O que seria um ano de preparação virou um impasse institucional para Claudio Massad. O atleta paralímpico de Bauru, referência do tênis de mesa adaptado brasileiro, acusa a Confederação Brasileira de Tênis de Mesa (CBTM) de impor regras sem respaldo legal aos beneficiários do Bolsa Pódio, programa federal voltado à elite do esporte.
Após o posicionamento da entidade, os atletas divulgaram nova nota reiterando as denúncias. Reclamam da falta de transparência na gestão dos recursos, da ausência de critérios claros na seleção dos contemplados e do baixo repasse de verba. Citam ainda retaliações, censura e exigências consideradas descabidas para acesso ao programa.
Massad, medalhista de bronze nos Jogos Paralímpicos de Paris e dono de 45 medalhas internacionais, integra um grupo que contesta publicamente decisões da Confederação. Segundo ele, a CBTM tem extrapolado seu papel de intermediária ao interferir diretamente na gestão das bolsas.
EXIGÊNCIAS
Em março, quando abriram as inscrições para o Bolsa Pódio, os atletas foram surpreendidos por uma mensagem no grupo oficial da seleção. A coordenadora de seleções da CBTM, Patrícia Cavalheiro, orientava os bolsistas a investir parte do valor em competições internacionais. Em alguns casos, a Confederação exigiu participação mínima em três torneios; em outros, o número podia chegar a dez.
Diante das cobranças, nove atletas paralímpicos assinaram um ofício solicitando esclarecimentos. Entre os signatários estão Bruna Alexandre, Claudio Massad, Paulo Salmin, Jennifer Parinos, Luiz Filipe Manara, Cátia Oliveira, Danielle Rauen, Joyce Oliveira e Marliane Santos. Juntos, eles somam 16 medalhas paralímpicas e 8 em Mundiais.
Pelas regras do programa, cabe à Confederação apenas validar se os eventos indicados constam no calendário oficial. "A CBTM não paga a bolsa, só encaminha os documentos. Mesmo assim, impôs exigências sem base legal", afirma Massad.
Entre as obrigações impostas, estava a destinação de 30% a 60% do valor mensal — entre R$ 5 mil e R$ 16 mil — a torneios no exterior. "Isso não aparece em edital, portaria ou decreto. E a Confederação não tem legitimidade para exigir", diz o atleta, que é graduado em direito. Ele formalizou questionamentos à entidade, mas não recebeu resposta jurídica.
ATRASOS E VETOS
Massad relata que seu plano esportivo só foi aprovado no último dia do prazo, após pressão do Ministério do Esporte. "Ficamos um mês sem receber. Outras modalidades ganharam duas parcelas. Nós, só uma", afirma.
Desde a divulgação da carta, o atleta — que era presença frequente nas convocações — ficou de fora do último treinamento da seleção. Segundo ele, técnicos teriam sido orientados a não instruir os atletas que assinaram o manifesto, durante torneios recentes.
A Confederação também teria exigido que atletas do Centro Paralímpico de São Paulo assinassem contratos com cláusulas que impedem críticas públicas. "São quatro direitos e 20 deveres. Isso é censura", diz Massad.
CUSTOS ELEVADOS
Com rotina de treinos no Sesi de Bauru, Massad estima gasto de quase R$ 20 mil para competir em dois torneios nos Estados Unidos, em agosto. "A bolsa não cobre tudo. Há despesas com passagens, hospedagem, alimentação, inscrição, além do custo de vida no Brasil", relata.
Ele critica a tentativa da CBTM de condicionar o recebimento à destinação de parte da verba exclusivamente para viagens. "E como ficam moradia, alimentação, preparação física, equipe multidisciplinar?", questiona.
GRUPO PEDE RESPEITO
Massad afirma que os atletas não buscam confronto, mas condições justas de trabalho. "Queremos que a Confederação respeite as leis e os profissionais. Que pare de agir como adversária de quem representa o Brasil", diz.
O grupo reúne nomes com histórico de medalhas, como Paulo Salmin, Jennifer Parinos e Luiz Felipe Manara, e já atraiu atenção da imprensa nacional. Os atletas agora aguardam providências do Comitê Paralímpico Brasileiro e do Ministério do Esporte.
"Sem atletas, não há Confederação. E sem respeito, não há esporte que resista", conclui Massad.
OUTRO LADO
Em nota publicada em 9 de julho, a CBTM afirmou que a sugestão sobre o uso da bolsa teve caráter "educativo" e que "em nenhum momento foram estabelecidas obrigatoriedades, metas ou valores percentuais mínimos".
A entidade informou ter consultado o Ministério do Esporte nos dias 9 e 10 de junho para esclarecer os critérios do programa. Disse ainda que nenhum atleta que seguiu as orientações do Ministério foi prejudicado e que o número de contemplados subiu de 17 para 22 neste ciclo.
O JC/JCNET tentou contato com a CBTM em duas ocasiões, mas até o fechamento desta edição não houve retorno.
ATUALIZAÇÃO
Após consulta da própria Confederação, o Ministério do Esporte respondeu oficialmente à CBTM neste sábado (20) e reforçou que o Programa Bolsa Atleta não prevê a exigência de número mínimo de torneios, nem autoriza a entidade a impor regras adicionais aos beneficiários. Segundo o ofício, recomendações podem ser feitas com caráter pedagógico, mas o uso da verba é de responsabilidade do atleta, conforme previsto em portaria.