Fluminense com 46 treinadores, Botafogo com 45, Atlético Mineiro com 42 e Cruzeiro com 41.

Diante disso, vale observar: esses treinadores não chegaram ao clube porque não tinha ninguém disponível e assumiram o cargo por conta própria, eles foram contratados! Isso significa: alguém foi atrás deles, houve a conversa e formalizou o compromisso. E conforme essa liturgia de contratação, que tal questionar: e o dirigente do clube, não deveria ser demitido? Se é ele quem contrata, é ele o responsável por trazer um profissional que não foi bem. No caso específico do Flamengo: se em apenas 4 anos temos 9 nomes, isso significa que quem escolhe o treinador é incompetente e contrata mal! Por quê o presidente do clube não demite essa pessoa?

A resposta é simples: acordos políticos. Nos grandes clubes, o cargo de Diretor de Futebol faz parte do combo de negociação de apoio político. E justamente nessa função tão estratégica, a competência é um mero detalhe…

Rafael Porcari é professor universitário e ex-árbitro profissional (rafaelporcari@gmail.com)