21 de dezembro de 2025
ENTREVISTA DA SEMANA

Movido pela memória: Roberto Gonçalves

Por Tisa Moraes | da Redação
| Tempo de leitura: 5 min
Cássia Peres/JC
Diretor social do Clube de Carros Antigos do Centro-Oeste Paulista, ele cultiva a paixão por raridades sobre rodas há quase seis décadas

Com um olhar que mistura nostalgia e entusiasmo, Roberto Gonçalves, 65 anos, diretor social do Clube de Carros Antigos do Centro-Oeste Paulista, possui uma trajetória marcada por estradas, encontros e lembranças. Desde pequeno, ele observava com fascínio Galaxies e Mavericks que cortavam a rodovia próxima à casa da família, em Duartina.

A paixão por automóveis antigos nasceu ali, durante a infância no meio rural. Nascido em Ubirajara, Roberto começou a trabalhar cedo com a criação de bicho-da-seda. Depois, trabalhou por alguns anos como bancário, até migrar definitivamente para o setor de vendas.

Passou por empresas como a Coca-Cola e Adams e estabeleceu-se no segmento de etiquetas, no qual atua até hoje como representante comercial autônomo. Casado com Adriane e pai de Roberto Jr., 36 anos, e Julia, 30 anos, Roberto segue até hoje dedicado ao clube, do qual é membro atuante há mais de duas décadas.

Sempre com olhar voltado para os clássicos sobre rodas, ele é peça importante na organização dos eventos da entidade, que unem gerações. Nesta entrevista, ele revisita sua jornada, conta como alguns carros fizeram parte de momentos marcantes de sua história e celebra estas raridades como elos entre passado e presente capazes de despertar boas lembranças. Leia os principais trechos.

JC - Qual é a lembrança mais remota da sua admiração por carros?

Roberto - Meu pai era um empreiteiro da agricultura, contratava pessoas, plantava café e deixava produzindo para o dono da terra. Então, moramos em algumas cidades. Quando eu tinha 2 anos, fomos para Fernão, depois ficamos um tempo em Gália e fomos morar em uma propriedade rural às margens da rodovia Comandante João Ribeiro de Barros, em Duartina. Tinha uns 7, 8 anos e ia com um dos meus irmãos para ver Galaxie, Landau, Dodge Charger RT passando pela rodovia, além do Maverick GT do filho do nosso patrão. Éramos seis irmãos e eu era o caçula. Lá, trabalhávamos na criação de bicho-da-seda e meu pai era meeiro, ou seja, ficava com metade do valor da venda da produção.

JC - Ficou muito tempo trabalhando lá?

Roberto - Com 13 anos, fui fazer o ginásio em Garça, onde meu tio morava, e puder ver de perto os carros lançados na época, Corcel, Brasília, Chevette, Passat. Mas tive dificuldade para me adaptar com as crianças que viviam na área urbana e não passei de ano. Voltei para Duartina e fui fazer o ginásio na cidade, enquanto continuava ajudando na criação de bicho-da-seda. Na minha classe, um menino quebrou a perna e eu, que era maior por ser mais velho, passei a carregá-lo nas costas dentro da escola. Acabei fazendo amizade e conheci o pai dele, que tinha uma Variant e era gerente do Bradesco.

JC - E conseguiu emprego no banco?

Roberto - Primeiro, trabalhei no supermercado Santa Rosa, buscando correspondência da empresa nos bancos, nos Correios, depois do horário da escola. Até que um dia esse gerente do Bradesco me viu no banco, eu era maior de idade e tinha carteira de trabalho, e ele me chamou para trabalhar no setor de cobranças. Na época, a criação de bicho-da-seda começou a ficar difícil para nós. Meu irmão mais velho já estava em Bauru e, quando foi trabalhar como motorista no Expresso de Prata, um outro irmão também veio para cá. Resolvemos vender tudo, compramos uma casa na região da Vila Industrial e viemos para Bauru.

JC - O senhor deixou o emprego no banco?

Roberto - Pedi transferência e, em 1979, comecei a trabalhar na unidade que ficava na Batista de Carvalho, esquina com a Treze de Maio. Sempre ia levar documentos na Coca-Cola, Sambra, Sadia, Chapecó, e trazia outros documentos das empresas para o banco. Resolvi pedir uma oportunidade na Coca-Cola e fui contratado no fim de 1982, onde comecei minha carreira como vendedor. Vendia para bares, padarias, mercadinhos, mas saí em 1985 para trabalhar na Adams, que tinha um escritório em Bauru. Era vendedor da área de supermercados, então, viajava bastante por toda a região, até Três Lagoas, para entregar chiclete Adams, escova dental Pro, Listerine e aparelho de barba Schick Ultrex. Fiz este trabalho por cinco anos.

JC - Depois, trabalhou onde?

Roberto - Fiquei cerca de quatro anos nas Linhas Corrente e outros cinco na Esselte Meto, que produz etiquetas de mercado, para preços, produtos de balança. Mas a empresa foi vendida e o novo dono não quis mais ter empregado, então, em 2001, me tornei representante autônomo do ramo de etiquetas, no qual atuo até hoje. Faço vendas para várias empresas, como a Star Etiquetas, Beta Etiquetas, Gama Etiquetas, mas não viajo mais. Todas as entregas são feitas via transportadora ou Correios e atendo mais de 300 clientes do País todo.

JC - Falando sobre sua paixão por carros, como entrou para o Clube de Carros Antigos?

Roberto - Por meio de um amigo, em 2002. Eu já tinha meu Corcel 2 de 1984, que ganhei do meu irmão em 1996 e me tornei sócio, mesmo não tendo um carro tão antigo. Sou diretor social há uns dez anos e a Kombi do clube fica na minha casa. Há mais de 20 anos fazemos encontros todos os domingos, às 10h, na Praça Portugal. De vez em quando, fazemos o Domingo da Família; em dezembro, temos o Adeus Carro Velho; e fazemos o encontro anual do clube, que reuniu mais de 400 carros e 5 mil pessoas em 2023. Estes têm cunho social, com arrecadação de alimentos para entidades que ajudamos.

JC - O que significa esta união em torno do carro antigo para você?

Roberto - É uma alegria. Para a minha geração, estes carros foram objetos de desejo, então, despertam uma memória afetiva grande. A perua Rural Willys que meu pai tinha, por exemplo, me marcou muito. Então, carro antigo tem a ver com preservação da memória. Nos nossos encontros, as famílias veem os carros e contam para as crianças que o avô tinha um igual. A gente fica feliz em ver estas boas lembranças sendo despertadas.