27 de dezembro de 2024
RELIGIÃO

Deus escolhe os pobres

Por Monsenhor José Geraldo Segantin | Especial para o GCN
| Tempo de leitura: 4 min

Primeira Leitura. Sofonias 2.
Houve um tempo em que Deus parecia aliado dos ricos: o bem-estar, a riqueza, a abundância dos bens, a numerosa posteridade eram considerados sinais da sua bênção.

Lentamente, porém, a mentalidade muda. Principalmente após a pregação dos profetas começa-se a entender que a riqueza, mais do que uma bênção de Deus, frequentemente é fruto de enganos, de trapaças, de exploração dos operários, de opressões, de manobras escusas, de injustiças.

Sofonias vive alguns anos antes da destruição de Jerusalém, portanto, num período de caos social e político. Afirma que o castigo de Deus é iminente.

Não há, segundo ele, senão uma única possibilidade de salvação: a imediata “conversão ao Senhor”.

Converter-se, portanto, queria dizer: ser como os humildes, como os “pobres”.

Pela primeira vez na Bíblia a palavra “pobre” é empregada com uma conotação nova: já não indica somente uma condição social e econômica, mas uma postura religiosa interior. Segundo Sofonias “pobre” é aquele que, não tendo segurança alguma, confia inteiramente em Deus e se submete à sua vontade.

No dia do castigo, diz o profeta, Deus deixará sobreviver na nação um povo humilde (pobre) e sem recursos, um resto de Israel, que buscará refúgio no nome de Javé.

Segunda Leitura: 1Corintios 1.
Continua a carta aos cristãos de Corinto que começamos a ler dois domingos atrás. Vimos quais eram os problemas desta comunidade: discórdias, divisões, invejas, ciúmes. Como fora possível, para uma comunidade tão fervorosa, cair tanto?

Responde Paulo: Isto aconteceu porque os cristãos deixaram entrar o espírito devastador da competição; cada qual procura dominar os outros, ser superior, tornar-se pessoa importante, ficar rico.

A leitura nos revela quais são as suas preferências: ele não escolhe os ricos, mas os pobres, os marginalizados, aqueles considerados sem valor por todos. Por exemplo, continua Paulo, na comunidade de Corinto não há pobres, não há ricos, chefes políticos, homens de elevada cultura e de muita erudição. Pelo contrário, todos são pobres, às vezes até miseráveis. Sim, porque este é o procedimento de Deus: ele escolhe os pequenos, os que não valem nada, para enriquecê-los com seus dons.

Evangelho: Mateus 5.
Os capítulos 5 e 7 do Evangelho de Mateus contêm um discurso muito longo de Jesus. Nele são apresentadas as exigências fundamentais da sua mensagem. Os biblistas o denominam como o “Sermão da Montanha”.

O “Sermão da Montanha”, dirigido aos cristãos de os lugares e de todos os tempos, abre-se com as famosas “bem-aventuranças”, para cada uma das quais daremos uma breve explicação.

Bem-aventurados os pobres em espírito.

Os pobres em espírito estão convencidos que a felicidade do homem não consiste em locupletar-se de coisas: bens materiais, privilégios, cultura, diplomas, reconhecimento público, mas ela se encontra no amor ao ser humano, na doação gratuita de si.

Bem-aventurados os que sofrem.

Quando Jesus proclama bem-aventurados os “aflitos” usa uma palavra muito conhecida para quem conhece a Bíblia. No livro de Isaías se fala dos aflitos: são aqueles que não têm uma casa onde morar, que não tem terras para cultivar, porque a herança dos seus pais foi ocupada por estranhos, que devem se colocar a serviço de proprietários de terras sem escrúpulos, que devem aguentar injustiças, falsidades, afrontas, humilhações.

Bem-aventurados os mansos.

O termo “manso” usado por Jesus foi tomado ao Antigo Testamento e, mais exatamente, do Salmo 37. Nele os mansos são apresentados como aqueles que foram privados dos seus direitos, da sua liberdade, dos seus bens.

Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça.

A fome e a sede são os impulsos mais fortes que o homem experimenta.

Estas pessoas, diz Jesus, devem considerar-se bem-aventuradas porque, com a vinda do Reino, o seu desejo será saciado. Eles assistirão ao nascimento de um mundo novo.

Bem-aventurados os que fazem obras de misericórdia.

São bem-aventurados porque, no mundo novo, na vinda do Reino, também eles, quando precisarem de ajuda, encontrarão quem lhes estenda a mão.

Bem-aventurados os puros de coração.

Os puros de coração, são bem-aventurados porque desfrutarão de uma profunda experiência de Deus.

Bem-aventurados os que se comprometem com a paz.

Jesus diz que Deus considera seus filhos aqueles que se esforçam, com todas as suas forças, para construir um mundo no qual exista para todos esta paz.

Bem-aventurados os perseguidos por causa da justiça.

Há sofrimentos, provocações, males que se abatem sobre nós de repente, sem que tenham sido provocados. Mas há outros que necessariamente acompanham algumas decisões.

Jesus até sugeriu o comportamento a ser seguido nos momentos de perseguição: “Ora, eu vos digo, amai os vossos inimigos e orai pelos vossos perseguidores”. Abençoai aqueles que vos perseguem, exortará por sua vez Paulo.

A única força capaz de romper a espiral da violência, de fato, é a do amor e do perdão.

Monsenhor José Geraldo Segantin é reitor do Santuário Diocesano de Santo Antônio.