29 de novembro de 2024
COLUNISTA

A missão de serviço

Por Dom Caetano Ferrari |
| Tempo de leitura: 4 min
Bispo Emérito de Bauru

Neste mês da Bíblia, consideremos com mais atenção a mensagem bíblica da santa Missa deste domingo. Na cena evangélica narrada por São Marcos 9,30-37 Jesus, fugindo do assédio das multidões, pôs-se a atravessar a Galiléia, para aproveitar a oportunidade de caminhar a sós com os discípulos e ensinar-lhes sobre o mistério da cruz na sua vida e na dos discípulos. Repetiu que deveria passar pela cruz, morte e ressurreição, uma situação à qual passaria também todo aquele que desejasse segui-Lo. Jesus mesmo percebeu que os discípulos não entendiam o que Ele ensinava, como inclusive suspeitava que conversassem sobre outro assunto. Tanto que ao chegarem em Cafarnaum perguntou-lhes: "O que discutíeis pelo caminho?" Eles ficaram calados pois estavam discutindo sobre quem seria o maior entre eles. E nada de pensarem sobre essa tal coisa de cruz e morte. Sem perder a paciência, Jesus sentou-se com eles e foi explicando que quem quisesse ser o primeiro que fosse o último de todos e aquele que serve a todos. Para concretizar a ideia tomou uma criança e indicou-a como paradigma de acolhida do Pai e do Reino do céu no qual só entra quem tem o espírito de criança.

À "vontade de poder" desejada pelos discípulos Jesus propôs a "missão de servir" como Ele que veio para servir e não ser servido. A vocação de cada cristão e de toda a Igreja nada mais é do que a de servir. "Servir ao povo" é um chavão antigo, sobretudo muito usado por ocasião das campanhas eleitorais. Segundo o marketing contemporâneo "servir ao povo" é estar na moda, faz parte do comportamento politicamente correto especialmente para quem disputa prestígio e ascensão na sociedade da política e do mercado. Pois bom sujeito será aquele que se julga "um servidor" na sociedade do bem-estar social, uma pessoa inteligente e elegante. No entanto, lá no fundo essa pessoa não passaria de um egoísta e comodista que só está pensando em levar vantagem. Alguém que trata os outros como as empresas tratam os seus clientes, cujo foco de seu interesse é vender uma boa imagem. Também há hoje religiões em que servir o fiel na perspectiva do politicamente correto seria granjear mais adeptos, colaboradores e contribuintes, pouco ou nada se importando se esse modo de agir é evangelicamente correto. No entanto, quem captou o ensinamento de Jesus começa a ver as coisas além de uma visão puramente humana. Começa a olhar para a necessidade do próximo e a colocar-se do lado dos injustiçados e marginalizados. Sente-se chamado à solidariedade e à compaixão para com eles. A primeira leitura da santa Missa, Sabedoria 2,12.17-20, diz que o justo será socorrido pelo Senhor, não obstante seja perseguido pelos ímpios que desejam pô-lo à prova com insultos e condená-lo à morte infame. Mas, na segunda leitura, Tiago 3,16-4,3, São Tiago atesta que sábio é quem sabe manter a verdadeira sabedoria, quem busca a paz pela prática da justiça, Pois, este encontrará a sabedoria que é pura, pacífica, indulgente, conciliadora, plena de compreensão, generosidade e misericórdia que produz abundantes frutos de bem e de paz.

O Concílio Vaticano II, realizado há 50 anos, promulgou um documento chamado "Constituição Dogmática "Dei Verbum" (A Palavra de Deus) sobre a Revelação Divina, para "expor a genuína doutrina acerca da Revelação Divina e de sua transmissão, a fim de que pelo anúncio da salvação o mundo inteiro ouvindo creia, crendo espere, esperando ame". Transcrevo a seguir o trecho que fala do quanto a Igreja venera as Sagradas Escrituras:

"A Igreja sempre venerou as divinas Escrituras, da mesma forma como o próprio Corpo do Senhor, já que, principalmente na Sagrada Liturgia, sem cessar toma da mesa tanto da Palavra de Deus quanto do Corpo de Cristo o pão da vida, e o distribui aos fiéis. Sempre as teve e tem, juntamente com a Tradição, como suprema regra de sua fé porque, inspiradas por Deus e consignadas por escrito de uma vez para sempre, comunicam imutavelmente a Palavra do próprio Deus e fazem ressoar através das palavras dos Profetas e Apóstolos a voz do Espírito Santo. É necessário, portanto, que toda pregação eclesiástica, como a própria religião cristã, seja alimentada e regida pela Sagrada Escritura. Nos Livros sagrados, com efeito, o Pai que está nos céus vem carinhosamente ao encontro de seus filhos e com eles fala. E é tão grande o poder e a eficácia que se encerra na Palavra de Deus, que ela constitui sustentáculo e vigor para a Igreja, e, para seus filhos, firmeza da fé, alimento da alma, pura e perene fonte da vida espiritual. Por isso aplicam-se, por excelência, à Sagrada Escritura estas palavras: 'É viva e eficaz a Palavra de Deus' (Heb 4,12 'que pode edificar e dar herança a todos os santificados' (At 20,32; cf. 1Tess 2,13)" (DV nº 21).