22 de dezembro de 2025
DO SÉCULO 20

Cinemateca recupera mais de mil filmes que resistiram a incêndios

Por FolhaPress |
| Tempo de leitura: 2 min
Reprodução/Cinemateca
Genésio Arruda, protagonista do primeiro longa sonoro do País

Rodado em branco e preto em 1931, "Nossas Coisas" foi um dos primeiros filmes sonorizados do Brasil. Música, vozes e ruídos estavam perfeitamente sincronizados às imagens graças a novidade do sistema Vitaphone, criado há pouco pela Warner Bros. e que faria enorme sucesso comercial nos anos posteriores. Mas o filme não resistiu ao incêndio de 2016 na Cinemateca Brasileira. Apenas seu trailer sobreviveu as chamas, e agora não corre mais riscos. O rolo de filme está entre os 1.785 recuperados e digitalizados pela Cinemateca através do projeto Viva Cinemateca, que pela primeira vez na história preserva de forma eficaz o seu acervo em nitrato de celulose, material altamente inflamável.

Os filmes recuperados foram realizados entre 1900 e 1955 e estão entre os 3.000 rolos que não pereceram às chamas, que há oito anos destruíram 962 obras. Apesar do dano irreparável, a tragédia era anunciada. A Cinemateca passou por outros incêndios antes em 1957, 1979 e 1982, e as chamas consumiram, no total, metade de sua coleção original. Uma realidade dolorosa para o órgão que tem a missão de abrigar em um só lugar filmes garimpados em todo o território nacional - e fora dele, como foi o caso recente de "Amazonas, O Maior Rio do Mundo", de Silvino Santos, primeiro filme rodado na Amazônia.

"Através desses materiais conhecemos a história social e cultural do Brasil. A preservação é muito cara, mas se quisermos ter memória do audiovisual brasileiro, é preciso investir", disse Maria Dora Mourão, diretora da Cinemateca, em evento dedicado a anunciar a disponibilização dos filmes restaurados no site oficial Banco de Conteúdos Culturais e, em breve, na plataforma de streaming anunciada pelo Ministério da Cultura, ainda a ser lançado. Entre outros títulos recuperados estão "Apuros do Genésio", de 1940, um registro raro de Genésio Arruda, astro de "Acabaram-se os Otários", primeiro filme sonoro brasileiro de 1929 e um trecho de "Barulho na Universidade", primeiro longa de Watson Macedo, um dos principais diretores de chanchadas e o único em que ele aparece atuando.

Também foi encontrada uma gravação documental de festas na igreja de Santa Maria do Sul, no Rio Grande do Sul, de 1910, a mais antiga do acervo até o momento. O nitrato de celulose era amplamente usado no começo do século 20 porque tinha boa maleabilidade e podia ser esticado facilmente em longas tiras, mas o plástico pode entrar facilmente em autocombustão por um simples atrito ou se ficar guardado em lugares quentes, por exemplo. Sua preservação é custosa e requer rigor técnico. Os 1.785 filmes demoraram um ano e meio para serem digitalizados, um processo que custou R$ 15 milhões angariados por meio da Lei Rouanet e patrocínio do Instituto Cultural Vale, Shell, e do banco Itaú.

"Técnicos precisaram analisar frame por frame de cada rolo de filme para identificar as obras", explica Mourão.