21 de novembro de 2024
OPINIÃO

O bom uso do dinheiro

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O Brasil é o campeão das desigualdades. Tem mais de trinta milhões de famintos. Outros milhões sem moradia. Quantos milhões sem emprego? E sem educação de qualidade, sem saúde, sem saneamento básico?

Entretanto, é uma das maiores economias mundiais. Como explicar o paradoxo?

Se a preocupação do governo e da sociedade fosse propiciar a todos os brasileiros uma educação consistente, quase todos os males tupiniquins teriam sido extirpados. Povo educado sabe escolher seus representantes. Sabe frear iniciativas como orçamento secreto, compra de apoio, desvio de verba, toda espécie de conchavo para fazer com que o suado dinheirinho do povo não chegue ao seu real destino.

Povo educado não emporcalharia vias públicas, terrenos baldios, todos os espaços, inclusive rios e córregos, com todo o descarte produzido por uma sociedade desprovida de consciência ambiental.

A responsabilidade é de todos, mas há poucos indivíduos que atuam contrariamente à insensibilidade geral. Uma sociedade consciente produziria, ela mesma, uma economia circular. As coisas são criadas, são destinadas ao uso e, uma vez utilizadas, devem ter uma destinação que não comprometa a saúde humana e a saúde da Terra.

O bom exemplo é da Tetra Pak, cuja primeira fábrica no Brasil foi inaugurada em Monte Mor, em 1978. De 2018 a 2022, ela recolheu e destinou para reciclagem quatrocentas e cinquenta mil toneladas de caixinhas do modelo "longa vida".

Essa embalagem acondiciona leite, sucos e outros alimentos. Antigamente, ninguém se preocupava com o crescente descarte das embalagens, do papelão, do papel e dos vidros. Hoje, essa necessidade é urgente. As cidades que levam a sério a capacidade contributiva de sua cidadania têm de criar uma cadeia de reciclagem.

Para isso, é preciso criar e conscientizar os catadores. O programa "Conexões" é mantido pela Tetra Pak há quinze anos. São mais de 1.500 cooperativas pelo país, mapeadas e acompanhadas pela empresa. Mas é preciso também conscientizar o consumidor final, o usuário do produto.

A formação de cooperativas de catadores é o caminho para a solução de vários problemas. Primeiro, o indiscriminado abandono de embalagens utilizadas por todos os lugares. Depois, faz com que uma população desprovida de emprego tenha condições de um sustento digno. Cria-se a mentalidade da economia circular.

As prefeituras afinadas com a maior ameaça a que a humanidade hoje se sujeita – a mudança climática – têm obrigação e têm condições de criar projetos como o "Recicla Cidades", cuja objetivo é promover ações educacionais para engajamento ambiental nas escolas, praças, supermercados e clubes, igrejas e quaisquer outros lugares frequentados pela população. Abordagem de esclarecimento sobre os benefícios da reciclagem para a comunidade, convencer o morador de que o catador é um agente ambiental que trabalha para a conservação do meio ambiente, incentivar a coleta seletiva, tudo isso está na mira do "Recicla Cidades".

Essa iniciativa de uma empresa tem sido objeto de réplica em inúmeros municípios. Nada impede, ao contrário, tudo recomenda, que o Poder Público local promova o seu próprio projeto e leve a sério a educação ambiental e as medidas para tornar o descarte algo que não comprometa a ecologia e que signifique melhor uso do dinheiro do povo. Povo educado não precisaria gastar milhões com varrição, coleta de lixo, destino aos famigerados aterros sanitários, que são focos de contaminação e que demoram centenas de anos para voltar ao status quo ante. Aquilo que era limpo e que nós poluímos com a nossa falta de educação ambiental.

José Renato Nalini é reitor de universidade, docente de pós-graduação e Secretário das Mudanças Climáticas do Município de S.Paulo (jose-nalini@uol.com.br)