Nem sempre vender seu futebol profissional (em forma de SAF) para um Terceiro, é sinônimo de sucesso e fim das pendengas financeiras. Vamos a algumas observações:
1- O Botafogo-RJ (que vendeu 90% da sua SAF a John Textor, investidor americano que tem participação no Benfica-POR e é dono do Crystal Palace-ING e do Lyon-FRA), não tem repassado 20% das receitas como a lei manda. Ele prefere tentar fazer acordos paralelos com os credores, descumprindo a lei. Fora isso, há uma mágoa de parte da torcida que enfim entendeu que uma SAF é baseada em negócios, e que dos clubes que Textor possui, não necessariamente o Fogão terá um investimento para ganhar títulos.
2- O Cruzeiro-MG vendeu 90% da sua SAF por 10 parcelas anuais de R$ 40 mi (se bobear, quase o valor de um jogador de ponta) ao Ronaldo Nazário. Ao invés de pagar a dívida da Raposa no percentual de 20%, pediu recuperação judicial (a antiga concordata) e os acordos não aconteceram ainda, por conta da burocracia da Justiça.
3- O Vasco-RJ vendeu sua SAF ao grupo 777 (70% a R$ 700 mi), e está pagando as dívidas no limite de 20% das receitas. Porém, não está incluindo os aportes financeiros que os investidores fazem, mas somente as arrecadações com venda de atletas e outras receitas.
Fica o detalhe: esses clubes endividados precisaram de uma SAF para pagar as contas. Mas Flamengo e Palmeiras, que se reinventaram financeiramente (após os "choques de gestão" promovidos por Eduardo Bandeira de Melo e Paulo Nobre, respectivamente, profissionalizando a administração dos seus clubes), não precisam de SAF.
Mas há outros casos de clubes-empresas bem sucedidos (que não optaram pelo modelo SAF), com contas saneadas e nova filosofia de trabalho: o Bahia, que foi adquirido pelo Grupo City (do Manchester City) e o Bragantino (pela Red Bull). Isso também é uma tendência, a de vender "de porteira fechada" o clube.
Em outra dimensão, há pequenos clubes-empresas voltados à formação de atletas, que possuem um dono e que tem gestões louváveis (e que se espalham pelo Brasil, abrindo mão do futebol profissional e se dedicando a comercializar "pé-de-obra": o Metropolitano (de Campo Limpo Paulista-SP), o Sphera (de Salto-SP) e tantos outros. Esses não querem sócios, são empresas de futebol. Porém, nem sempre ser empresa quer dizer ótimo resultado esportivo: vide o Audax, de propriedade do Sr. Mário Teixeira (o número 3 do Bradesco) que foi vice-campeão paulista anos atrás e em 2023 foi rebaixado para a 4ª divisão.
Evidentemente, os modelos S.A.F.s são diferentes de S.A.s que o mundo conhece, como o Bayer-ALE, que tem participação societária da Adidas, da Audi e da Allianz, do Manchester United-ING (ações da Família Glaze, que também é dona do Tampa Bay-USA, da NFL). Por fim, há outros modelos, os "clubes-estado" (fazendo a alusão de cidade-estado) como o Newcastle e o PSG (com dinheiro da Arábia Saudita e do Catar).
Devido a pindaíba que os clubes estão (especialmente os pequenos), aceita-se atualmente qualquer suposto "investidor" (por mais aventureiro que seja) a fim do time não quebrar de vez. Desde parceiros que são simplesmente empresários que colocam seus jogadores no elenco, até treinadores que trazem seu "combo de atletas". Pior: há quem se associe com qualquer um, sem se preocupar com a idoneidade do sócio, e vende sua SAF. Vide, recentemente, o caso do Gama-DF, que "despejou a sua SAF" do seu CT e entrou na Justiça para revê-la.
Como se vê, a SAF não é um "sonho dourado".
Rafael Porcari é professor universitário e ex-árbitro profissional (rafaelporcari@gmail.com)