17 de novembro de 2024

Palavras


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No tempo em que a Globo era embaixatriz do Brasil e tudo que se via na telinha brasileira, principalmente telenovelas, era obrigatoriamente visto nos países lusófonos ou nos interessados nas produções globais com trabalho feito pelas retransmissoras, fui insistentemente chamada por minha filha para assistir capítulo da novela Caminho das Índias, quando estava em Londres em missão de avó. Justificativa: eu iria adorar porque nos intervalos comerciais, a transmissão passava a ser local e as propagandas, telejornais e programas de entretenimento eram de Angola, país onde se fala o português, com acento do país de Cabral, mas cheio de expressões com notadas e estranhas diferenças. Esperei, vi a Jade dançar, entraram os comerciais, todos angolanos. A pronúncia deles é bastante semelhante à portuguesa. A diferença soa estranha, quanto ao sentido das palavras. Fora algumas discrepâncias como fila, por cá, bicha por lá – que já rendeu boas piadas e jogos de palavras, e há ainda outras como grampeador, que lá é agrafador, e histórias em quadrinhos, nada mais, nada menos que banda desenhada. Existem outras, muitas outras. Fiquei fascinada. Nossa língua, além de bela, é sonora; possui exatas palavras para traduzir sentimentos e situações. A mais linda delas, sem tradução em qualquer outro idioma, é saudade. Tem coisa mais delicada?

Nós já importamos e tornamos nossas, aportuguesando-as, palavras como ballet (balé), blackout (blecaute), mozzarella (muçarela) e centenas de outras. Do francês, inglês, italiano.

E mesmo distante fisicamente de Portugal, durante os tempos da União Soviética, o enorme potencial do povo russo influenciou os idiomas do mundo. Nem o Português escapou. Entraram e não saíram do nosso vocabulário palavras como vodca – a bebida russa por excelência. Tundra, que é o bioma no qual a baixa temperatura e regiões de crescimento curtas impedem o desenvolvimento de árvores. Taiga, troica – que designa um comitê de três membros. Parênteses: nesse sentido Lewandowski, Gilmar e Toffoli, poderiam ser considerados uma troica, porque, por definição, designa aliança de três personagens do mesmo nível e poder que se reúnem num esforço único para a gestão de uma entidade ou para completar uma missão, como o triunvirato em Roma.

O Brasil já mudou de regras gramaticais quatro vezes, desde que o português passou a ser nossa língua oficial. Cinco, na verdade: quando substituiu o tupi pelo idioma dos colonizadores; em 1911; 1945; 1972 e 1990. Em contrapartida, contribuiu com outras para o enriquecimento dos idiomas dos outros países.

Não sei se foram exportadas com o devido sentido, nem se são aplicadas corretamente. Algumas delas: Laranja; Propina; Lava-jato; Acordo de Leniência, Delação Premiada, Hackeamento.