22 de dezembro de 2024
OPINIÃO

Cotas raciais e abusos


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Retomando o tema da crônica anterior, se confirmam os abusos praticados por oportunistas na busca de vantagem manifestamente indevida, a exemplo daquele sujeito que participou do BBB24 que, abusando da oferta de cota racial em curso de agronomia autodeclarou-se detentor de direito ao regime de inclusão dos PPI – Pretos, Pardos e Indígenas, quando, na efetiva realidade, não goza desse direito e, reflexamente, retira oportunidade de quem realmente tem o direito, ou seja, indígenas, pretos ou pardos, aos quais não se enquadrou, por qualquer prisma que se examine.

Infelizmente é muito comum nos depararmos com situações idênticas, em que pessoas inescrupulosas fazem uso desses artifícios e até maquiagens para obtenção de vantagens em concursos públicos, quer para prestação de serviços, quer escolaridade em todos os níveis.

Aqui em Jundiaí não foi diferente, pois, no ano de 2002, em parceria com a prefeitura, conseguimos aprovação da Lei nº. 5.745, de 14 de fevereiro, que reserva 20% de cotas raciais aos candidatos que se auto declararam “afrodescendentes”, em concursos municipais.

A referida lei é a primeira - do Brasil - para esse tipo de concurso, abrindo porta gigantesca da Cidade na construção e entrega de políticas de ações afirmativas com a oportunização de ingresso às pessoas original e maldosamente excluídas.

Por ocasião da formalização e divulgação desse dispositivo, o então Prefeito Miguel Haddad, em evento que realizamos nas dependências do Clube 28 de Setembro, na época sob a presidência do saudoso Ovídeo Caetano que, dentre os participantes estava o Consul do Uruguai, o qual em seu pronunciamento foi marcante ao afirmar: “O que vocês estão fazendo para os seus afro-jundiaienses, estão fazendo para os meus afro-uruguaios.”

Com o salão em sua capacidade máxima, devido a repercussão dessa lei, fez com que a imagem não só da Cidade, mas a do Prefeito alcançasse patamar mais elevado que se poderia imaginar, participando, inclusive de evento no Maksoud Plaza, na Capital do Estado, compondo mesa dos trabalhos junto ao então Ministro do STF Marco Aurélio; do Ministro da Educação Paulo Renato; Consul de Cabo Verde; do Uruguai; da África do Sul, entre outras personalidades.

O regime prosseguiu sob intensa fiscalização da sociedade em especial do Conselho da Comunidade Negra, sob minha presidência, até que, diante dos abusos a que muitos concursandos se lançaram alegando que eram “afrodescendentes” pois, apesar da pele clara, tinham avós, bisavós, trisavós e etc negros e, por conta disso, gozavam do direito às cotas!

Essa conduta, por óbvio, não era foco da proposta, até que diante desses abusos e intervenções conseguimos, de acordo com processo legislativo, por iniciativa do Prefeito Luiz Fernando Machado, após interlocução e nossa oferta de memoriais aos 19 vereadores, foi promulgada Lei n. 9.246, de 11 de julho de 2019 alterando o termo “afrodescendentes” por “pretos e pardos” e criar comissão especial de heteroidentificação. Assim, aqueles que, por “conveniência”, tentassem vantagem não o fariam se o requisito fosse “pretos ou pardos”.

No caso que abre esta crônica, causa estranheza que ao “abusador” foi conferido o direito a cota racial sem que atendesse qualquer dos requisitos fenótipos (aparência) autorizassem referido direito.

Vale lembrar daquele caso do candidato que pintou o rosto para participar de concurso junto ao INSS; daquele aprovado em concurso para juiz de direito do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que teve a posse cancelada em vista do fato de que não se enquadrava nos requisitos autorizadores a disputa da vaga com recorte racial.

Aproveitadores e oportunistas existem e em alguns casos são considerados “afroconvenientes” e não “afrodescendentes”, sendo que os primeiros, em boa medida, alegam etnia apenas quando “convém”, justificando a criação de comissões de heteroidentificação compostas por equipes multisdiciplinares que os avaliam confirmando e reconhecendo o pertencimento étnico.

As cotas raciais seriam dispensáveis se as desigualdades não fosses tão grandes e gritantes.