20 de dezembro de 2024
OPINIÃO

O legado de Zagallo e os benefícios do INSS para os futebolistas

Por Tiago Faggioni Bachur | Especial para o GCN/Sampi Franca
| Tempo de leitura: 9 min

O que há de comum entre Zagallo, o Dia do Treinador de Futebol e os benefícios do INSS? Afinal, quais são os benefícios que o jogador de futebol (tanto o profissional, como o amador) podem ter?

No dia 14 de janeiro, comemora-se o Dia do Treinador de Futebol, data esta que homenageia os profissionais que lideram, orientam e inspiram os jogadores dentro e fora dos campos. Neste ano, a data tem um sabor amargo, pois coincide com o mês em que o país perde um dos maiores treinadores da história do futebol brasileiro e mundial: Mário Jorge Lobo Zagallo, que completaria 93 anos este ano.

Zagallo, que faleceu no dia 5 de janeiro de 2024, foi um ícone do esporte, tendo participado de quatro títulos mundiais pela seleção brasileira: dois como jogador (1958 e 1962), um como técnico (1970) e um como coordenador técnico (1994). Além disso, foi vice-campeão em 1998 e quarto colocado em 1974, também como técnico, e coordenador em 2006. Foi o único a estar presente em cinco finais de Copa do Mundo, em sete participações.

Zagallo foi um exemplo de dedicação, superação e paixão pelo futebol. Apesar de ter enfrentado muitas dificuldades, preconceitos e críticas ao longo de sua carreira, nunca desistiu de seus sonhos e objetivos. Foi um pioneiro, um inovador, um estrategista, um motivador. Foi um mestre, um professor, um líder. Foi um vencedor, um campeão, um ídolo. Foi, acima de tudo, um ser humano, com suas virtudes e defeitos, suas alegrias e tristezas, suas glórias e decepções.

Zagallo deixou um legado inestimável para o futebol brasileiro e mundial, que deve ser reconhecido, respeitado e valorizado por todos que amam esse esporte. Mas, além de sua contribuição esportiva, Zagallo também deixou uma lição de vida, que pode servir de inspiração para todos os futebolistas, profissionais ou amadores, que enfrentam desafios e obstáculos em sua trajetória.

Todos que praticam algum esporte precisam se preocupar com a sua proteção social, buscando garantir os seus direitos e benefícios previdenciários. De um modo geral, sabe-se que a carreira de jogador de futebol é curta, incerta e arriscada, e que é preciso se planejar para o futuro, pensando na aposentadoria e na eventualidade de algum imprevisto que possa afetar a sua capacidade de trabalho.

Infelizmente, alguns Clubes de Futebol deixam de efetuar o recolhimento das contribuições previdenciárias de sua equipe esportiva. Isso porém não significa que o futebolista não possa computar esse tempo. Muito pelo contrário. Se ele comprovar que era treinador, preparador técnico, jogador... Enfim, que atuou naquele determinado Clube, pode utilizar aquele tempo na hora de se aposentar ou requerer qualquer benefício do INSS. Isso porque, a responsabilidade tributária, ou seja, a obrigação de efetuar os recolhimentos para a Previdência Social, em regra, não é do esportista e sim clube. Portanto, se no cadastro nacional de informações sociais (CNIS) não aparecer o período que o jogador estava vinculado a algum clube de futebol, basta comprovar (pode ser por jornal, documentos, prêmios etc.) para ter esse tempo contado na hora de requerer algum benefício previdenciário. Se for negado, é possível ingressar com ação na Justiça.

De qualquer maneira, o jogador é segurado do INSS, o Instituto Nacional do Seguro Social, que é o órgão responsável por administrar os benefícios previdenciários dos trabalhadores brasileiros. Em outras palavras, o INSS oferece uma série de benefícios para os futebolistas, que podem ser divididos em duas categorias: os benefícios por incapacidade e os benefícios programáveis.

Os benefícios por incapacidade são aqueles que visam substituir a renda do trabalhador que fica temporária ou permanentemente impossibilitado de exercer a sua atividade por causa de algum acidente ou doença, seja ela relacionada ou não ao futebol. Entre esses benefícios, estão o auxílio-doença, o auxílio-acidente e a aposentadoria por invalidez.

O auxílio-doença (que após a Reforma Previdenciária passou a ser chamado de benefício por incapacidade temporária) é um benefício mensal que é pago ao trabalhador que fica afastado do trabalho por mais de 15 dias, por causa de uma doença ou acidente que reduza a sua capacidade de trabalho. Assim, se o jogador de futebol cai e se machuca, ou tem uma lesão muscular, por exemplo, pode ficar “afastado” e recebendo esse benefício, que será pago até que ele se recupere ou se aposente por invalidez.

Já a aposentadoria por invalidez (que passou a ser conhecida como benefício por incapacidade permanente) é um benefício mensal pago ao trabalhador que fica permanentemente incapaz de exercer qualquer atividade laboral, por causa de uma doença ou acidente. É possível ter um acréscimo de 25% se o trabalhador necessitar de assistência permanente de outra pessoa. O benefício é pago até que o trabalhador se recupere ou morra.

É importante abrir um parêntese aqui. Não são só os futebolistas profissionais que têm direito a esses benefícios. Se qualquer pessoa vai jogar futebol com os amigos no fim de semana, por lazer, por exemplo, e se machuca, caso seja segurado do INSS (mesmo que exerça outra profissão), terá direito ao respectivo benefício por incapacidade.

