O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) derrubou nesta quarta-feira (17) a previsão do regimento interno da Câmara de Bauru que estipula a leitura de um versículo da Bíblia antes das sessões legislativas.
A decisão veio no âmbito de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) ajuizada pela Procuradoria-Geral de Justiça, órgão máximo do Ministério Público de São Paulo (MP-SP), que contesta o dispositivo da Câmara sob o argumento de que fere o princípio do Estado laico.
Além da leitura da Bíblia no momento de abertura das sessões, a decisão derruba ainda a frase "sob a proteção de Deus, os vereadores da Câmara de Bauru iniciam seus trabalhos" e também a determinação do regimento para que a Bíblia permaneça sobre a Mesa Diretora da Casa.
O julgamento do caso aconteceu ontem, razão pela qual o acórdão dos desembargadores ainda não saiu. A votação, porém, foi unânime entre os magistrados do Órgão Especial do TJ, responsável pela análise de ações nesse sentido. Farão declaração de voto, além do relator, os desembargadores Ricardo Dip e Luciana Bresciani.
A Câmara tentou defender os dispositivos sob o argumento de que "todas as Constituições brasileiras, exceto as de 1891 e 1937, invocaram a proteção de Deus quando foram promulgadas".
Além disso, a Casa ressaltou também que "não se trata de adoção de ideologia ou corrente religiosa em detrimento de outra, mas sim de uma manifestação histórico-cultural de uma fé em Deus genérica e abstratamente considerada".
O Legislativo chegou a criticar o Ministério Público pela interposição de Adin. "A afirmação do MP nos levará a apagar tudo o que simbolicamente remeta ao cristianismo ou a qualquer outra religião no Brasil?", indagou.
A Casa sugeriu também que o TJ não poderia "se aventurar" no argumento da Procuradoria e apontou, entre outras coisas, que essa linha de raciocínio do MP valeria também para derrubar os decretos que declararam a cidade de Aparecida-SP, também conhecida como "Aparecida do Norte" por seu cunho religioso, como estância turística.
Mas os argumentos não vingaram. A Procuradoria já havia rechaçado as alegações da Câmara de Bauru e disse, por exemplo, que o Legislativo não pode se considerar uma exceção para descumprir preceitos constitucionais.
"Aspecto relevante da laicidade importa na absoluta neutralidade do Estado, no sentido de não se adotarem posturas em benefício ou em detrimento das diversas igrejas ou religiões estabelecidas no território nacional", destacou o MP.
"Não compete ao Poder Legislativo municipal criar preferência por determinada religião - como o faz pela invocação a 'Deus', disponibilização da Bíblia e a exigência da leitura de trecho da Bíblia para iniciar a sessão legislativa na Câmara Municipal - voltado exclusivamente aos seguidores dos princípios dos credos monoteístas, alijando outras crenças presentes no tecido social brasileiro que não ostentem essa característica", completou.