14 de agosto de 2024
CRIME ORGANIZADO

Cartilha do PCC prega voto de presos e vigilância de autoridades

Por Guilhermo Codazzi | São José dos Campos
| Tempo de leitura: 3 min
Editor-chefe de OVALE
Reprodução
Criado no Vale, PCC hoje atua em todo o Brasil e no exterior

Um ano após a série de ataques às forças de segurança pública, em maio de 2006, o PCC (Primeiro Comando da Capital) criou uma cartilha que delineava as linhas mestras da facção criminosa, doutrinando a conduta de seus integrantes e seus familiares, além de apontar o norte para o qual estava apontada a bússola do 'Partido do Crime'.

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Na cartilha, editada no formato de um livreto, a organização sinalizava um novo rumo, diferente do embate direto de um ano antes, almejando a expansão de suas atividades criminosas para todo o Brasil e exterior, o que, infelizmente, foi concretizado anos mais tarde. O documento trazia também uma face política da facção: a política.

O PCC, além de defender que os presos já condenados tivessem direito a voto (hoje, os presos provisórios votam), a facção pregava que seus integrantes monitorassem autoridades.

“Acompanhem as trocas dos cargos políticos: quem são essas autoridades, governos, secretários de segurança, administração penitenciário", dizia a 'Cartilha de Conscientização’, como foi batizada. "Fiquem sempre atentos à política deles, pois são essas as pessoas diretamente responsáveis pelo sistema penitenciário”, diz trecho da cartilha.

“Exponham nossas dificuldades e com isso conquistaremos nossos direitos como presos usando as mesmas armas que eles usam contra nós”, diz a cartilha. “Aposte e acredite no aperfeiçoamento e na conscientização para diminuir as perdas nas lutas, para vencer procurem estudar, procurem conhecimento e principalmente procurem aprender essa nova mudança, essa nova era”, afirma outro trecho.

Em 2007, à época repórter investigativo, fui o autor da reportagem que denunciou a existência da cartilha, que recebi das mãos de um pré-candidato a vereador apoiado pela facção no Vale do Paraíba, com a condição de que a sua identidade fosse preservada. Nesta semana, a Polícia Civil deflagrou a Operação Decurio, que identificou a infiltração de integrantes do PCC nas eleições municipais.

São José dos Campos e Ubatuba estão na rota da operação. Além de mandados de busca e apreensão e de prisão, a Justiça determinou o bloqueio de R$ 8 bilhões das contas dos investigados -- os nomes não foram revelados (Leia aqui).

Sintonia.

Além do monitoramento de autoridades, o PCC também monitora agentes públicos, por meio de sua 'tropa de elite', batizada de 'Sintonia Restrita'. Sua função é levantar informações sobre agentes públicos, principalmente policiais. É o que apontam investigações do Ministério Público de São Paulo. Criado em Taubaté em 1993, o PCC é dividido em células, as ‘sintonias’. A de número 012 é responsável pela atuação na RMVale, por exemplo.

A descoberta da 'Sintonia Restrita' ocorreu após uma apreensão na região de Ribeirão Preto. “Documentos apreendidos em poder de outros integrantes da Sintonia Restrita (...), dão conta de que uma das funções realmente é a de proceder ao levantamento de informações sobre agentes públicos para posteriormente matá-los", informa o MP.

A ‘Sintonia Restrita’ trata de assuntos “extremamente sigilosos e relevantes para a cúpula” e está situada dentro da estrutura da 'Sintonia dos 14' – membros de extrema confiança por parte do comando, com elevado poder decisório. 
O trabalho da Sintonia é passar informações para os encarregados de praticar o crime.