O mesmo raciocínio é válido para o auxílio-acidente, que é um benefício mensal pago ao trabalhador que sofre um acidente de trabalho ou de qualquer natureza que resulte em uma sequela permanente que reduza a sua capacidade de trabalho. O benefício é pago até que o trabalhador se aposente por qualquer motivo. Se o jogador de futebol profissional tem um rompimento de tendão durante o treino, por exemplo, em razão da sequela deixada, poderá ter direito ao auxílio-acidente, logo após o auxílio-doença. O auxílio-acidente complementará a renda, ou seja, neste exemplo, o futebolista pode trabalhar e receber ao mesmo tempo do INSS. E quando chegar a hora de se aposentar, o auxílio-acidente entrará no cálculo. Caso ele tenha um salário de R$ 3 mil e receba R$ 2 mil de auxílio-acidente, para fins de aposentadoria o salário de contribuição, neste exemplo, será R$ 5 mil.

Os benefícios programáveis são aqueles que visam garantir uma renda ao trabalhador que atinge uma determinada idade ou tempo de contribuição, independentemente da sua capacidade de trabalho. Entre esses benefícios, estão a aposentadoria por idade, a aposentadoria por tempo de contribuição, a aposentadoria especial e a aposentadoria da pessoa que possua alguma “barreira”.

A aposentadoria por idade é um benefício mensal que é pago ao trabalhador que atinge 65 anos de idade, se homem, ou 62 anos de idade, se mulher, desde que tenha pelo menos 15 anos de contribuição para o INSS. O benefício é pago até que o trabalhador morra.

A aposentadoria por tempo de contribuição é um benefício mensal que é pago ao trabalhador que atinge 35 anos de contribuição, se homem, ou 30 anos de contribuição, se mulher, independentemente da idade. Com a Reforma da Previdência de 2019, a aposentadoria por tempo deixou de existir, exceto nos casos em que o segurado já tenha cumprido todos os requisitos antes de 13.11.2019 (direito adquirido) ou siga alguma das regras de transição, que vão lhe exigir algo a mais (seja uma determinada idade, seja uma quantidade de pontos, seja um pedágio trabalhando um pouco mais etc.).

Há, ainda, a aposentadoria da pessoa que possui alguma “barreira”, que não é uma incapacidade e sim um obstáculo ou sequela, de acordo com uma Lei que veio em 2013. Nesse caso, um jogador de futebol que sente dores ou que colocou alguma placa ou pino, por exemplo, são fortes candidatos a essa modalidade de aposentadoria. Vale tanto para a aposentadoria por idade como para a aposentadoria por tempo de contribuição, que não entraram na Reforma Previdenciária de 2019. Aqui, haverá uma redução na idade ou no tempo para se aposentar. A pessoa que possui alguma “barreira” precisará de 60 anos (homens) ou 55 anos (mulheres) e 15 anos de contribuição (além da existência de barreira por, pelo menos, 15 anos). Já a aposentadoria por tempo da pessoa que possui barreira, pode, em alguns casos, reduzir em até 10 anos o tempo de contribuição para aposentar. O benefício é pago até que o trabalhador morra.

O trabalhador pode ser considerado pessoa com a existência de “barreiras” mesmo que a sua limitação não seja visível ou aparente, como é o caso de muitos futebolistas que ficam com sequelas de lesões, dores, câimbras, problemas musculares, articulares, ósseos, nervosos, circulatórios, respiratórios, digestivos, endócrinos, imunológicos, depressão, ansiedade, síndrome do pânico entre outros. O importante é que tal lesão cause alguma barreira para o exercício da atividade profissional ou do dia a dia, mas não o impeça.

Esses são alguns dos principais benefícios previdenciários que os futebolistas podem ter direito, mas existem outros, como o salário-família, o salário-maternidade, a pensão por morte e o auxílio-reclusão. Para ter acesso a esses benefícios, é preciso estar inscrito no INSS, pagar as contribuições mensais e cumprir os requisitos de cada benefício. Além disso, é preciso fazer o requerimento do benefício pelo site ou aplicativo do Meu INSS, ou pelo telefone 135, e apresentar os documentos necessários para comprovar o direito ao benefício.

O INSS é um sistema que visa garantir a segurança e a dignidade dos trabalhadores que contribuem para ele, especialmente nos momentos de dificuldade, como a doença, o acidente, a velhice ou a morte. Por isso, é fundamental que os futebolistas, que dedicam suas vidas ao esporte mais popular do país, sejam conscientes da importância de se protegerem socialmente, valorizando o seu trabalho e o seu futuro.

Zagallo foi um treinador que marcou a história do futebol brasileiro e mundial. Ele deixou um legado de vitórias, mas também de responsabilidade e cidadania. Ele foi um exemplo de que o futebol não é apenas uma arte, mas também é um trabalho. E, como tal, merece respeito e reconhecimento.

No Dia do Treinador de Futebol, que coincide com o mês em que perdemos Zagallo, vamos homenagear esse grande mestre do futebol e refletir sobre a situação dos futebolistas, que muitas vezes são esquecidos ou explorados pelo sistema que deveria protegê-los. Vamos lembrar que o futebol não é só uma paixão, mas também é um direito. E que os futebolistas, assim como todos os trabalhadores, merecem ter acesso aos benefícios previdenciários que lhes garantam uma vida digna e justa.

E, se você é um futebolista, profissional ou amador, e tem alguma dúvida sobre os seus direitos ou benefícios previdenciários, procure um advogado especialista em Direito Previdenciário de sua confiança. Ele poderá orientá-lo e auxiliá-lo na obtenção do benefício que você merece. Não deixe de buscar a sua proteção social, pois ela é essencial para a sua segurança e a de sua família.

Tiago Faggioni Bachur é advogado e professor de direito. Especialista em direito previdenciário