21 de novembro de 2024
Opinião

Um ensaio sobre a saudade

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Ah a saudade. Todo mundo sente. A grosso modo, saudade é o sentimento que a falta de alguma coisa lhe causa. Mas eu resolvi filosofar mais sobre isso e dividir esse devaneio com você.

Vamos partir do princípio de que todos nós somos regidos por uma energia. Essa energia oscila, ora para cima, ora para baixo. Essa energia, chamada de Potência de Agir por Espinosa, sofre essas variações a depender do encontro que você tem com o mundo que, por sua vez, lhe afetará, lhe provocando um afeto. O afeto é a tradução em sentimentos do estado da sua potência de agir - se você ja acompanha meus textos já está familiarizado com essa ideia.

Quando você tem um encontro que te afeta positivamente, você tem um aumento de potência que pode ser chamado de alegria. Agora quando um encontro te afeta negativamente, você tem uma diminuição de potência que pode ser chamada de tristeza.

Vamos focar nos encontros alegres. Mas agora na perspectiva de outro filósofo: o bigodudo, Nietzsche. Ele compreende que aquilo que te causa alegria é o instante de vida que você quer que não acabe. Ele chegou a essa conclusão graças a ideia do Eterno Retorno - e eu também já falei sobre o assunto recentemente por aqui.

Portanto, o instante de vida que vale a pena ser vivido, no conceito desses dois filósofos, é aquele que te causa alegria e, por te causar alegria, você gostaria que durasse para sempre. Mas não dura e uma hora o desencontro vem.

Penso que todos os encontros que temos com o mundo fazem com que surja em nossa alma blocos de sensações. Esses blocos são as nossas experiências que vão fortificando nossa essência. Esses blocos se unem formando uma espécie de parede, um grande mural que representa tudo aquilo que você experimentou. Esse mural é único para cada pessoa, pois cada pessoa experimenta o encontro com o mundo de uma maneira extremamente particular. Alguns murais são mais lisos, outros são mais ásperos. Mas todos possuem uma característica em comum: a existência de buracos.

Quando temos um encontro alegre, um bloco de alegria surge imediatamente nesse muro na sua alma. E lá ele permanece fortificando a parede da sua essência. Mas quando há o desencontro, a ruptura, o fim do encontro alegre, esse bloco se fragmenta e desaparece, deixando um verdadeiro buraco na alma. Esse buraco eu chamo de saudade.

Então o recurso é tentar "matar" a saudade preenchendo esse vazio. Mas isso é impossível, pois você precisaria construir um bloco exatamente igual ao anterior e nós sabemos que todos os encontros sempre são inéditos, únicos e particulares, logo, cada bloco construído será inédito, único e particular.

Isso parece triste, mas na verdade não é. A saudade é a confirmação metafísica de que você viveu um momento alegre, um momento no qual você queria que durasse para sempre, um instante de vida que valeu a pena viver. E é aqui que a gente pode entender a razão por não sentirmos saudades de momentos ruins. Mais, percebemos também que quanto mais saudades temos, mais instantes que valeram a pena viver nós vivemos.

Fico satisfeito em saber que ao invés de preencher um buraco, vou criar outros blocos. E assim seguirei sendo um colecionador de momentos alegres. E que bom que tenho saudade. Ela me faz lembrar de todos eles.

E você? Sente saudade do que? Ou melhor: quais são os buracos na sua alma?

Conhecimento é Conquista.

Felipe Schadt é jornalista, professor e cientista da comunicação (felipeschadt@gmail.com)