28 de setembro de 2024
OPINIÃO

Pet não incomoda!

Por Thais Viotto. OABSP 356.564 | Diretora jurídica da ONG Naturae Vitae, mestre em direito
| Tempo de leitura: 5 min

AONG Naturae Vitae, em resposta ao texto "Pet incomoda?", de autoria da professora doutora Terezinha Santarosa Zanlochi, tem a dizer que a Constituição Federal de 1988, artigo 225, é o único diploma Constitucional a mencionar a tutela dos animais em toda a história das Constituições. Resta clara a mudança de paradigma no status deles no mundo jurídico.

Houve, a partir daí, a Constitucionalização do Direito dos animais. Sobre as obrigações com os animais, estas são do Poder Público e da sociedade, conforme o §1, inciso VII do artigo 225 da Magna Carta, incumbindo ao Poder Público as chamadas "políticas públicas".

Concordamos com uma das abordagens do texto que respondemos que parte da educação vem de "berço", os pais ou responsáveis devem ensinar o exercício da cidadania, o amor aos animais, o respeito a natureza etc, mas acreditamos que o conhecimento, é aprendido, aprimorado, que a sociedade avança, e a ONG tem como princípio que, para além das questões jurídicas, que trabalhamos diariamente, lutando pela efetivação dos direitos dos animais e da coletividade nos Tribunais, participando de Conselhos Municipais, temos como sendo de suma relevância passar para as pessoas a informação correta sobre as leis em vigor relacionadas à temática animal e, assim, cumprimos a nossa obrigação enquanto sociedade imposta pela Constituição Federal de 1988.

A primeira questão a ser esclarecida, com todo respeito, é que a Lei nº 13.131 de 2001, que fora citada no texto em questão, só é válida para a cidade de São Paulo Capital, não sendo válida para Bauru, pois é uma lei Municipal. Da mesma forma, a lei nº 14.262, de 2007, igualmente citada no texto, não tem qualquer validade no Estado de São Paulo, e obviamente Bauru, pois dispõe sobre a Taxa de Prestação de Serviços Ambientais do Estado de Santa Catarina.

Outrossim, data máxima vênia, ao que se refere a citação da aprovação do PL (projeto de lei) 1211/2021 que em tese teria alterado o Código de Trânsito Brasileiro, não houve finalização na tramitação legislativa, logo, não é lei, não há validade no mundo jurídico. Sobre a responsabilidade do proprietário, dono ou tutor, esta não é a mesma para o direito que a do cuidador ou tratador.

O Código Civil (Lei federal) disciplina a responsabilidade do tutor ou dono: "Art. 936. O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior". Se o animal tiver um dono ou tutor, será este o responsável em ressarcir os danos que este causar ao patrimônio de terceiro. Já os animais comunitários estão disciplinados em lei especial, a Lei Estadual de São Paulo, n. 12.916/2008, que os conceitua como sendo aqueles que estabelecem com a comunidade em que vivem laços de dependência e de manutenção, embora não possuam responsável único e definido.

A Lei especial prevalece em relação à norma geral, sendo que na especial as obrigações relacionadas aos animais comunitários estão na própria lei e são do Poder público e não do tutor ou tratado.

Então, a Prefeitura de Bauru deve recolher, castrar, vacinar e cadastrar os cuidadores e devolver os animais identificados na comunidade de origem, esses animais (comunitários) tem seus direitos conquistados, bem como as pessoas que cuidam deles, exercendo um "munus público". Nada trata a lei especial sobre responsabilização de cuidador ou tratador relacionada a danos. Tamanha importância do trabalho voluntário de cuidadores que a lei estadual de São Paulo de n. 16.982/2019 trouxe ao calendário oficial o "Dia do Protetor" e "Dia da proteção Animal", comemorados em data de 28 de abril.

Em 2022, foi apresentado pelo Conselho Municipal de Proteção e Defesa dos Animais mapeamento de animais comunitários para a Prefeitura de Bauru, Conselho que esta subscritora preside. Na época eram mais de 200 colônias (aglomerados de animais por toda cidade), porém, a Prefeitura não deu retorno com programa específico para estes. Fato é que a situação só não está pior pela dedicação de cuidadores que fazem o trabalho que pela Lei é da Prefeitura, e fazem, muitas vezes, sendo hostilizados por prestar esse serviço essencial e voluntário, passando por inúmeras humilhações, gastando dinheiro do bolso!

Frisamos e alertamos a todos que em caso de crime de maus tratos aos animais a pena atual de 2 a 5 anos de reclusão e pode ser aumentada se ocorrer a morte do animal, bem como perda da guarda, e sendo o acusado surpreendido em flagrante, a prisão é de rigor!

Esta é a forma qualificada de maus tratos e se aplica aos cães e gatos quando houver dolo, após alteração da Lei federal 9.605/1998 pela Lei Federal 14.064/2020. Jogar a ração e a água fora, por exemplo, pode ser enquadrado como este crime pela autoridade policial, caso alguém presencie, faça prova e denuncie, pois de forma dolosa se fez a opção de privar o animal de fome e sede. Para se diminuir o abandono de animais que fatalmente serão sendo vítimas de maus tratos, a solução não é responsabilizar cuidadores ou tratadores, mas cobrar que a Prefeitura Municipal de Bauru que cumpra a Lei e a decisão judicial após ser condenada em Ação Civil Pública (ACP) n. 0013777.87.2010.82.0071, promovendo de forma massiva, descomplicada, para ONGS, e população, a castração gratuita dos animais, não sendo a eutanásia de animais uma opção.

A ONG Naturae Vitae acompanha o caso em que a Prefeitura responde inquérito policial por crime de maus tratos aos animais, por mortes de cães e gatos ilegais no CCZ, muito embora na mesma ACP tenha sido condenada a se abster desta prática, considerada cruel pelo Tribunal.

Por fim, importante mencionar que não há lei que valha em Bauru que possa multar cuidadores de animais comunitários. A rua não é ambiente seguro para os animais, porém, não há lares para todos por conta do problema crônico que se instalou, ante a ausência de políticas públicas voltada para eles.

Há tempo de reverter a situação, que impacta em bem-estar animal e saúde publica, basta vontade política para execução de programas, de políticas públicas, até porque animais são vítimas humanas o tempo todos, sujeitos a doenças que nós transmitimos a eles, muito mais do que eles a nós.

Ledo engano quem pensa o contrário.