Estava tudo preparado: decoração dos sonhos na igreja, festa pronta, vestido de princesa, convidados emocionados pelo momento e o noivo aguardando sua amada chegar até ao altar carregando no ventre a princesa que tanto aguardaram. De repente, o cenário mudou. O desespero tomou conta e aquele momento de grande alegria se transformou em tristeza. A história da enfermeira Jéssica Victor Guedes, de apenas 30 anos, está comovendo internautas de todo o mundo.
Grávida de 7 meses, ela morreu minutos antes de entrar na igreja em São Paulo. Ela sofreu um AVC (Acidente Vascular Cerebral) hemorrágico em decorrência de uma eclâmpsia, no último final de semana. O noivo, o tenente Gonçalves, que já foi bombeiro, prestou os primeiros socorros na mulher que deu entrada no hospital com morte cerebral. A bebê, que ganhou o nome de Sophia, nasceu de 29 semanas com apenas 1 kg e está internada na UTI Neonatal. Crianças da comunidade Peri Alto receberam em forma de doação o buffet que iria ser servido na festa de casamento.
Em entrevista a revista Crescer, o tenente deu um depoimento emocionante sobre a história do casal, a tragédia e as expectativas para o futuro junto com a filha Sophia, que permancerá internada por no mínimo dois meses. Para tentar salvar a futura esposa, Gonçalves pediu para transferi-las a um hospital que o convênio não cobre as despesas. Por conta dos gastos que não estavam previstos e com as dívidas do casório, amigos e familiares criaram uma vaquinha virtual para ajudar o tenente e a pequena Sophia. O site para ajudar é www.vaquinha.com.br/vaquinha/tenente-goncalves.
“Depois de 7 anos de namoro, Jéssica decidiu trocar o anticoncepcional, acabou suspendendo o remédio por alguns meses e engravidou. Foi inesperado, mas um momento de pura alegria, pois nosso objetivo era casar e ter filhos. Eu sabia que ela seria uma esposa maravilhosa e uma mãe mais ainda, pois era muito apegada a nossa sobrinha. Durante toda a gravidez, viajamos, curtimos a vida e éramos um casal normal e muito feliz com a proximidade da chegada da nossa pequena. Como a Jéssica é enfermeira e trabalha em banco de sangue, ela estava sempre com as vacinas em dia e a saúde também. Era muito saudável, não fumava, não bebia, fazia atividade física e se alimentava bem.
Tínhamos marcado o nosso casamento para o dia 15 de novembro mas, por conta da gravidez inesperada, acabamos antecipando para o dia 15 de setembro, porque queríamos que fosse antes de a nossa filha Sophia chegar. Estávamos bastante envolvidos com o casamento, quartinho e todos os preparativos para receber nossa pequena. Porém, na última semana antes do casamento, durante o ultrassom, a médica disse que a Sophia estava com restrição de crescimento e um exame que tinha que dar 10, estava 5 [o percentil teria que estar acima de 10]. Ela receitou algumas medicações e vitaminas e pediu para que voltássemos na sexta-feira; nosso casamento era no sábado.
No retorno à medica, ela percebeu que o exame tinha baixado mais ainda e estava 3. Todas as vezes ela media a pressão sanguínea e estava tudo bem. A médica, então, desconfiou da tireoide porque estava dando alteração no exame, e encaminhou para um endócrino, ainda na sexta-feira. Também deu a notícia de que não poderíamos ir à lua de mel porque ela queria monitorar o crescimento da bebê de perto. O estado de saúde da nossa filha e o impedimento da viagem acabaram deixando a Jéssica emocionalmente abalada. Mas entendemos que era momento de cuidar da nossa pequena e a lua de mel ficaria para depois.
O endocrinologista solicitou exames e passou também alguns medicamentos porque a tireoide estava oscilando, o que poderia estar prejudicando o crescimento da bebê. A Jéssica não apresentava nenhum sintoma de que algo não estava bem. Só no sábado, no dia do nosso casamento, ela acordou as 4 da manhã com dor de estômago e achamos melhor ir ao médico. Eles desconfiaram de que poderia ser algo na vesícula, mas ela foi medicada e liberada. Foi se arrumar com as madrinhas, feliz da vida, e estava 100%. O tempo todo eu ligava para saber como ela estava e, não contente em ouvir pela voz dela, também perguntava para as pessoas que estavam com ela. Tudo parecia ótimo. Eu passei o dia cuidando dos detalhes do salão de festa com meus amigos e me arrumei para ir à cerimônia.
Meses atrás, socorrendo uma pessoa que tinha levado um tiro no pulmão durante um assalto, acabei sabendo que o rapaz tinha uma frota de limosine. Contei a ele que me casaria e ele me fez um descontão para eu fazer uma surpresa para a Jéssica. Ela chegaria à igreja de limosine. Ainda comprei o perfume de que ela mais gostava e deixei dentro do carro. Na porta da igreja, cheguei cedo e fiz questão de cumprimentar todos os convidados, parecia algo dizendo que eu não teria oportunidade de fazer isso mais tarde.
