05 de dezembro de 2025
OPINIÃO

Frankenstein está de volta

Por Zarcillo Barbosa | O autor é jornalista e articulista do JC
| Tempo de leitura: 3 min

Uma nova versão do filme "Frankenstein" está nas telas dos cinemas. Não os de Bauru, onde os programadores parecem viver em outro planeta, mas pode ser vista na telinha da franquia Netflix, por privilegiados mensalistas. O novo projeto de Guillermo del Toro, faz uma releitura da lendária criatura que é até bonitinha e simpática, mesmo feita de restos mortais.

O diretor mexicano procura oferecer um olhar que aproxime o público da essência da criatura, sem sustos, e sinta o lado oculto da história. Na obra clássica de Mary Shelley, quando o dr. Victor Frankenstein rejeita o monstro que ele mesmo cria, este escapa e jura vingança. Metaforicamente, os políticos que repudiamos, por mais corruptos ou incompetentes, não deixam de ser cria nossa, eleitores.

Na minha imaginação, o monstro da literatura lembra a democracia representativa brasileira. Desde o início da República procuramos copiar as formas encontradas pelas sociedades civilizadas para garantir que prevaleça o desejo da maioria. Infelizmente o sistema apresentou falhas, ao longo desses 136 anos, por culpa dos próprios legisladores e dos políticos que a deveriam manter. Os propósitos democráticos, de atendimento às necessidades básicas dos cidadãos e de compartilhamento mais equânime da renda nacional, são quesitos a que todos os candidatos se comprometem defender. Uma vez eleitos, logo se esquecem dos compromissos de campanha.

Para Rousseau, a preservação da liberdade do indivíduo, sua segurança e o bem-estar coletivo dependem do respeito a um conjunto de pactos que o filósofo denomina "contrato social". Nele, deve prevalecer o interesse do povo.

O que vemos, lemos ou ouvimos na mídia dizem respeito a acontecimentos próprios de filmes de terror de segunda categoria. Assusta-nos o esquema bilionário de fraudes no INSS, que envolve descontos associativos não autorizados em aposentadorias e pensões.

Ex-ministros do governo Bolsonaro e deputados foram alvos de mandados de busca e apreensão. Inclua-se a ex-nora do presidente Lula, suspeita de liberações ilegais de verbas do MEC. A PF e a CGU miram esquemas de desvio de recursos públicos, fraudes em licitações e lavagem de dinheiro, muitas vezes envolvendo emendas parlamentares. A corrução é endêmica e tema polarizador no debate político brasileiro. Chega-se à conclusão que a criminalidade menor está nas favelas.

O governo Lula implementou um Plano, que reúne 260 ações estratégicas para a promoção da integridade e o combate à corrupção na administração federal. No entanto, a percepção de que os políticos raramente são punidos ainda é predominante entre a população, segundo recente pesquisa.

Criamos o monstro e agora não conseguimos controlá-lo. Em 2013, o povo ainda protestava, saia às ruas e exigia uma postura mais séria dos seus representantes no Legislativo e no Executivo. Transporte, saúde, educação, segurança e, obviamente, o combate à corrupção eram os temas recorrentes. Houve um pouco de bobagem e violência, sim. Seria ingênuo achar que todos agiriam como cidadãos bem comportados. Há sempre os oportunistas e os mal-intencionados.

Tudo fazia crer que, depois de tantos protestos, o gigante adormecido teria acordado. Os políticos ficaram mais temerosos de subestimarem a população. As redes sociais começaram a mostrar sua utilidade, capazes de aglutinar multidões nas ruas num piscar de olhos. Houve renovação, mudanças. Nem se cogitava de esquerda, centro ou direita. O que todos desejavam era uma política séria, uma democracia em contínuo aperfeiçoamento.

Parece que nós todos perdemos a capacidade de indignação. Os políticos corruptos, que nunca nos deixaram de todo, voltaram ainda com mais força. Os milhões desviados de outrora viraram bilhões de reais, hoje. Corta-se a cabeça da Hidra e duas outras nascem no lugar. A vingança da criatura.