22 de dezembro de 2024

Na dúvida, não vote por você

Por |
| Tempo de leitura: 4 min

Embora o número de votos brancos e nulos dessas eleições seja menor do que foi no pleito de 1994, ainda sim foram 5,4 milhões de pessoas que não se viram representadas por nenhum dos candidatos à presidência. Isso representa 4,4% do eleitorado, metade se comparado a 2018.

Porém, a abstenção atingiu 20,3% do total, maior percentual desde 1998, segundo reportagem do G1. Entre os estados, o Pará aparece como o que teve menos votos brancos e nulos (2,29%), enquanto São Paulo é o que tem maior percentual (5,64%). No Brasil inteiro, mais de 32,7 milhões de pessoas não foram às urnas no dia 02 de outubro.

Resumindo a ópera: estamos falando de mais de 38 milhões de brasileiros e brasileiras que escolheram não escolher, ou seja, um quarto dos eleitores. É muita coisa.

Claro que não podemos generalizar. Nem todo mundo que absteve do voto fez isso de livre e espontânea vontade. Segundo o Datafolha, 22% das pessoas que não foram votar alegaram motivos de saúde, 15% por estarem viajando no período das eleições e outros 12% por estarem trabalhando. Porém, 15% dos entrevistados disseram que não foram votar por desinteresse nas eleições. A tendência, segundo especialistas, é que o número de abstenções aumente no segundo turno, podendo ultrapassar até 23% dos eleitores.

Nessas horas eu me lembro de Jean-Paul Sartre, o filósofo francês existencialista que disse certa vez que "somos indivíduos livres e nossa liberdade nos condena a tomarmos decisões durante toda a nossa vida". Ou seja, não podemos fugir do ato de escolher. Escolhemos toda hora e é isso que nos concede a condição de ser o que somos.

Veja. Você está escolhendo agora continuar ou não essa leitura. Você escolhe toda hora para onde olhar. Escolhe o que falar. Escolhe até mesmo o que vai pensar. Escolher é uma natureza humana e arcar com as consequências das suas escolhas é o ônus dessa liberdade. Por isso muita gente resolve não escolher (ou ter a sensação de que não escolheu, já que não escolher é escolher não escolher).

Quando você escolhe votar no Lula, você será indiretamente responsável por aquilo que ele vier a fazer caso seja eleito, do mesmo jeito que você, eleitor do Bolsonaro, é co-responsável por tudo que ele fez durante sua gestão, sejam coisas boas ou ruins. Sua escolha, sua responsabilidade. Lide com isso.

Agora, se você resolve escolher não escolher nenhum dos dois, você está - no ponto de vista existencialista - sendo covarde. Oras, é muito fácil poder dizer: "A culpa não é minha, não fui eu quem escolhi". Isso se chama fugir da responsabilidade cívica que o voto te trás, afinal de contas, independente de quem vença, ele será seu governante também.

Outro ponto interessante da filosofia existencialista de Sartre é o que ele diz sobre o que as escolhas fazem com a gente. Nós somos resultados direto daquilo que escolhemos. Por exemplo: se você escolhe por morar no campo, essa escolha fará de você um homem do campo que, por consequência, moldará suas escolhas futuras tendenciando-as. Logo, você é o denominador comum de todas as escolhas que você fez até aqui.

Eu entendo você não querer escolher entre Lula e Bolsonaro. Mas se você está na dúvida, se nenhum deles te representa, então não escolha por você. Escolha pelos outros, principalmente pelos mais necessitados.

Eu não vou votar no Lula só por minha causa. Eu tenho uma vida até que confortável e mesmo com o Bolsonaro, eu não passei necessidades financeiras, mas eu vi e conheci muita gente que sofreu e sofre por causa das más decisões do atual presidente. Também conheço um monte de gente que era mais feliz e tinha mais condições quando o Lula estava no poder. Se eu olhasse para o meu próprio umbigo e pensasse só em mim, tanto faz quem vencesse. Mas eu decidi olhar para o outro e perceber que enquanto estou tendo três refeições por dia, 33 milhões de pessoas não sabem se vão comer amanhã. É por essas pessoas que eu voto.

Somos um país majoritariamente cristão, certo? Bom, deixo então o maior ensinamento de Cristo para você refletir junto com o que eu acabei de dizer: "Um novo mandamento dou a vocês: Amem-se uns aos outros. Como eu os amei, vocês devem amar-se uns aos outros." João 13:34.

Não vote por você. Vote por quem mais precisa.

Conhecimento é conquista!

Felipe Schadt é jornalista, professor e cientista da comunicação pela USP