Chegou cedinho a notícia do falecimento do marido. Do marido, quase rei, da rainha Elizabeth II. Não causou surpresa, como teria causado fosse ele bem mais jovem, por exemplo. Morrer aos 99, embora “gozando de boa saúde”, deve ser, de certa forma, muito bom. E o fato mostra que como foi bem tratado, bem alimentado, vestido. Como viveu até que bem, naquela gaiola dourada. Nada comportado, como se sabe: não são poucas as notícias de seus desvios, mulherios, encontros furtivos nas reuniões dos clubes masculinos em Londres. E o The Crown, embora fantasioso em algumas cenas, não deixa dúvidas: ele era rebelde, sonhava em ser rei, engolia seco toda vez que tinha que se curvar à Rainha, que ele provavelmente penalizava, depois da reverência.
Quebrou a rotina maçante dos palácios que habitou. Quebrou o protocolo inúmeras vezes, mas não foi além de certos limites, tanto assim que a rainha nunca se referiu a ele de forma pejorativa ou agressiva. Pelo menos não publicamente. Lá nos confins dos corredores, na intimidade dos aposentos, quem poderá garantir que não discutiam, que ela não perdia a têmpera, não esbravejava ou levantava a voz? Motivos ele dava de sobra. A imprensa daquela época era contida, mas as revistas Manchete, O Cruzeiro, Senhor, Realidade, contavam, sutilmente, o que acontecia atrás das muralhas reais. E os tabloides londrinos não o poupavam. Muitas vezes extrapolavam os limites, como ainda acontece hoje, na imprensa mundial, com os membros da realeza.
Particularmente, eu era fã do cidadão. Muito mais da rainha, claro, mas o admirava porque embora algumas vezes pisasse na bola, teve têmpera para ficar ao lado da “mulher mais poderosa do mundo” por tantos anos seguidos. Vaidoso, atrevido, causador, soberbo, foi um péssimo pai – pelo menos para o primogênito. Mas fico imaginando o que passava na cabeça do macho nascido em 1921, quando o perfil ideal das mulheres era de fraqueza, submissão, dedicação ao lar e à família e a mulher dele era o oposto disso? Mais: como súdito, era apenas príncipe, enquanto ela era a rainha? Que não pode dar seu nome ao próprio filho por ter renunciado à sua cidadania e adotado outro sobrenome – era grego de nascimento – para se casar com aquela mulher? E ainda era obrigado, pelo protocolo, a mostrar submissão? Não lhe era fácil, reconheço.
Hoje as bandeiras inglesas – nos palácios, nos edifícios governamentais como a Torre da Vitória atrás do Big Ben e até nas residências estão a meio mastro.
Há flores sendo depositadas nos portões de Buckingham, em sinal de respeito ao homem que faria 100 anos em junho próximo; ao marido da soberana inglesa por 73 anos; ao pai de Phillip, Anne, Andrew e Edward; ao avô de oito netos e cinco bisnetos. Serão lembrados os anos na ativa nas quais o soldado nascido na Grécia, mas naturalizado inglês, mostrou bravura na sua vida militar.
Meu carinho e respeito pela perda da família real. Fica a dúvida: Meghan Markle e Henry serão convidados e comparecerão às cerimônias fúnebres?