23 de novembro de 2024
Opinião

Desarmando bombas nas escolas

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Sou professor há dez anos e vou confessar uma coisa para você: eu nunca me senti inseguro dentro de uma sala de aula como eu me sinto hoje. Claro que isso é resultado direto do pânico que os recentes ataques a escolas está causando em mim, em alunos e em seus pais. Precisamos discutir sim se esse medo todo é justificável e se a sensação de insegurança é plausível, porém, mais importante do que refletir sobre isso seja talvez pensarmos duas coisas: de onde vem essa tendência violenta nas escolas e se há meios concretos para enfrentar essa situação.

Vamos começar pelo básico. Toda notícia sobre ataques em escolas com tiroteio, alunos assassinando colegas e professores, massacres, sempre vinham acompanhada da distância. Eram fatos que aconteciam nos EUA, longe de nós e, portanto, distante da nossa realidade. Nós não estamos acostumados (ainda bem) com esse tipo de situação.

Lembro que a primeira vez que eu ouvi uma notícia dessas aqui em solo brasileiro foi em 2011, no dia 7 de abril. O "Massacre do Realengo" chocou o país após deixar 12 crianças entre 13 e 15 anos mortas em uma escola no bairro do Realengo, na Zona Oeste do Rio de Janeiro.

De lá pra cá, muita coisa aconteceu nas mais de 190 mil escolas do país. Alguns outros episódios de violência foram noticiados, mas ainda não eram capazes de nos comover tanto assim ao ponto de ficarmos com medo. Sempre tivemos outras preocupações quando o assunto era Educação: escolas sem estrutura, professores mal remunerados, alunos em situação de vulnerabilidade social, agora massacres e assassinatos definitivamente não.

Nas últimas semanas uma onda de ataques e ameaças fizeram o tema entrar na nossa agenda de discussões. Professores e gestores de escolas preocupados, alunos assustados e pais com medo. Tudo isso somado às tantas fragilidades que o ensino brasileiro possui - sobretudo o público - é a receita perfeita para o pânico generalizado. De repente, todos nós percebemos que a escola não é um lugar 100% seguro.

Não é porque a tônica desses ataques é a mesma: de dentro pra fora. Na maioria das vezes que eles acontecem, aqui ou no exterior, é sempre promovida por um aluno que, até o fato acontecer, é só mais um estudante em um dia normal de aula. Uma bomba relógio silenciosa que é muito difícil de se desmantelar a tempo.

Essas bombas não surgem do nada. Há inúmeros fatores que colaboram para esse comportamento violento nas escolas. Poderia gastar o resto do meu texto listando cada um desses fatores, mas quero te atentar a um que salta aos olhos: o ódio que foi plantado nesse país nos últimos quatro anos está brotando e dando seus primeiro frutos. Sim, eu acredito que essa onda de ataques a instituições de ensino são um efeito colateral do bolsonarismo e de tudo que ele pregou a respeito do armamentismo e da intolerância.

Mas como desmantelar essas bombas? Eu sou um educomunicador, acredito que uma das saídas mais eficazes (muito mais do que simplesmente transformar as escolas em réplicas de presídios de segurança máxima, mais do que já são) está no acolhimento e na educação midiática.

Primeiro, a escola precisa assumir de vez seu papel formador de caráter além da formação acadêmica. Para isso, o aluno precisa reconhecer que naquele espaço ele possui voz ativa e que o ambiente escolar é um local no qual ele possa se desenvolver como protagonista. Uma escola que acolhe as virtudes ao invés de podá-las é uma escola que promove o protagonismo juvenil. Esse aluno será crítico, emancipado e com consciência social e ao receber afeto e amor para o seu próprio desenvolvimento, aprenderá a transformar o mundo e as pessoas ao seu redor com afeto e amor.

Segundo, a escola precisa esquecer imediatamente essa ideia de que os smartphones são inimigos da educação. O celular já é uma extensão do corpo humano - Marshall McLuhan quem o diga - e privar o aluno de usá-lo é como pedir para que ele entre na aula faltando uma parte. Só que mais do que entender isso é ensinar as crianças a usarem o celular e isso é educação midiática. Uma vez dominando a produção de conteúdo, os jovens passam a entender seu funcionamento e ter mais condições de filtrar o que é bom e o que não é bom.

É possível desarmar essas bombas, basta querer.

Conhecimento é conquista.

Felipe Schadt é jornalista, professor e cientista da comunicação (felipeschadt@gmail.com)