Vivemos uma era de dependência, não propriamente de liberdade. Do prazer instantâneo à produtividade compulsiva, das redes sociais às tarjas pretas, somos escravos do excesso que se vendeu como modernidade — a modernidade que, em essência, é uma promessa de que seremos subjetivamente livres, críticos e criativos, vivendo em democracias, com excelente educação e ciência igualmente para todos.
Mas quem, hoje, está imune? Todos respiram um pouco dessa mesma dopamina fabricada.
O vício, nesta virada de milênio, não é apenas acidente ou fraqueza. É a grande estrutura invisível que nos prende. Estamos anestesiados, ocupados, exaustos — e chamamos isso de vida. Em incontáveis casos, o poder opressor de Estados e mercados não nos oprime com violência física; nos seduz com prazer superficial.
Solidão, consumo, trabalho incessante: cada compulsão é engrenagem de uma máquina social que nos devora. Somos prisioneiros de desejos moldados, reféns de necessidades inventadas. Liberdade virou ilusão, e a normalidade, uma nova e sofisticada prisão.
O vício é o novo paradigma reinante. Transforma prazer em obrigação, excesso em rotina, e obriga a sociedade a girar mesmo quando exausta, medicada, diagnosticada.
Pensar livremente exige coragem: recusar a dependência, questionar a ordem, ousar escapar da globalizada programação consumista, hiperprodutivista, robótica — desumanizada.
Um algoritmo individualista sem indivíduo. Altamente individualista, mas com baixa autoestima.
Quem agora consegue viver não viciado? Olhe ao redor e tente responder. Olhe para si mesmo e veja se consegue acreditar que é livre.
Ou já somos todos escravos dos efeitos colaterais da modernidade — sem usufruir do fruto principal da bela autonomia moderna —, submissos à pressa, incapazes de existir fora do consumo, da dopamina e do cansaço imposto?