20 de dezembro de 2024
OPINIÃO

A volta do pente fino do INSS

Especial para o GCN/Sampi Franca
| Tempo de leitura: 6 min

Se você recebe algum benefício por incapacidade (aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença) ou o BPC/LOAS (Benefício de Prestação Continuada da Lei Orgânica da Assistência Social), fique atento no novo Pente Fino que o governo anunciou.

Antes mesmo do início oficial do Pente Fino, previsto para agosto de 2024, o site do próprio INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) noticiou que até maio já cortou 37.325 benefícios e suspendeu outros 20.375, gerando uma economia de R$ 750,85 milhões para os cofres públicos.

No entanto, a “meta do governo” ainda está longe de ser alcançada. Levantamentos da equipe econômica chegaram a um cálculo de economia de pelo menos R$ 25,9 bilhões para 2025 somente com a revisão de benefícios como auxílio-doença, aposentadorias por invalidez e BPC/LOAS. A desculpa utilizada é que muitos desses benefícios são provenientes de fraude ou são indevidos. Contudo, não parece lógico que uma cifra desse porte seja exclusivamente de benefícios pagos erroneamente ou ilícitos.

Em outras palavras, há muita gente correndo risco de perder seu benefício ou de tê-lo suspenso.

De outra sorte, há alguns beneficiários que estão livre desse transtorno.

Para quem não sabe, o pente fino é a convocação que o INSS faz de beneficiários, sempre que suspeita de algum indício de irregularidade no recebimento, dando a oportunidade do cidadão se defender.

Todavia, boa parte da população não sabe como será a convocação, o que fazer para se preparar e, caso seja convocado, como fazer a defesa e quais as consequências se o benefício for cessado.

Veja, a seguir, a resposta para essas e outras dúvidas.

Como será a convocação e como se preparar?

De acordo com a lei, o INSS poderá efetuar a convocação da seguinte forma:

a) preferencialmente, por rede bancária ou por meio eletrônico;

b) por via postal, mediante carta registrada com Aviso de Recebimento - AR;

c) pessoalmente, quando entregue ao interessado em mãos; ou

d) por edital, nos casos de retorno do AR da carta registrada quando o beneficiário ou interessado não for localizado.

Observa-se que a primeira maneira que o INSS irá tentar convocar será pelo banco ou pelos meios eletrônicos (como SMS, e-mail etc.). Assim, fique atento aos extratos e tela de recebimento de benefício para não perder a convocação. Confira, periodicamente, seu e-mail e o seu celular. Se você mudou de endereço eletrônico ou de número de celular, atualize pelo portal “Meu INSS” ou pelo PrevFone (discando 135).

O mesmo raciocínio vale para o endereço. Se você mudou de casa, atualize seus dados. Se a carta voltar, o INSS poderá fazer a convocação via edital.

Caso o interessado compareça pessoalmente em alguma agência do INSS para verificar algo, por exemplo, e ele estiver na lista do pente fino, ele poderá receber diretamente em mãos do servidor que o atender.

Se o beneficiário não atualizar seus dados e o INSS mandar a convocação para o endereço antigo, possivelmente ele não apresentará a defesa. O INSS vai interpretar que o interessado não quis se defender e entendeu que realmente o benefício é indevido. Na sequência, providenciaria a interrupção do benefício e eventual cobrança de valores pagos.

Quem está livre da convocação?

Nem todo mundo precisará passar pelo pente fino.

A Lei garante que quem está aposentado e tem HIV/AIDS, não precisa passar pelo pente-fino, independentemente da idade.

Quem está aposentado por invalidez e tem mais de 55 anos de idade e recebe benefícios por incapacidade há mais de 15 anos, também não pode ser convocado.

Por fim, os aposentados por invalidez que já tem mais de 60 anos estão igualmente dispensados da convocação do INSS.

Todavia, caso algum deles seja convocado pelo INSS, cabe medidas judiciais (como Mandado de Segurança, por exemplo) para evitar se submeter ao pente fino.

