Desde sempre, as mais diversas abordagens terapêuticas, sobretudo as que se utilizam das bases cognitivo comportamental e psicanálise, permanecem lançando luz sobre a resolução de traumas utilizando a terapia da palavra como principal recurso de decifração. Sim, a terapia da palavra é muito importante, já que não existe outra forma de trabalhar o consciente que não seja através da linguagem.
A boa notícia é que atualmente contamos, sobretudo nos últimos quinze anos, com os enormes avanços da tecnologia de neuroimagem. Tais avanços são o que tem possibilitado saltos significativos no entendimento e interpretação da psicofísica do trauma. Só falar sobre os traumas não basta.
No Brasil já existem escolas modernas a serviço de elucidar que o trauma não está no evento traumático em si, mas nas marcas que ele deixou no corpo. É a chamada visão do cuidado informado sobre trauma. Um conjunto de conhecimentos multidisciplinares que trata o trauma a partir de um leque adicional de perspectivas terapêuticas. Os maiores autores em nível mundial dos estudos da visão trauma informed são praticamente unânimes na constatação de que a traumatização não está retida na mente, mas sim, no corpo, no chamado sistema corpo mente.
Importante citar que toda traumatização vem de um trauma, mas nem todo o trauma se transforma em traumatização. O trauma pode ser também definido como algo que experenciamos internamente quando algo ocorre de forma inesperada, sem que tenhamos estratégias imediatas para lidar com aquele fato e que nos causa ativação emocional elevada.
Apenas pela ocorrência de uma ativação emocional elevada de forma pontual, não podemos dizer que houve traumatização, pois nascemos já preparados "de fábrica" para lidar com elevações do sistema nervoso. O problema se dá quando o sistema não encontra meios de voltar à fisiologia de segurança, à homeostase e acumula residual de stress que perdura no tempo.
Como exemplo prático para que você leitor compreenda do que se trata uma potencial e possível traumatização, imagine que uma pessoa reaja de forma igual e descontrolada em qualquer situação, da mais corriqueira, como derrubar uma xícara de café sobre uma mesa até uma briga real. Uma pessoa traumatizada costuma se comportar sempre com uma mesma resposta de defesa fixada, independentemente da gravidade ou não, do fato que lhe acomete.
Felizmente há reparação, pois somos todos dotados do que se chama neuroplasticidade cerebral. Até o final dos nossos dias, todo comportamento aprendido pode ser desaprendido e reaprendido. Para que um sistema traumatizado possa ser reparado, ele precisa ser auxiliado no processo de cura com ferramentas e recursos disponíveis sem grandes dificuldades, como exercícios de respiração, trabalho adequado de regulação emocional, entre outros. Com isso já é possível afirmar, graças às mais modernas descobertas da neurociência, da psicologia somática, psicanálise e terapias corporais, que não precisamos mais permanecer reféns dos nossos traumas, pois eles não mais passarão a guiar as nossas decisões, paralisando a vida pelo mecanismo do medo condicionado. Trauma tem cura!
Márcia Pires é sexóloga e gestora de RH (piresmarcia@msn.com)