17 de novembro de 2024

12 de Outubro

Por Lúcia Brigagão | Especial para o GCN
| Tempo de leitura: 3 min

Brasileira, nasci e cresci ouvindo referências, folclore, histórias verossímeis e inverossímeis sobre N. Sra. da Conceição Aparecida, reconhecendo nela a Padroeira do Brasil, embora nunca tenha sido católica.  Tanto respeitei a ideia, que fiz jus à herança da pequena imagem emoldurada da santa que pertencia à minha mãe, datada de 1930, quando a Igreja Católica, por decreto de Pio XI reconheceu e a colocou entre a legião de santos da Igreja. Mesmo distante no tempo, ainda me lembro da estupefação e surpresa que me causaram histórias que envolvem o momento da descoberta de sua imagem pelos pescadores há mais de 300 anos. E acompanhei as notícias do 12 de outubro de 1980, quando foi decretado que esse dia se tornaria Feriado Nacional, em sua homenagem. Minha relação com a Santa, ou com sua imagem, ou com o que ela representa, vai longe no tempo.  Visitei a antiga igreja que leva seu nome na Aparecida do Norte, cenário de  foto antológica  com meus filhos tirada por fotógrafo e máquina fotográfica “lambe-lambe”. Posteriormente entrei algumas vezes na monumental Basílica de Aparecida e em todas as vezes fiquei engasgada, emocionada e estupefata com as manifestações de fé que presenciei naquelas visitas.

Há doces histórias do meu cotidiano ligadas à Santa, as mais importantes delas,  através da Toninha, minha ajudante em casa por muitos anos. Toninha foi mãe de leite de um filho meu, o que nos torna irmãs e me faz reverenciar sua lembrança toda vez que penso nela. Tínhamos mais em comum: éramos corintianas. Ano após ano, todos os 12 de outubro que trabalhava em casa,  ela pedia folga, tomava ônibus fretado, abarrotado, e ia em excursão para a Aparecida do Norte. Deixava tudo para trás, iria prestar pessoalmente sua homenagem à Santa, tamanha sua fé.  Certa vez, ela pediu para sair mais cedo, que iria preparar sua casa para assistir à final de campeonato que seria disputado entre Corinthians e São Paulo. Nós vamos ganhar, afirmou. Perguntei o motivo da certeza e ela respondeu que tinha feito trato com a Santa: “A gente ganha e eu vou em pé, no ônibus,  sem sentar nenhuma vez, até chegar nela, me ajoelhar e agradecer o troféu.” Nós ganhamos, ela pagou a promessa. Quando voltou, perguntei o grau de dificuldade enfrentado, ela disse que no ônibus, ao demonstrar algum cansaço, lá pela madrugada que a viagem demorava mais de dez horas, a maior parte trajeto noturno - todos batiam palmas, cantavam, ela se distraía, driblava o cansaço das pernas e vencia mais alguns  compridos quilômetros. Outra lembrança: antes de determinado jogo importante para a classificação, fez promessa de dar mil beijos na imagem da Santa, que ela tinha no pequeno altar da sala de visitas de sua casa. Ganhamos. Chegou com a boca inchada, no dia seguinte para trabalhar. Pagou a promessa? “Claro! respondeu. Eu beijava, minha mãe contava.” E a mãe, coitada,  nem corintiana era...

Doze de Outubro não é feriado de Dia da Criança. É feriado porque é dia de Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil. Talvez folclore, quiçá verdade,  a imagem, protegida de vandalismo e conservada na Basílica, foi descoberta por pescadores em outubro de 1717 encarregados de conseguir peixes para festa em Vila Santo Antônio de Guaratinguetá, em homenagem ao governador da capitania hereditária de São Paulo. Não era época de peixes. Várias tentativas frustradas, puxaram na rede o corpo de uma imagem; na outra tentativa, veio a cabeça, que se encaixou perfeitamente no corpo anteriormente encontrado. Em seguida os peixes apareceram em quantidade tão grande que quase fez o barco virar, segundo os pescadores. Este foi o primeiro de seus milagres,  mas as curas atribuídas à Santa, a confiança no seu amparo, a certeza de seu acompanhamento nos momentos difíceis e a devoção dos fiéis ocupam espaços extraordinários da literatura religiosa, dos relatos de fé no cotidiano e são milhares, milhões deles. Que Nossa Senhora da Conceição Aparecida proteja e ampare principalmente as nossas crianças que estão por aí abrigadas ou não, sob a guarda da família ou abandonadas por elas, nas escolas, nas creches, nas ruas. E em nossas casas.