Nas últimas semanas venho sentindo algo difícil de explicar. Talvez porque, no dia 10, terminou a campanha global 16 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres.
E o que ficou evidente, mais uma vez, é que a violência contra a mulher só aumenta. Ela cresce porque ainda é tratada de forma pontual, e não como rotina institucional.
Em Bauru, uma mulher é estuprada a cada 48 horas.
No estado de São Paulo, os pedidos de medida protetiva cresceram 22,3%.
No Brasil, quatro mulheres são assassinadas todos os dias. Somos o quinto país que mais mata mulheres no mundo.
O artigo 5º da Constituição Federal garante a todos o direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. Como mulher, muitas vezes sinto que isso não se aplica a nós.
Essa sensação tem história. Décadas de mortes tratadas como tragédias inevitáveis criaram um país onde crimes contra mulheres ainda são vistos como dramas privados, e não como falhas coletivas. Os casos de Eloá, morta em 2008 aos 15 anos, e de Ângela Diniz, assassinada em 1976, mostram o quanto caminhamos pouco.
Em comum, havia homens que não aceitavam o fim, nem a ideia de que aquelas mulheres pudessem decidir a própria vida. Quase meio século separa essas histórias e, ainda assim, a cultura que sustenta esses crimes permanece.
Todas nós conhecemos alguém que deixou de viver algo por ciúmes, que foi humilhada, teve a liberdade reduzida, perdeu amigos, levou um tapa, ouviu um grito ou chorou sozinha.
Isso faz com que guardemos tudo dentro do peito, porque explicar esse sentimento para quem não vive na própria pele quase sempre nos coloca no lugar de exagerada, dramática ou emocional.
O medo constante já é violência. O xingamento, o soco na parede, o interrogatório antes de sair de casa, a desconfiança permanente. Nada disso é pequeno. O feminicídio é o último capítulo de uma história que sempre começa antes.
E o mais absurdo é perceber que, mesmo vivendo em um mundo de inteligência artificial, carros autônomos e avanços inimagináveis, ainda não conquistamos o básico: fazer os homens entenderem que não nos controlam, da mesma forma que sabem que não controlam outros homens.
Bauru tem uma prefeita mulher. E, diante desse cenário que atravessa nossas vidas diariamente, quero saber qual é a posição do governo municipal.
Quais ações concretas serão tomadas?
Como a cidade pretende enfrentar números que envergonham qualquer sociedade que se considere justa? O que Bauru oferecerá para que possamos, ao menos, existir com segurança?
A bandeira contra a violência não é partidária. É constitucional. É humana.
Escrevo porque não quero escrever depois. Não quero transformar dor anunciada em luto confirmado.
Ser mulher não deveria ser tão difícil. Mas é.