Como se preparar e se defender?

Se você for convocado, não se desespere. É importante apresentar a defesa em tempo hábil. Para isso, pegue laudos, exames, receitas, prontuários... Enfim, tudo o que for necessário para comprovar que não houve recuperação de sua saúde. Não esqueça que a documentação deve ser atual.

Nos casos de BPC/LOAS, além da documentação médica, é preciso manter o cadastro atualizado junto ao Cras (Centro de Referência e Assistência Social), que deve ser feito a cada 2 anos.  Também, demonstrar que a renda familiar é baixa ou insuficiente.

Nesses casos, embora seja possível fazer a defesa sozinho, é importante contar com a ajuda de um advogado especialista em Direito Previdenciário da sua confiança, que poderá agilizar e tentar fazer com que não pare de receber o benefício enquanto aguarda o desfecho.

Porém, se a defesa for julgada improcedente, é possível recorrer administrativamente ou ingressar com ação na Justiça contra o INSS.

O que pode acontecer com quem não se defender ou tiver a defesa rejeitada?

Se não for apresentada defesa ou se esta for considerada insuficiente, além da cessação ou suspensão da aposentadoria, caso o INSS entenda como indevido o benefício, poderá entrar com processo de cobrando o valor “indevido” de todo ou parte do período recebido.

Há casos mais graves, onde a Previdência Social encaminha para o Ministério Público para a apuração de fraude/crime contra o INSS, já que foi considerado “indevido”.

O que fazer se o corte for “devido”?

Se o beneficiário, de fato, se recuperou e não há mais motivos para a continuidade do respectivo benefício, pode ser que ele consiga outro benefício.

Todo o período em que esteve “afastado” recebendo seu benefício pode ser computado, desde que ele esteja intercalado entre contribuições, ou que seja decorrente de doença do trabalho ou acidente de trabalho. Assim, poderá se aposentar por outra modalidade de aposentadoria (como aposentadoria por idade, por tempo, pela regra de transição), desde que implementados os referidos requisitos.

No caso de aposentadoria por invalidez, vale mencionar que há situações em que o segurado ainda permanece recebendo o benefício por 18 meses, de maneira escalonada até cessar.

Nos casos de acidente de qualquer natureza, ou de acidente de trabalho ou de doença do trabalho, é possível converter em auxílio-acidente, onde o segurado receberá uma espécie de indenização do INSS, podendo trabalhar e receber da Previdência Social ao mesmo tempo. Essa indenização vai durar até a véspera da aposentadoria e somará com o valor de sua remuneração no momento de se aposentar.

De qualquer maneira, é importante ter em mente que nem sempre o INSS observa tais direitos. Quando isso acontece, é possível ingressar na Justiça corrigir essas distorções.

Conclusão

O governo quer cortar gastos com o INSS a qualquer custo. Em que pese a existência de fraudes, não é crível que quase R$ 26 bilhões (meta perseguida pelo governo para a cessação de benefícios) sejam, de fato, indevidos.

Certamente, “muitos inocentes pagarão pelos pecadores” se o governo alcançar esses números.

De qualquer maneira, é imprescindível que quem recebe benefícios por incapacidade (auxílio-doença e aposentadoria por invalidez) ou BPC/LOAS, mantenham seus dados atualizados e fiquem atentos para eventuais convocações do pente fino.

Caso isso aconteça, precisam apresentar suas respectivas defesas em tempo hábil. Se o benefício for cessado ou suspenso, ingressar com a respectiva medida (recurso administrativo ou ação na Justiça).

Porém, se realmente houve recuperação da saúde do trabalhador, observar outros direitos que ele poderá ter (como a concessão de outra modalidade de aposentadoria, transformação em auxílio-acidente etc.).

Obviamente, que em caso de dúvida e sempre que possível, buscar ajuda com um advogado especializado em Direito Previdenciário de sua confiança.

Tiago Faggioni Bachur é advogado e professor especialista em direito previdenciário