De família simples e trabalhadora, do bairro Santa Terezinha, em Belo Horizonte (MG), Anderson de Oliveira Rodrigues, hoje com 49 anos, era mais um garoto que sonhava em ser jogador de futebol, na posição de goleiro. Mas a vida tomou outro rumo: dos gramados para as quadras. Apaixonado pelo samba raiz, ele foi de office boy, aos 17 anos, para bicampeão olímpico de vôlei com a seleção brasileira. No primeiro ouro, em Atenas-2004, era jogador. No segundo, na Rio-2016, auxiliar-técnico. Também foi campeão mundial como jogador e medalha de prata na Pequim-2008.
Amante também da comida mineira bem temperada e torcedor do Atlético-MG, fora das quadras o atual técnico do novo time masculino de Bauru, o Sesi-SP, gosta de uma vida cadenciada, de curtir a família assistindo a uma boa série na TV e de viajar para o Nordeste. Anderson é casado com a ex-jogadora de vôlei Ana Paula Guth, juntos há 6 anos, e pai de dois meninos: João Francisco de 12 anos e Joaquim de 1 ano e meio.
JC - Como foi sua infância e o caminho até o vôlei aparecer na sua vida?
Anderson - Eu morava em uma casa com duas irmãs, a Adriane e a Geiza, além do meu pai Hércules, que era pintor de residência, vindo a falecer muito cedo, e a minha mãe Nair, que trabalhou em lavanderia. Éramos uma família que não tínhamos muitos recursos, mas nunca faltou vontade de trabalhar. Eu queria ser jogador de futebol, como goleiro. Fiz testes, joguei em alguns times quando moleque, mas não deu certo. Cheguei a pensar em ser policial civil também, depois de terminar os estudos, mas antes disso dei duro como office boy em um escritório. Desde a escola, com amigos, eu jogava vôlei por puro lazer. E sempre joguei bem, pela minha estatura (1,90m) e força. Até que um dia eu fui fazer um teste no juvenil no Clube de Oficiais da Polícia Militar de Belo Horizonte (BH), e passei. Isso em 1992. Eu tive, na verdade, medo desse teste: medo de ouvir não, da rejeição, mas superei e fiz a minha melhor escolha.
JC - Como foi esse processo de ser profissional?
Anderson - Lembro até hoje que minha mãe não entendia como seria isso: "trabalhar como jogador de vôlei". E meu primeiro chefe, quando eu era office boy, até me aconselhou: "isso não dá dinheiro, não". Mas eu insisti, porque vi a oportunidade e era aquilo que eu queria. E em 1994, no Minas Tênis Clube, cheguei para minha mãe, que era assalariada, com o primeiro pagamento no profissional, de R$ 1.500, que na época era 5 vezes o salário mínimo que ela ganhava.
JC - Você teve uma carreira muito vitoriosa como jogador, o que mais te marcou?
Anderson - Difícil escolher uma coisa só. Fui feliz, e ainda sou, neste esporte. Foram duas olimpíadas como jogador e uma como auxiliar, fui diversas vezes o maior pontuador de jogos e de campeonatos. Fiz quatro temporadas ótimas no Japão (NEC Blue Rockets): teve um jogo que fiz 62 pontos, é muita coisa. Joguei na Itália (Piacenza) e foram 10 anos com a seleção.
JC - Como foi a decisão de parar de jogar?
Anderson - Foi natural, simples até. Eu vi na temporada 2011/2012, pelo Minas, que não tinha a mesma força e explosão, e que os mais jovens estavam melhores do que eu. Tirei meu CREF (registro de Educação Física) e parei. Depois, recebi convite para trabalhar na comissão do próprio Minas, onde fui estatístico e, na sequência, auxiliar. Ainda em 2014 comecei como técnico na base, só que no feminino, em 2012.
JC - Como é o Anderson fora de quadra?
Anderson - Eu gosto de samba, hein, bastante. Toco violão, gosto de curtir com a família, mas nunca fui um "cara da noite", sempre apreciei a vida com moderação. Tanto é que a minha esposa me chama atenção porque tem vezes que eu fico vidrado na televisão. Gosto muito de séries. A propósito, você já assistiu à nova Ballers (na Netflix), do Dwayne Johnson, o "The Rock"? Assista, é muito bom!
JC - Quais suas referências no samba? Quem você curte?
Anderson - Nossa, são muitas: Pedrinho da Flor, Mauro Diniz, Roberto Ribeiro, Fundo de Quintal, Luiz Carlos da Vila, Toninho Geraes, André Jorge, Xande de Pillares, Alcione, Jovelina (Pérola Negra) e Teresa Cristina.
JC - Daqui em diante, quais seus objetivos? Sonha em comandar a seleção?
Anderson - Quero continuar conquistando títulos, como treinador, mas não me vejo na seleção, não. Claro, se vier um convite, aceito. Mas a seleção é algo muito fechado ali, para comissão, tem que ter indicação forte, então, não é algo que penso a respeito.