14 de dezembro de 2025
POLÍTICA

Flávio Paradella: Câmara retorna atordoada pela própria crise

Por Flávio Paradella | Especial para a Sampi Campinas
| Tempo de leitura: 5 min
Divulgação/CMC
Mesmo após renúncia, Zé Carlos teve novo pedido de CP e legislativo analisa o procedimento

A Câmara de Campinas retorna do recesso nesta segunda-feira, 5 de agosto, sob a mesma tensão política e institucional: um novo pedido de Comissão Processante (CP) contra o ex-vereador Zé Carlos (PSB), que renunciou ao mandato no último minuto para escapar da cassação. A proposta reacende a crise que marcou o encerramento do semestre anterior.

O pedido foi protocolado pelo vereador Marcelo Silva (PP) e se baseia na confissão gravada de Zé Carlos ao Ministério Público de São Paulo (MPSP). No vídeo, amplamente compartilhado nas redes sociais, o ex-presidente da Câmara admite que solicitou propina ao empresário Celso Palma, responsável pela operação da TV Câmara: "Confesso nos termos da denúncia, doutor", afirma, diante do promotor do caso. Nada novo, pois já sabíamos disso. Porém, o vídeo traz a imagem de um ex-presidente de um dos maiores poderes do município admitindo pedir dinheiro. É forte e ultrajante.

Apesar da renúncia ter anulado a CP anterior, o novo requerimento sustenta que a Câmara tem sim prerrogativa para julgar infrações cometidas durante o exercício do mandato, conforme prevê o artigo 5º do Decreto-Lei nº 201/1967. Há ainda jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) que ampara o prosseguimento de apurações político-administrativas mesmo após o fim do vínculo parlamentar.

A denúncia é acompanhada de documentos do Ministério Público, incluindo a íntegra da confissão, cópia da denúncia criminal, termo de audiência e e-mails trocados entre os envolvidos. Trechos de áudios revelam orientações de Zé Carlos para que o empresário "deixasse o celular e o relógio no banheiro", com receio de ser gravado.

No acordo de não persecução penal firmado com o MPSP, Zé Carlos se comprometeu a pagar R$ 151,8 mil em 15 parcelas. O então secretário de Relações Institucionais da Câmara, Rafael Creato, também aderiu ao acordo, com multa de R$ 45.450.

A vaga de Zé Carlos já foi ocupada por Ailton da Farmácia (PSB), seu suplente. Procurado, o ex-vereador não quis se manifestar.

E agora?

A Procuradoria Jurídica da Casa analisará a admissibilidade do pedido, e se estiver em conformidade, a denúncia será lida e votada em plenário já nesta segunda. A aceitação depende de maioria simples dos parlamentares presentes. Caso aprovada, a Comissão Processante será formada por três vereadores, escolhidos por sorteio. Se rejeitada, o pedido será arquivado.

A nova investida amplia a pressão sobre o Legislativo campineiro, que soma escândalos recentes e uma imagem desgastada. O caso de Zé Carlos, que presidiu a Câmara entre 2021 e 2022, representa o auge de uma crise ética sem precedentes — e que insiste em não terminar, mesmo após sua saída do cargo.

Ainda cabe CP?

Apesar da gravidade do episódio que envolve o ex-vereador Zé Carlos (PSB) e da indignação legítima provocada por sua confissão de pedido de propina, não acredito que a nova Comissão Processante terá continuidade. O motivo é jurídico e técnico: o procedimento de CP tem como finalidade exclusiva a cassação de um mandato eletivo. E, nesse caso, o mandato já não existe.

A renúncia feita por Zé Carlos na noite de 30 de junho — momentos antes da votação que poderia cassá-lo — retirou justamente o objeto central da apuração: o cargo parlamentar. A Comissão Processante não tem função punitiva no campo cível, criminal ou eleitoral. Seu foco é apenas preservar a moralidade do Poder Legislativo por meio da cassação de mandato. Sem mandato, não há o que julgar.

O vereador Marcelo Silva (PP), autor do novo pedido, tem um objetivo claro: tentar impedir eventuais candidaturas futuras de Zé Carlos. Mas esse tipo de sanção não está no escopo de uma CP. A perda dos direitos políticos exige ação própria na Justiça Eleitoral ou decisão judicial transitada em julgado. Comissão Processante não decide sobre elegibilidade futura.

A pergunta que paira no ar é: “Zé Carlos poderá se candidatar novamente, mesmo tendo confessado corrupção?”

Na prática, poderá, sim — a não ser que seja condenado por um colegiado em ação penal, cível ou por improbidade, o que não é o caso neste momento.

A confissão do ex-parlamentar foi feita para viabilizar um acordo de não persecução penal com o Ministério Público, um instrumento previsto no sistema de Justiça que permite ao investigado reparar o dano e evitar uma ação penal. Ao aderir ao acordo, Zé Carlos paga uma multa e se livra do processo criminal.
E é justamente essa a aposta política dele: ao evitar condenação, preserva também sua elegibilidade.

No final, resta à sociedade avaliar com atenção quem são os nomes que pretendem retornar à vida pública. A política tem mecanismos para punir — mas o voto, na democracia, ainda é o principal filtro.

Pressão aumenta ainda mais


Reprodução/Redes Sociais

A volta do recesso da Câmara de Campinas promete ser ainda mais turbulenta. Grupos organizados articulam manifestações para a próxima segunda-feira, dia da primeira sessão ordinária do segundo semestre, e o alvo da vez é o vereador Arnaldo Salvetti (MDB), envolvido em um caso que combina escândalo pessoal, violência e exposição política.

A história foi revelada em reportagem do competente jornalista Luiz Felipe Leite, no Correio Popular, e tem potencial para gerar grande comoção. Segundo o boletim de ocorrência registrado no dia 16 de junho, uma mulher acionou a Polícia Militar em Campinas, alegando ter sido agredida após tentar conversar com o parlamentar, com quem supostamente mantinha um relacionamento extraconjugal.

O relato é sensível. De acordo com o depoimento colhido por um PM, a mulher procurou Salvetti na Rua Clodomiro Franco de Andrade Junior, no Jardim do Trevo, com o intuito de discutir a relação e as promessas de separação feitas pelo vereador. Ainda conforme o registro, ela foi contida fisicamente por uma funcionária do gabinete e, na sequência, levou um soco na boca.

A oposição estuda um pedido de investigação e já esperada a presença de grupos feministas e movimentos sociais no plenário, o que pode marcar um novo ponto de ruptura no Legislativo campineiro.