No caminho para a igreja, avisaram aos familiares da Jéssica que ela não estava se sentindo bem. Eu só fiquei sabendo que ela havia chegado. O problema é que estava tudo pronto e nada de ela entrar. Foi então que uma prima dela saiu correndo e me disse que ela tinha desmaiado. Eu fui até o carro e a retirei, desacordada, da limosine, a coloquei no chão e comecei a fazer os primeiros socorros. Como também fui bombeiro durante sete anos, tinha muitos amigos paramédicos e bombeiros por lá que me ajudaram. O resgate chegou rápido e segui com ela, com vestido de noiva e tudo, pela ambulância. Ela tinha batimentos cardíacos, então, achei que era só um mal-estar.
Nós fomos para um hospital, que o convênio cobria, e ao chegar lá a médica que nos atendeu disse que o problema era complexo e que ela precisaria ser transferida para um hospital maternidade, com recursos tanto para a mãe quanto para o bebê. Me deram três opções e acabei escolhendo a Pro Matre Paulista (SP), sem saber se o convênio cobria ou não. Eu só queria salvar a vida da minha esposa e da nossa filha. Lá, já a levaram para o centro cirúrgico e me chamaram para dar os parabéns, pois a bebê havia nascido. Parece que, naquele momento, o mundo parou. Senti uma alegria e achei que estava tudo bem. Eu liguei para todo mundo e disse que a Sophia havia nascido e, apesar da prematuridade, estava bem. Só que ninguém me dava notícias sobre a Jéssica e eu comecei a ficar desesperado.
Até que um médico me chamou na sala e disse que ela tinha tido uma hemorragia interna, que eles precisavam retirar o útero dela. Nesta hora, eu entrei no centro cirúrgico e vi tudo. Eles conseguiram estancar a hemorragia abdominal. Porém, enquanto ela estava lá ainda no pós-operatório, os médicos me chamaram novamente e disseram que o cérebro dela estava sem atividade, que ela teve um AVC hemorrágico, devido a eclâmpsia, e que iriam transferi-la para o Hospital São Paulo para fazer todos os exames e procedimentos.
Lá eu vivi momentos de pânico e angustia até que o médico me chamou em uma outra sala e disse que ela tinha tido morte cerebral. Pediu para eu entrar na sala para me despedir. Eu só conseguia chorar, rezar e pedir forças para Deus. Ela estava quentinha, tinha batimentos cardíacos e eu comecei a fazer massagem nos pés dela. A Jéssica sempre adorava as minhas massagens. Depois de conseguir me controlar e ficar lá por um tempão, eu tive coragem para avisar a todos que o pior havia acontecido.
A partir daí eu senti muito medo, um desespero começou a tomar conta. Mas me lembrei o quanto a gente queria nossa filha, Sophia, e que ela agora precisava de ajuda porque eu teria que ser pai e mãe de uma bebê de UTI. Eu e a família dela decidimos doar todos os órgãos para ajudar outras pessoas. A Jéssica trabalhava em banco de sangue, era doadora, e sempre falava da nobreza desse gesto.
A Jéssica era uma mulher muito especial, um ser de luz, me ensinava todos os dias como eu deveria tratar uma mulher e é isso que vou tentar fazer, agora, com a nossa filha Sophia, que é uma parte dela que ficou. Ela foi uma guerreira, lutou até o último minuto, era uma mulher fantástica, em todos os sentidos.
Ao chegar à Pro Matre para buscar notícias da minha filha, eles me apresentaram uma conta de R$ 35 mil da cirurgia feita na Jéssica. Eu não tinha este dinheiro e pedi em um grupo de amigos do WhatsApp que eles depositassem o que tivessem para me ajudar. Foi aí que eles decidiram fazer a vaquinha virtual. Eu ainda estou tentando processar tudo que aconteceu. Se alguém me contasse uma história dessas, eu iria achar que era enredo de um filme triste. A sensação que tenho é que estou dentro de uma sala de cinema assistindo a esse filme e que depois de chorar, chorar, chorar, vou sair da sala e tudo vai acabar. Mas, não. No meu caso, o filme não acaba e o sofrimento será para sempre.
Eu só queria agradecer esta corrente do bem que se formou, aos meus amigos, familiares e todos que fizeram doações. Só quero que Deus me de forças para cuidar da nossa pequena Sophia. Sobre o casamento? Ele foi cancelado e a minha família doou toda a comida do buffet às crianças da comunidade Peri Alto, na zona norte de São Paulo”, diz o tenente Gonçalves.