05 de dezembro de 2025
COLUNISTA

Aprendendo a voar

Por Hugo Evandro Silveira |
| Tempo de leitura: 3 min
Pastor Titular - Igreja Batista do Estoril

Por Carlos Brunelli

Ícaro - homem-pássaro da mitologia grega - teve sua derrocada atribuída a um misto de desobediência e arrogância. Conta a narrativa lendária que essa personagem foi aprisionada, junto com seu pai Dédalo, arquiteto do Labirinto de Creta, em uma alta torre de um inexpugnável castelo, em virtude de uma suposta revelação dos segredos do labirinto para que Teseu pudesse dali escapar após derrotar o Minotauro. Dédalo, habilidoso artesão, teria então confeccionado asas para ele próprio e seu filho, de modo que pudessem voar ao se lançar da janela da torre, e assim escapar do cativeiro. Essas asas teriam sido construídas a partir de penas, fios de roupas e cobertores, tudo amalgamado com cera de abelha. Em razão disso, Ícaro foi instruído por seu pai para não voar muito próximo ao sol, uma vez que o forte calor do astro derreteria a cera e causaria instabilidade às asas. Em rebeldia aos conselhos paternos, soberbo e tomado de ambição excessiva, sentindo-se dono da situação o homem-pássaro voou cada vez mais alto e o previsto aconteceu; a cera derreteu e Ícaro morreu pela queda no mar.

Relatos emeristas à parte, a estorieta acima traz importantes reflexões aplicáveis aos dias e cenários em que vivemos. Pessoas a quem são concedidas características especiais logo se esquecem de quem as outorgou e se entregam a uma egolatria que mais cedo ou mais tarde as condenará. Habilidades esportivas ou em algum ramo da ciência; posse abundante de recursos ou de trânsito político; dom artístico, comercial ou administrativo, variados são os campos onde podemos encontrar indivíduos acima da média e, portanto, enaltecidos, admirados e invejados. Dessa idolatria ao culto a si mesmo como destaque especial basta um descuido.

O senso exagerado de autoimportância e a preocupação excessiva consigo mesmo, que leva à vaidade e à busca por reconhecimento, são comumente definidos como ego. Quando a pessoa se torna o centro de sua própria adoração, cria-se a autoidolatria ou, mais apropriadamente, a egolatria. "Não terás outros deuses diante de mim" - aí incluída a veneração a si próprio - é o mandamento colocado por Deus em primeiro lugar e enfatizado acima de qualquer outro, no livro de Êxodo. A proibição decorre da distração que envolve o ser humano ao cultuar coisas tangíveis e intangíveis, deixando de reverenciar a Deus, único a quem deve ser exclusivamente dirigida nossa adoração. Hoje, podemos permitir que muitas coisas (dinheiro, fama, influência, trabalho, família, prazer) se tornem nossos ídolos quando nos concentramos excessivamente nelas em busca de identidade pessoal, significado da vida e segurança. A dominação é sutil, pois inicialmente ninguém se posiciona intencionalmente para adorar essas coisas, mas após algum tempo de devoção a elas transformam-se em deuses que irão controlar completamente nossos pensamentos, esforços e ações. A dedicação a Deus impede que tais elementos assumam um papel indevido em nossas vidas.

A idolatria e a sua vertente narcísica - a egolatria - não só ofende a Deus como também prejudica o próprio indivíduo, que busca satisfação em elementos que nunca poderão realizá-lo plenamente. Em razão disso é que Jesus enfatizou a necessidade de "negar a si mesmo" e "perder a vida" (Marcos 8:34-36), porque se esta vida nos parece confortável e as coisas em que nos apoiamos enganosamente nos transmitem segurança, há comprometimento e confiança apenas superficiais em nosso Salvador e em sua promessa de um Reino de glória. Nada no plano material pode compensar a perda da vida eterna. Não se deslumbre, e sim agradeça a dádiva que lhe foi dada de "voar", mas não esqueça que suas asas são de cera. Nem desdenhe dos conselhos do Pai, se distraindo na autocontemplação de sua habilidade e voando tão alto que a queda fatal seja inevitável.