24 de dezembro de 2024

Nova lei de licitações

Por Toninho Menezes | Especial para o GCN
| Tempo de leitura: 4 min

A nova lei de licitações – Lei nº 14.133/2021, publicada no dia 1º de abril, para nós administrativistas, analistas e atuantes na área do direito público, merece comentários. Obviamente o presente artigo, contudo, não tem a pretensão de trazer todas as alterações introduzidas pela Nova Legislação, o que demandaria extensão demasiada, o que estamos realizando em obra a ser publicada, queremos aqui tratar da polêmica que sempre existiu na administração pública, a adoção do modelo burocrático ou gerencial para a questão das licitações públicas.

Quando em junho de 1993 entrou em vigor a Lei nº 8666, a Lei de Licitações e Contratações da Administração Pública queiram ou não foi um avanço, pois até então a normatização de tal matéria era problemática. Porém a Lei 8666 introduziu um modelo extremamente burocrático, partindo da premissa de desconfiança sobre todos, sejam licitantes que queiram ser contratados pela Administração Pública, sejam os agentes públicos e servidores que trabalham na Administração Pública encarregados de conduzirem o processo licitatório. Partindo de premissa generalizada de que todos os envolvidos no processo eram desonestos. Assim, a Lei 8666, burocratizou todo processo licitatório tentando evitar a corrupção, e que “espertalhões” burlassem a isonomia e a lisura do certame licitatório.

O modelo burocrático da Lei 8666, estabeleceu uma série de regras abstratas, determinando que o cumprimento delas devesse se dar a partir de uma estrutura hierárquica rígida, de modo que os servidores que trabalhassem com as licitações, apenas executassem as regras da Lei sem possuírem o mínimo grau de “liberdade”, ou discricionariedade possível.

Em síntese, os membros da Comissão de Licitações não deveriam se preocupar com o resultado, mas com a execução literal do procedimento legalmente previsto, retirando dos agentes públicos a prerrogativa de terem a iniciativa de atuarem de forma a adotar soluções práticas diante do caso concreto. Obviamente as críticas à Lei 8666 desde 1993 são constantes.

Agora a Nova Lei de Licitações (Lei nº 14.133/2021) Propõe a substituição do modelo de administração burocrática por um modelo misto, inserindo o modelo de “administração Gerencial”, onde se fixa a finalidade a ser alcançada e deixa-se o executor, em tese, “livre” para agir como um verdadeiro gerente. Com todo nosso respeito, o modelo gerencial serve muito bem em países de primeiro mundo e na iniciativa privada, porém na administração pública é um desastre, pois barrar os desmandos, que já é muito difícil, mesmo com a imposição de certa burocracia, com a adoção de mecanismos de “flexibilização” se torna quase impossível prever o que ocorrerá. O pior é que, com as novas regras, dificilmente se conseguirá provar a má-fé, pois os dispositivos serão legais, não se comprovando que foram manipulados para favorecimentos ou desvios.

Essa é a grande questão: Qual a premissa que o legislador deve adotar? A da confiança do modelo gerencial, ou da desconfiança, do modelo burocrático?

Como sempre dissemos aos nossos alunos, Direito não é só filosofia, é uma disciplina de ética e conduta. Queiram ou não, a nossa cultura, desde os primórdios foi forjada pelo patrimonialismo, pelo clientelismo etc. A propósito o

chamado “jeitinho brasileiro” é nossa marca mundial. A corrupção, apesar do combate persistente ainda impera em nosso país, basta citarmos os recentes desvios ocorridos com o dinheiro que era para combater a pandemia. Reafirmando o dito popular: “a ocasião faz o ladrão”, como procederá, diante da nova lei, servidor responsável pela licitação, que ganha uns três mil reais por mês e poderá negociar diretamente contratos que giram na casa dos milhões? Será que poderá se sucumbir diante de algumas propostas?

Apenas como exemplo ilustrativo da Nova Lei de Licitações, que deixa licitar e contratar sem a existência de projeto básico, detalhando os pormenores do que se quer contratar, para posteriormente se adequar, funciona em países de cultura séria, o que não é o nosso caso. Para nós, que sem falta modéstia, conhecemos a fundo o sistema administrativo brasileiro, tanto que em 1999 trouxemos em nossa dissertação de mestrado a inversão das fases nos procedimentos licitatórios, que trouxe por conseqüência a modalidade de licitação chamada pregão, à Nova Lei de licitações, ao adotar o modelo gerencial, que é por demais flexível, principalmente pela nossa questão cultural, onde o certo “é levar vantagem em tudo”, é com certeza problemático e trará muitos situações delicadas. Acreditamos que os nossos congressistas e o senhor presidente deveriam ter analisado com maior profundidade a questão, pois para nós demora na licitação é falta de planejamento e não culpa da legislação.

Enfim, como sempre afirmamos, “o tempo é o senhor da razão”, vamos aguardar. Com todo nosso respeito, de nada adianta querer adotar em nosso país, sistema que dão certo em outros lugares, nossos legisladores, ao invés de se portarem como verdadeiros “dublês” deveriam avaliar com maior cautela e amplitude as conseqüências do objeto que estão disciplinando.