17 de novembro de 2024
GAZETILHA

Um outro jogo começou

Por Corrêa Neves Jr. | editor do GCN/Sampi
| Tempo de leitura: 5 min
Vereador Daniel Bassi, deputada estadual Delegada Graciela, prefeito Alexandre Ferreira e vereador eleito Marco Garcia

"A política é a arte de impedir as pessoas de 
se meterem no que lhes diz respeito"
Paul Valéry, poeta e filósofo francês

Alexandre Ferreira (MDB) e os 15 vereadores eleitos tomam posse no próximo dia 1º de janeiro para mandatos que se estendem até 31 de dezembro de 2028. Oficialmente, é a partir deste primeiro dia do ano que os compromissos e obrigações de cada um começam a valer. Mas, na prática, este é um jogo que já está em pleno andamento. Peças são escolhidas, formações táticas analisadas e decisões tomadas muito antes do apito inicial. Mesmo porque, desde já, há muita gente de olho na disputa para deputado federal e estadual em 2026, sem falar na própria sucessão municipal em 2028.

Coube ao prefeito reeleito, Alexandre Ferreira, os primeiros movimentos. Durante a campanha, Alexandre, que havia recebido apoios expressivos de distintos partidos e até de ex-adversários, garantiu que nada estava condicionado a cargos no primeiro escalão.

Talvez tenha faltado a estes interlocutores fazer algumas sessões de análise ou terapia. Ali, aprende-se, desde muito cedo, que parte de qualquer conversa é o que se fala, outra, muito importante, é o que se escuta. Nem sempre quem fala e quem ouve têm o mesmo entendimento do discurso.

Independente do que tenham deduzido seus aliados durante as sempre desgastantes negociações de apoio, os primeiros secretários confirmados para o próximo governo sinalizam que Alexandre Ferreira vai cumprir sua promessa eleitoral e seguir sem fazer qualquer concessão para agradar aliados. Os nomes quem escolhe é ele, a partir de suas próprias convicções.

Por enquanto, são quatro confirmados: Waléria Mascarenhas (Saúde), Petersson Facirolli (Administração e Recursos Humanos), Raquel Pereira (Finanças) e Lucimara do Prado (Desenvolvimento). O quarteto ocupa os mesmos cargos hoje. Não têm ligações partidárias, são técnicos e, exceção feita a Lucimara, cujo trabalho é majoritariamente avaliado como “tímido” pelo ambiente político e empresarial, na mais generosa das hipóteses, os demais são considerados bons quadros, competentes, que deram conta da missão, especialmente as sempre elogiadas Waléria e Raquel. Mais ou menos elogiados, todos seguem a filosofia do prefeito, não estiveram envolvidos em escândalos e seguem firmes para mais quatro anos.

Faltam muitos nomes ainda, mas quem acompanha os bastidores dificilmente acredita que haverá alguma grande surpresa. A avaliação de pessoas com acesso direto ao prefeito Alexandre Ferreira é que haverá no máximo duas ou três mudanças no primeiro escalão – isso, se houver. O mais provável é que as caras novas sejam alocadas como “secretários adjuntos”, ou “coordenadores”, funções a serem criadas na reforma administrativa, que segue em estudo. Mas quem aguarda uma revolução, melhor esperar sentado. Ou aguardar 2028.

Se na cozinha da prefeitura a transição segue sem surpresas, na relação com os vereadores eleitos há sinais de que pode haver mais dificuldades. Não que Alexandre esteja ameaçado neste instante por um bloco de oposição radical, mas a disputa pela presidência tem emitido sinais de que pode haver complicações inesperadas.

O favorito neste instante é Daniel Bassi (PSD), que faz parte da base de apoio a Alexandre. Reeleito com boa votação, começou cedo a articular. Conseguiu algumas promessas de apoio de colegas também reeleitos. Como havia mais interessados em comandar o Legislativo, caso de Marcelo Tidy (MDB), também da base, Bassi resolveu fazer um movimento mais ousado – e perigoso. Para atrair a bancada do PL, que soma quatro vereadores, e conseguir pelo menos nove votos na disputa, ofereceu a posição de vice-presidente ao estreante Fransérgio Garcia.

É preciso entender que o PL não é apenas a legenda pela qual concorreu João Rocha, que foi para o segundo turno contra Alexandre Ferreira. É também a casa da deputada delegada Graciela, a quem o prefeito imputa responsabilidade pela conduta beligerante de João Rocha. Justa ou injusta, esta é a percepção do prefeito. E ter um vereador do partido da deputada como vice-presidente da Câmara não é exatamente um cenário de sonhos para o governo. Nem para os vereadores de esquerda, pouquíssimo entusiasmados com um nome ligado ao bolsonarismo na segunda cadeira mais importante da Câmara.

Como desatar o nó amarrado por Bassi? Ninguém sabe. Oficialmente, o gabinete não vai se envolver, mas qualquer movimento do prefeito tem evidente peso na disputa. Há quem aposte que poderão tentar um outro nome, desidratando Bassi, sutilmente. A dúvida é: quem poderia ser o “ungido”?

A aposta óbvia seria Marco Garcia (PP), vereador experiente, indiferente a pressões e que estaria disposto a encarar o desafio de mais uma vez presidir a Câmara (já o fez em outras quatro oportunidades). Mas só toparia se não tiver que partir dele mesmo a iniciativa de se lançar na disputa, até porque ele enfrenta neste instante o desgaste de denúncias feitas por um antigo assessor de ter “comprado votos” nesta eleição. Se sobrar a bola na cara do gol, Marco Garcia chuta, desde que o lance não provoque lesão permanente em Daniel Bassi, a quem já teria prometido apoio.

Há que se considerar ainda que a próxima legislatura vai enfrentar, logo de cara, alguns projetos com potencial para desgastes, o que exige um presidente da Câmara corajoso, que não titubeie, e uma base de apoio coesa, que assegure os votos necessários. Um desses projetos é a própria reforma administrativa, assunto que sempre gera chiadeira. O outro, muito mais relevante, é o edital de concessão do transporte coletivo, previso para ser lançado ainda em janeiro.

Tudo que nenhum prefeito quer é estrear o mandato com Legislativo dividido e presidente hesitante. Nos 45 dias que restam para o 1º. de janeiro, haverá incontáveis cafés frios e doces, normalmente acompanhados de pães de queijo murchos ou biscoitos envelhecidos, tristes tradições da política francana. Que ninguém descarte surpresas, outra tradição, bem mais animada, da política da Terra das Três Colinas. Tudo pode acontecer nesta disputa. Até coisa nenhuma.

Corrêa Neves Jr. é jornalista, diretor do portal GCN, da rádio Difusora de Franca e CEO da rede Sampi de Portais de Notícias.