A lua de mel acabou? O entusiasmo pelo início do mandato começa a dar lugar, pouco a pouco, a olhares de reprovação e debates acalorados entre os vereadores. Na última terça-feira, 14, durante a sessão ordinária da Câmara Municipal de Franca, Leandro O Patriota (PL) e Marília Martins (PSOL) protagonizaram um embate sobre o tema das fake news.
Sentados lado a lado no auditório da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de Franca, os parlamentares se revezavam no uso do microfone. As trocas de palavras eram escassas, apesar de compartilharem algumas pautas, como a defesa dos direitos das pessoas com TEA (Transtorno do Espectro Autista). Semelhanças que terminavam durante os discursos.
A discussão começou durante o discurso de Patriota no período da manhã, ao pedir à equipe técnica da Casa de Leis que reproduzisse uma reportagem do Jornal da Record sobre o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ter assinado uma medida provisória que previa uma pensão vitalícia para crianças diagnosticadas com microcefalia entre 2015 e 2018. O conteúdo jornalístico era do dia 4 de setembro de 2019.
Patriota solicitou, na sequência, a reprodução de outra matéria do Jornal da Record. O conteúdo mostrava mães de crianças com microcefalia protestando em frente a uma agência do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) em Recife (PE). Segundo a reportagem, as famílias estavam há dois meses sem receber o BPC. O Ministério da Cidadania justificou a situação como resultado de divergências nos dados dos beneficiários em Pernambuco. A matéria foi ao ar em 18 de julho de 2019.
Após a exibição das reportagens ao público, o vereador argumentou que a medida provisória — que prevê o pagamento de pensão para crianças com microcefalia — foi transformada em lei. “Quando chegou à Presidência do governo atual, ele (o presidente Lula, PT) vetou o projeto”. Patriota completou que a base do Partido Liberal está mobilizada para derrubar o veto. “O que quero pedir aos nobres amigos (parlamentares) que são da esquerda é que eles também pressionem os deputados de esquerda que são da base do governo atual”.
Durante a manhã, na continuidade dos discursos, Marília Martins respondeu às alegações sem mencionar diretamente o colega parlamentar. “Hoje a gente já ouviu algumas inverdades. Eu convido vocês, já que não vou usar muito meu tempo para falar sobre isso, em relação ao BPC, a checarem as fontes oficiais das alterações e dos vetos feitos. Inclusive, um dos vetos foi justamente para não classificar graus leves e moderados, retirá-los do BPC, e sim manter quem já tem esse benefício, incluindo alguns critérios de checagem para quem tem direito a ele”.
As discussões entre os colegas de Legislativo se estenderam no período da tarde. “Hoje contestei algumas das notícias inverídicas que foi circulada. Quero compartilhar que não procede que o Governo Federal tenha deixado as vítimas do Zika sem amparo”, reafirmou Marília.
Patriota pediu para usar o tempo destinado à liderança do Partido Liberal. O parlamentar de direita reproduziu um vídeo do UOL com a manchete: Lula veta pensão a crianças com microcefalia vítimas de zika e revolta mães. “Só para deixar claro que as informações são oficiais. Não estou falando nada de ‘orelhada’ aqui. Não estou pegando informações falsas em lugar nenhum. O que a gente precisa é trabalhar junto a deputados federais para que a gente possa encontrar a melhor solução”.
É falso! O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vetou, em 17 de dezembro, um projeto de lei que previa a criação de uma pensão mensal no valor de R$ 8.150,47 para pessoas com deficiência permanente causada pela infecção do vírus Zika. O texto também incluía o pagamento de uma indenização única de R$ 50 mil e a autorização para acumular essa assistência com o BPC. O veto do petista não afeta o benefício vitalício instituído pelo governo de Jair Bolsonaro em 2019.
Após vetar integralmente esse novo projeto em discussão em dezembro, o presidente Lula publicou, no Diário Oficial da União de 9 de janeiro, uma medida provisória que concede um apoio financeiro de R$ 60 mil, em parcela única, para pessoas nascidas entre 1º de janeiro de 2015 e 31 de dezembro de 2024, que possuem deficiência decorrente do vírus. Esse valor não será somado à renda do beneficiário para efeitos de permanência no Cadastro Único, nem será considerado para fins de elegibilidade ao recebimento do BPC.
O Portal GCN/Rede Sampi conversou com os vereadores após a sessão. Marília afirmou que o debate é parte essencial da Casa de Leis, mas ressaltou sua oposição a informações falsas. "Como eu disse no meu primeiro discurso, na minha primeira sessão, eu não compactuo com fake news, com a exclusão e com outros critérios que muitas vezes podem ser utilizados por quem não tem uma informação correta e não a verifica".
A vereadora acrescentou que se sentiu responsável por trazer informações precisas ao debate. "Hoje eu agi no meu dever de parlamentar, mas também de uma pessoa que checa informações, não fica pegando tudo o que assiste na televisão ou na internet ou recebe da tia do zap e joga num lugar que legitima essas informações".
Patriota minimizou a situação e afirmou que não há qualquer problema com Marília. "Nessa questão aqui não é nem questão de conflito, não tem nada pessoal contra a vereadora. Ela tem a pauta dela, defende a bandeira dela, que é a esquerda, e eu defendo a minha bandeira, que é a direita. Os conflitos são de ideias e informações".
"Se o governo federal fez alguma alteração nas últimas semanas e eu não fiquei sabendo, pegarei essas informações, levarei para a próxima sessão, colocarei no telão da mesma forma que fiz anteriormente, e apresentarei as informações atualizadas", finalizou.