16 de julho de 2024
OPINIÃO

Gente grande não chora?


| Tempo de leitura: 3 min

Tenho uma cliente que acabou se tornando minha amiga, pelo tanto de tempo que se trata com a acupuntura, que é notavelmente emotiva, manifestando isso por vezes em locais e momentos que não são muito convenientes, chorando em ambientes profissionais, em ocasiões como reuniões, por exemplo.

- “Choro até mesmo em hino nacional” - diz ela - “será que eu preciso algum tipo de tratamento para isso?”. Ainda que possa parecer hilário a situação ou mesmo o comentário dela sobre o próprio comportamento, fato é que isso ocorre, com maior ou menor frequência, com todos nós e então achei próprio escrever um pouco sobre isso.

Emoções são incontroláveis. Sou categórico em afirmar isso pois, sob uma certa ótica, elas são tão genuínas (e poderosas) como as ondas do mar.

Todos aqui que já aproveitaram um dia de sol para se banhar em uma praia calma acreditam dominar as ondas que passam calmamente na altura da nossa cintura, uma após a outra, de forma ritmada, para se “quebrarem” logo depois, na espuma e na areia adiante. Isso, é claro, até que aparece aquela onda maior, fora do padrão de forma, frequência e ordem para nos lembrar que não controlamos… nada.

As emoções são o arcabouço que envolvem as ideias e vontades que temos e criamos. Elas as ajudam a ter força de expressão e animação para que possam se realizar no plano do material e do palpável. Do ponto de vista da medicina chinesa, podemos considerar mesmo que existem estruturas energéticas que trafegam essas emoções e mesmo as armazenam, no que convencionamos chamar de corpos sutis.

Na sua natureza variável e de expressão polimórfica está a utilidade e característica das emoções que nos acompanham a vida toda. Tentar prever ou mesmo segurá-las armazenadas é somente adiar o fluxo de energia e de vida que deve ocorrer nos fatos e eventos da nossa vida.

De uma certa forma é tentar bloquear o fluxo natural da vida. Impossível.

Na maioria das vezes essa aparente impotência causa desconforto em nós pois nos incomodamos diante do que é incontrolável e por vezes, incompreensível, resultando em manifestações difíceis de prever.

Então, seguindo essa linha vem a resposta para orientação da minha cliente e amiga: não é necessário tratamento para o fluxo de emoções, mas é preciso um cuidado e uma atenção para com ele.

Tal como um fluxo de rio que hora pode ser suave, hora pode ser brutal e volumoso quando recebe grande quantidade de água dos seus afluentes, as emoções merecem a construção de estruturas para coordenar e comportar o seu fluxo, mas nunca o deter.

Seguindo-se essa metáfora, deve-se abrir o canal por onde o rio corre, fornecer espaço para que o volume de água seja recebido e absorvido sem causar estrago. Seria como promover obras para criar represas ou mesmo corrigir o curso de um rio para um trajeto mais conveniente, longe de lugares habitados.

O equivalente disso no campo das emoções são as práticas meditativas e de autoconhecimento, que permitem a liberação desses núcleos de energia em locais e momentos adequados ou mesmo a rotina de atividades como exercícios e afins, que ajudam ampliar os canais e criar um ambiente de relaxamento onde tensões e desejos são trabalhados. Em casos de problemas mais pontuais e específicos, técnicas como a acupuntura e osteopatia podem ser empregadas para soltar e aliviar o represamento.

       

Alexandre Martin é médico especialista em acupuntura e com formação em medicina chinesa e osteopatia (xan.martin@gmail.com)