17 de novembro de 2024

29 de Dezembro


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A última, foi gravidez completamente diferente, a começar pelo susto provocado pela notícia do aumento inesperado da família. Ninguém contava com ela. Nem eu mesma. Estava mais madura, segura, experiente, o que evitou que desmaiasse, ao perceber a segurança do médico quando confirmou sua suspeita e disse na lata: você está grávida! Fui procurá-lo por causa de mal estar generalizado e perda de sangue insignificante, fora do ciclo menstrual, e foi descoberta quando entrava na décima segunda semana, o que dava aí pelos três meses de prenhez. Estavam surgindo os primeiros aparelhos de ultrassonografia, existiam apenas exames de laboratório, eu não estava na minha cidade. Ao voltar, o médico, mui amigo, depois que parou de rir, me deu os parabéns...

Iniciamos os preparativos. Primeiro o psicológico. Iríamos começar tudo outra vez. O quase ex-caçula, de oito anos, mostrava-se meio enciumado porque os irmãos o atormentavam, afirmando que ele perderia o trono, junto com cetro e coroa. Verdadeira catarse, todo o ciúme dos dois mais velhos acumulado durante anos, teve oportunidade de ser zerado. Hora de preparar enxoval, sem saber se seria menina ou menino. Comprar e estocar fraldas, que felizmente já tinham evoluído e naquela altura eram descartáveis, mas o preço era salgado e amargo. Tirar o cesto de vime do guarda-malas do guarda-roupa, relíquia que eu contava apenas usar, quando nascesse netos, lá na frente. Na descida do cesto, vieram baldinhos, brinquedos próprios da primeira idade, livros, joguinhos de encaixe. Cada peça descida, trazia com ela lembranças e histórias. No dia 24 de dezembro, barriga explodindo, encontro com amiga que me pergunta se o bebê nasceria no dia seguinte. Não, meu Menino nasceria alguns dias depois, mas seria tão especial quanto o Aniversariante do 25. Eu ainda iria comemorar a entrada do Ano Novo, estava confiante.

Comemorei na maternidade. Ele nasceu dia 29, às 18 horas e anunciou sua chegada, quando eu estava sentada no degrau da cozinha que dava para o quintal, comendo cajamangas com sal que os irmãos catavam no chão. Não nasceu fazendo caretas, como vaticinaram. Nasceu grande, nasceu forte, nasceu pra ser feliz, de tão feliz faria todo mundo. Veio para desabusar. É o único da casa que gosta de bichos. É aventureiro. Faz trilhas. Desce montanhas em cordas absurdamente finas. Já quase me matou de susto três vezes. Sobrevivi, e ele me prometeu que não cutuca mais a onça com vara curta. Não lhe dei a moto sonhada, mas a oportunidade de rodar o mundo, no lugar de voar baixinho.

Não me incomodo quando dizem que eu o protejo: ele é o protegido de todos. Ninguém sorri como ele, ninguém altera o PH do ambiente em torno, como ele. E dou de ombros quando lhe canto com toda a força dos meus pulmões: “Você é luz, é raio, estrela e luar, manhã de sol, meu Ioiô, meu Iaiá”. Ele é minha manhã de sol. E deixe que digam, que pensem, que falem...

Lúcia Helena Maníglia Brigagão
Jornalista, escritora, professora
luciahelena@comerciodafranca.com.br