27 de dezembro de 2025
OPINIÃO

Encontros tênues

Por Claudia Zogheib | A autora é psicanalista, especialista pela USP – Departamento de Psicologia e Psicóloga Clínica formada pela USC
| Tempo de leitura: 4 min

O ano de 2025 está chegando ao fim. O que ficou deste ano que passou dentro de cada um de nós?

Para cada um o ano teve um significado, e independente como nos organizamos e entendemos as nuances das festas, e onde cada um vai passar a virada, o balanço do fim de ano torna-se inevitável uma vez que os calendários sempre nos levam a esta pausa que muda a agenda.

O fim do ano é pesado para todo mundo, e muitos são tomados por sentimentos como inadequação, angústia, fracasso, projeção, regressão, irritação, como se sentissem num fio de esgotamento que pede pausa.

Existem os que passam com os familiares, os que viajam, os que se ausentam, os que dormem, os que tricotam os parentes que não estão por perto projetando suas faltas neles, os que acusam o que acham problemático para esconder os próprios devaneios, os que justificam sua língua mordaz numa equivocada correção, e os que decidem por uma comemoração mais íntima - que desejam boas festas a todos e se ausentam para não continuar sendo o bode expiatório dos que não tiveram a coragem de se olhar.

Cada um sabe de si, mas diante de um ano que termina e outro que começa, penso que a melhor reflexão seja não se culpar pelos problemas e julgamentos dos outros, tendo a coragem de enxergar os próprios problemas e sendo capaz de tomar a decisão de entender seu lugar de pertencimento, consigo, e depois com os outros.

Seja como e com quem decidimos passar as festas, que possamos nos atender, dando espaço para pensar o que não queremos que esteja conosco em 2026 no que diz respeito aos próprios desejos e ao comportamento dos outros, sobre o que permitimos que os outros façam a nós.

A palavra festa precisa ser entendida como um lugar onde as pessoas se sentem acolhidas e respeitadas, um lugar de encontro onde são recebidas no desejo coletivo que a festa aconteça, independente do que é festejado.

Festa é um termo amplo para celebração, com diversas formas e significados, desde uma reunião simples até grandes manifestações culturais, tema de muitos encontros simbólicos que dizem respeito a como fomos e queremos ser tratados, onde somos desejados.

De todas as maneiras possíveis, é no encontro com a forma que escolhemos viver que podemos dar o melhor de nós - nas festas grandes e badaladas ou nos jantares íntimos com poucas pessoas. O importante é que cada um encontre o seu lugar no mundo naquele momento, e decida estar onde se sente bem.

Por mais de vinte anos celebrei as festas de fim de ano em minha casa, com mais de cinquenta convidados, teatros, celebrações, ceia, mesas imensas, decorações, com familiares e amigos que estão espalhados pelo mundo.

Cada vez mais percebo o quanto as festas existem na medida de nosso desejo de promovê-las, e em todos os modelos de comemoração, o indispensável são as intenções de cada um que estará presente na festa.

Num universo de deveres que alimenta um superego cruel onde projetamos as obrigações e necessidades ou a imposição do otimismo ou pessimismo estamos nós, tentando dar conta daquilo que às vezes podemos dizer não, preservando nossa saúde mental quando sentimos que a destrutividade do outro pode atrapalhar nossas conquistas diárias, escolhendo a pausa e não a demanda que nos foi imposta pelo outro - optando por leveza, respeito, simplicidade.

Embora com o tempo as situações vão mudando diante das comemorações, é no calor dos afetos que as pessoas podem se revelar diante de um ano novo que nos espera, trazendo para si aquilo que carregam de mais importante, desejando poder desejar, podendo levar e trazer verdade para suas vidas, independente como e com quem festejam.

Evitar os encontros de fim de ano pode significar autocuidado à medida que entendemos em qual momento estamos quando dizemos sim, quando dizemos não.

A psicanálise nos lembra de que precisamos do outro para dar contorno ao próprio eu. Aquilo que não encontra escuta, tende a se repetir até que seja ouvido internamente e, enquanto o valor do respeito e do encontro não é entendido por todos, as escolhas devem ser definidas pelo que temos de mais precioso - nós mesmos e nossa saúde mental.

Feliz 2026, ele nos espera.

Música "Gente", com Caetano Veloso e Maria Bethânia.