06 de outubro de 2024
OPINIÃO

Dificuldade dos clubes em priorizar competições


| Tempo de leitura: 3 min

Nenhum clube europeu disputa com força total três competições simultâneas. Nem ao menos duas. A ordem de prioridade é: força máxima no Torneio Continental (a Copa dos Campões da Europa, chamada de UEFA Champions League / UCL; ou a secundária, chamada de Europa League), o Campeonato Nacional e a Copa do País.

Aqui no Brasil, nós temos a nossa competição continental (a Taça Libertadores da América; ou, a secundária, a Copa Sulamericana), o Campeonato Brasileiro e a Copa do Brasil. Porém, acrescente-se algo que é exclusivo nosso e que encavala diversas datas no calendário, que são os campeonatos regionais. Tudo isso impacta demais no planejamento, no custo, na formação de plantel e na logística.

Repare: o Fortaleza jogou / joga nesse ano o Campeonato Cearense, a Copa do Nordeste, a Copa do Brasil, o Campeonato Brasileiro e a Copa Sul-Americana! Não é um absurdo serem 5 competições? Sem contar que, dos times do Brasileirão e da Sulamericana, é a agremiação que está mais longe da cidade dos seus adversários e, por tabela, tem os jogadores que mais tempo ficam dentro de um avião. A isso, um dia Vanderley Luxemburgo chamou de “pijama training”, ou seja, abrir mão de treinos para dar descanso aos jogadores, que ficam sem treinar por causa dos jogos, das viagens e de algo a mais, não relatado anteriormente: a ausência da família.

Tal fato só acontece no Brasil. Na competição internacional europeia, você usa a sua força máxima. No torneio nacional, os treinadores mesclam as equipes em esquema de rodízio e descanso. Na copa local, não há vergonha alguma de se jogar com o time inteiro reserva (incluindo um técnico reserva / auxiliar). É por isso que se vê equipes pequenas chegando às finais por lá.

Aqui, se dá mais valor à Copa do Brasil do que ao Brasileirão! E isso é incompreensível aos europeus. O português Jorge Jesus, quando foi técnico do Flamengo, se assustou quando foi questionado em jogar com um time misto o Brasileirão e usar a força máxima Copa do Brasil. Para ele, o campeonato nacional deveria ser muito mais importante do que uma copa.

Se não tivéssemos os campeonatos regionais, talvez o calendário fosse mais espaçado e mais partidas poderiam contemplar elencos titulares, para contentar quem reclama de times mistos. Mas ninguém abre mão dos estaduais...

A explicação? Pode parecer complexa, mas não é: o fato de sermos o único país a ter 13 times grandes! Não tem competição suficiente para todos conquistarem?

Nos últimos anos, Palmeiras, Flamengo e Atlético Mineiro têm sido favoritos às principais competições. Sendo assim, clubes como Internacional, Vasco da Gama, Corinthians ou São Paulo acabam lutando pelos campeonatos dos seus estados. E se esses mesmos estaduais não existirem, como terão algo a festejar?

Com tantos clubes grandes, competições menores são desejadas para quem não ganha as principais. Vide o RJ, com “subtítulos” dentro da disputa de título (Taça Rio e Taça Guanabara)?

Com isso, chegamos em setembro com um dilema: se aqui não somos como os europeus e queremos ganhar tudo o que disputamos com elenco titular (mesmo não tendo número suficiente de atletas), qual a minha prioridade? 

Vide o dilema do Corinthians: se dedica à Copa do Brasil ou à Sul-Americana? E se escolher uma delas, como fica o Brasileirão, onde está na Zona do Rebaixamento?

Me lembrei de um dos rebaixamentos do Palmeiras: preocupado em vencer a Copa do Brasil (final contra o Coritiba), priorizou os mata-matas e caiu para a Série B do Brasileirão. Eram duas competições... o Timão, no entanto, está em três! Parece ironia, mas estar vivo em todas elas, tornou-se uma grande dor de cabeça.

Eu não tenho dúvidas: se sou cartola de clube, priorizo o Campeonato Brasileiro. É ele que me dá maior exposição, calendário o ano todo, vaga para torneios internacionais e dinheiro.
Ops: muitos acreditam que a Copa do Brasil paga mais, e não é verdade, pois os valores da premiação incluem os direitos de TV. No Brasileirão, eles são negociados à parte e, quando somados às premiações, superam o valor da Copa.

Rafael Porcari é professor universitário e ex-árbitro profissional (rafaelporcari@gmail.com)