25 de dezembro de 2024
Opinião

Amizades sólidas se tornam líquidas?

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Semana que passou, recebi de uma amiga, vivendo ano sabático atualmente na Austrália o seguinte relato, com trecho enorme que reproduzo para dar contexto a este artigo. 

Amiga querida: já quase sessenta dias vivendo pelo menos doze horas na frente aí no Brasil e no momento em que te escrevo essa mensagem já são quatorze. 

Agora entendo quem mora por aqui na Austrália ficar tão feliz de ter mais brasileiros por perto, é realmente difícil a comunicação quando estamos separados por tantas horas de diferença.

Mas, ao mesmo tempo, aqueles que de quem eu consegui me manter próxima mesmo com esse fuso, ganharam o selo de amizade que vai ficar pra sempre, como você! (risos)

Pensei muito sobre amizade aqui, sabe, Márcia… Conheci novas pessoas que tenho a sensação que vão permanecer e, ao mesmo tempo, acabei pensando em pessoas antigas que não lembro a última vez que falei.

Até mesmo aí no Brasil, já são mais de dois anos morando em outra cidade. Esse tempo naturalmente mudou muita coisa em relação às minhas amizades. É diferente ter uma vida em outro lugar.

São realmente muito poucas as pessoas que a distância não mudou em nada a nossa relação.

É estranho perceber que as amizades também acabam tendo um fim ou mudando tanto. Pelo menos pra mim é, tem sido.

Vivo em um misto de "...é isso mesmo, a vida é assim, rumos diferentes. Tá tudo bem!" com "caramba, é isso mesmo? Será que tá certo isso aí?..."

Perceber que tenho mais conexões e semelhanças com pessoas novas do que muitas das antigas também me traz uma sensação estranha.  No final, não tem uma melhor do que outra, são diferentes. Mas pensar sobre isso é um pouco desafiador.

E principalmente assumir: não é mais a mesma coisa.

Enfim, era um post sobre Vanuatu e acabei falando sobre uma coisa que ando pensando bastante. Quero na volta falar mais pessoalmente sobre.

Última semana de viagem, lá vamos nós! Com amor e saudade, da sua amiga maluca, a J...

Eu confesso que fiquei um tanto reflexiva, pra não dizer de certa forma perturbada mesmo, com a mensagem da Jojoca. 

E imediatamente coloquei-me a pensar quem eram essas pessoas hoje, ao longo de toda a minha vida. 

Como na composição do Milton Nascimento, talvez possa ser mesmo muito verdade, retrato da vida como ela é, o verso de encontros e despedidas "...são só dois lados da mesma viagem, é a vida..."

O que houve com R, que nos tratávamos de beloved, sempre considerei-a minha melhor amiga com sinceridade e depois, por um suposto acontecimento que nem lhe dissera respeito, simplesmente não nos falamos mais, assim, sem nenhuma explicação racional ou plausível tão pouco? 

E com T, que todos os anos fazia questão que eu estivesse em sua festa de aniversário, de âmbito exclusivamente restrito à família e ela fazia questão de dizer que eu à família então pertencia também? 

Ficando nas duas pessoas que mais me fazem sentir que terminar uma amizade sem ter terminado de fato, com diálogo de encerramento de ciclo, talvez seja mais doloroso, a depender do contexto e dos fatos envolvidos, que terminar um relacionamento amoroso.

Ou então, voltando à canção do Milton, nunca antes havia sentido tanto o peso de que "...o trem que chega é o mesmo trem da partida, a hora do encontro é também despedida. É a vida deste meu lugar, é a vida..." Deve mesmo ser!

Márcia Pires é sexóloga e gestora de RH (piresmarcia@msn.com)