Já sentiu que passar horas rolando o feed te jogava em um ciclo sem fim de comparação com a vida dos outros? Beatriz Souza, de 32 anos, se viu assim e percebeu que o uso desenfreado de redes sociais prejudicava sua saúde mental.
A arquiteta, natural de Sergipe, também chegou à conclusão que quanto mais tempo passava on-line, piores eram suas crises de ansiedade. Por isso, a saída encontrada foi ficar sem o Instagram por três meses.
"Achava que estava sempre atrasada, que não era capaz de chegar onde eu almejava, mas, ao mesmo tempo, passava muito tempo acompanhando a vida dos colegas e não fazia as coisas acontecerem na minha", relata.
Para quem busca melhorar a saúde mental, o detox digital tem se consolidado e ganhado novas facetas. Muitos jovens e adultos estão decidindo se afastar das redes e aplicativos para dar um passo em direção à desconexão consciente, chegando a se isolar em retiros para se livrar da dependência.
Apesar da popularização recente, o termo "detox digital" e a busca pela mudança de hábitos relacionada não são de hoje. Ele foi descrito pela primeira vez em 2012 para designar a ação de "desintoxicar" a mente dos conteúdos on-line através do afastamento consciente e temporário das redes (ou da internet como um todo).
Uma pesquisa recente realizada com beneficiários da empresa Pluxee mostrou que 67% dos adultos entrevistados já decidiram reduzir o tempo de uso ou desativaram suas contas em redes sociais em algum momento. Além disso, 82% dos participantes afirmam passar no máximo duas horas por dia conectadas, enquanto 56% procuram limitar esse tempo de uso em até uma hora.
Do total, 68,6% buscam diminuir o uso motivados, principalmente, pela percepção de perda de tempo e 20,8% devido à sensação de ansiedade e estresse provocada por conteúdos on-line.
Outro estudo, encomendado pelo Instituto Cactus e divulgado no ano passado, indicou que 45% dos participantes relatam que as redes sociais afetam negativamente sua saúde mental. Dentre eles, o impacto do uso frequente é muito negativo para uma fatia de 10%.
Fábio Cantinelli, psiquiatra-chefe do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo e membro da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), explica que a preocupação com as consequências que estímulos demais podem causar ao cérebro está em pauta desde a invenção da televisão.
"É comprovado que o cérebro passa a operar com um estímulo excessivo, além do que ele pode suportar, quando começamos a passar muito tempo no telefone. Assim, o detox vem como uma resposta a essa intoxicação generalizada de informações, que estão muito ligadas à ansiedade e à depressão."
O barulho de notificações, as postagens chamativas e um turbilhão de informações (sejam úteis ou inúteis) fazem parte da rotina corriqueira de quem utiliza redes sociais e plataformas de vídeo no celular. Como consequência, muitos se sentem sobrecarregados.
A armadilha da dopamina
De acordo com Bianca Kuhn, especialista em saúde mental do Instituto Cactus, as plataformas hiperestimulam o sistema da dopamina, o "hormônio do prazer", o que cria a necessidade de conexão constante. "O formato dos Reels do Instagram e do feed do TikTok acaba enfraquecendo a capacidade de focar e faz com que sempre fiquemos em um estado de espera por recompensas", afirma.
Jejum digital
O jejum digital pode criar novas brechas de atenção e energia para serem enfim dedicadas a outras atividades. Passados os meses em que esteve longe do seu perfil no Instagram, Beatriz finalmente conseguiu focar nos próprios projetos. "Tive um grande processo de autoconhecimento nesse tempo que passei longe das redes. Procurei me entender melhor e pôr limites no uso das redes, além de conseguir ver com mais clareza que as pessoas só postam o que querem que os outros vejam", explica.
Olho nas dicas
Quando o detox ou afastamento virtual leva à exclusão de um perfil em uma rede social, um aspecto negativo é a perda da sociabilidade. No mundo atual, para muitas pessoas, estar online significa saber o que acontece na vida de pessoas próximas. Se isso se perde, existe a sensação de isolamento. "Quem for optar pelo detox deve avisar aos amigos íntimos e aos familiares com quem mantém contato. Assim, a pessoa consegue fortalecer esses laços de outras formas, seja por encontros presenciais ou ligações", aconselha Kuhn. Outra dica é definir momentos para se desconectar, porque o detox também pode ser feito de forma gradual. " Você pode separar uma hora do dia para desligar a tela ou ter áreas da casa em que não se usa o celular", recomenda Cantinelli.