29 de dezembro de 2024
OPINIÃO

O horror em Maceió

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Algo terrível está acontecendo e ninguém dá a devida atenção.

A Braskem, uma empresa petroquímica brasileira, está envolvida em uma situação que podemos chamar, no mínimo, de delicada em Maceió, capital de Alagoas, relacionada às atividades de extração de sal-gema na região.

Também denominada halita, trata-se de um mineral formado principalmente por cloreto de sódio (NaCl), o mesmo componente principal do sal de cozinha. Esse mineral é encontrado em depósitos densos em diversas partes do mundo. Seu processo de extração geralmente é feito com a identificação de depósitos por meio de levantamentos geológicos, frequentemente encontrados em camadas subterrâneas.

Desde 1976 a Braskem minerou sal-gema em Maceió. Lá ele é retirado de uma profundidade de 1,2 mil metros. O processo é até simples: em linhas bem gerais, uma mina é cavada e depois preenchida com água, que se mistura ao sal, sai por outro lugar e aí se faz a separação da halita.

Bem, isso tem sido feito há décadas contando sempre com a anuência da ditadura militar brasileira, além de todos os governos estaduais e prefeitos eleitos desde então. Inclusive, espantosamente, com a aquiescência dos órgãos ambientais de fiscalização.

Feita de modo inadequado, desrespeitando todas as regras, as minas de sal-gema da Braskem foram exploradas perto uma das outras, em alguns casos encontrando-se para formar falhas que hoje são responsáveis pela destruição de 4 bairros de Maceió e pela remoção de 55 mil pessoas de suas casas.

As casas passaram a apresentar rachaduras e afundamentos, com a fundação comprometida.

A única opção dessas famílias foi aceitar um acordo com a Braskem que pagou em 2021 míseros R$ 81 mil reais para cada uma, insuficiente para adquirir um imóvel em outro lugar e certamente insuficiente para cobrir todos os danos causados.

Os bairros vazios se tornaram fantasmas e o cenário é de guerra e desolação; ruas, casas, lojas e até prédios inteiros tiveram as portas e janelas substituídas por tijolo e cimento, como que muros impedindo a entrada de quem possa buscar algo de valor que de repente alguém tenha deixado para trás. Outros imóveis foram cercados com placas de alumínio que cobrem as fachadas.

O mato cresce fora e dentro das ruínas desgastadas e depredadas. Os muros são marcados por uma série de números pintados em vermelho, indicativos dos registros de desocupação. Em algumas fachadas, há também pichações que vão desde palavras de ordem contra a Braskem e o poder público a desabafos e lamentos pela dor dos que tiveram essa parte de sua história arrancada e foram obrigados a seguir em outros lugares.

Sem falar nos negócios, nas relações humanas, nas memórias. Nos planos de uma vida melhor que afundaram.

Nenhuma indenização cobre.

Para muitos estudiosos é considerado "o maior desastre em área urbana em andamento" no mundo hoje.

E fico sabendo que o governo do estado de Alagoas resolveu multar a empresa em... absurdos R$ 72 milhões de reais.

Tantas vidas.

Tantos planos.

As vidas de tantas pessoas, suas aspirações e histórias, valem muito pouco mesmo.

E pouco se fala disso. pouco se cobra.

É realmente desanimador.

Samuel Vidilli é cientista social (svidilli@gmail.com)