Era sonho antigo. Para não ser ingrata e afirmar que não foi realizado, direi que o foi parcialmente. Recentemente fui conhecer a Patagônia. Voltei impressionada, embora não tenha sido a viagem dos sonhos, tal qual idealizara. É longe. Bem longe. Parte do sonho, seria fazer o percurso na garupa de moto, pilotada por Gael Garcia, ou por Ricardo Darín, até por Javier Bardem, que não sou nada boba... Enfrentar chuva, vento, neve, poeira. Começou aí a derrocada das idealizações. Não que as companhias deixassem a desejar, pelo contrário. E idealizações só servem para isso mesmo: frustrar a gente e impedir que aproveitemos o que podemos aproveitar. A viagem de ida foi perfeita. Descemos em Santiago, pegamos novo vôo e chegamos ao destino, depois de mais algumas horas de viagem inesquecível por terra. Imensa planície, rodeada de lagos, montanhas, algumas com neve no topo, outras não. E o hotel onde ficaríamos alguns dias, escultura que se confundia na paisagem. No mapa, fica em Torres del Paine. Na minha idealização, a poucos passos da entrada, já no céu.
Construção grandiosa, toda em madeira, pedras e vidro. Banho de arquitetura e amor à natureza. Iluminação baixa, silêncio interno quase absoluto para servir de fundo ao absoluto silêncio da natureza, fora do hotel. Para a gente se sentir mais rainha, piscina de água quente interna, ofurô externo, protegido por barreiras de vidro. Depois de um dia intenso de extenuantes exercícios físicos travestidos por caminhadas, sobe e desce de vãs, sobe e desce de barcos, poeira no rosto, vento frio de todos os lados, são como bênçãos para recuperarmos força e disposição.
A volta, antecipada por causa do coronavirus, seria por Buenos Aires. Antecipação do retorno, mais contratempos com os vôos de conexão, chegamos à capital portenha em ritmo de tango dos mais trágicos: “sola, fané, descangayada”, sem reserva de hotel; vôos disponíveis para o Brasil lotados, chuva fina e ininterrupta; povo do mundo inteiro desesperado sem saber o que fazer, barracas de camping armadas nos corredores do aeroporto e os argentinos, naquela delicadeza toda: “O hotel está vazio, fecha suas atividades amanhã, não temos como recebê-los.” No final, porque eram duas da madrugada deixou-nos entrar, mas não tinham nada para comermos e não poderíamos sair do hotel em hipótese alguma. Sobrevivemos. Dia inteiro em trânsito, mais horas de viagem parte da noite, era tarde quando vimos as luzes da cidade e demos graças a Deus. Embora com saudades, em casa experimentamos fortes emoções: a de não poder nos aproximar de filhos ou de netos. A de não entender bem se os chineses são ou não responsáveis por todo esse caos. E mil perguntas. O que o futuro – a começar de amanhã cedo - nos reserva. As pessoas que vivem nas ruas, como se protegerão? Nós que temos casa, comida e não sentimos frio, quem nos protegerá de nós mesmos? E nossos amigos, todos subitamente elevados a grupos de maior ou menor risco, como reagirão? Futuro embaçado. Dá medo...