22 de dezembro de 2025
PALAVRA CANTADA

Editora registrou Palavra Cantada em 2021 e movimentou R$ 25 mi só em SP

Por André Fleury Moraes | da Redação
| Tempo de leitura: 3 min
Divulgação
Kits do projeto Palavra Cantada adquiridos pela Prefeitura de Bauru

A Movimenta Editora S.A registrou o ISBN (Padrão Internacional de Numeração de Livro) dos materiais relacionados ao Palavra Cantada há apenas dois anos, em 2021, e desde então movimentou mais de R$ 25 milhões em contratos com prefeituras municipais somente no Estado de São Paulo, segundo dados do Tribunal de Contas (TCE).

Nenhuma das vendas passou por processo licitatório, já que a Lei de Licitações garante a dispensa do procedimento quando não há condições de competividade. O ISBN obtido pela editora é uma espécie de "patente" sobre a edição das publicações registradas, o que exclui a concorrência e abre margem para se contratar diretamente o fornecedor.

Ao todo, a Movimenta vendeu R$ 25.335.129,50 em kits paradidáticos do Palavra Cantada desde que obteve o registro de propriedade industrial. A cifra corresponde aos contratos no âmbito do território paulista.

Em nível nacional, o montante é ainda maior, já que dezenas de municípios de diversos estados também adquiriram o pacote em contratos milionários.

O valor total de contratos com o Poder Público, porém, é ainda maior: R$ 62.519.306,75. A soma envolve, para além do Palavra Cantada, outros títulos sobre os quais a Movimenta tem exclusividade - como o "Matemática em Jogo", também chamado de Majog.

Uma das vendas envolve o município de Bauru, que em 2022 destinou R$ 5,2 milhões à editora para comprar o kit Palavra Cantada na Escola.

A negociação entre Bauru e a editora Movimenta foi célere. O processo de compra tramitou em caráter de urgência. O contrato foi em 5 de agosto e previu o pagamento da aquisição em até 30 dias após a entrega da nota fiscal.

Os R$ 5.295.048,00, valor integral da compra, foram encaminhados à empresa em 29 de agosto, e a editora recebeu o montante entre os dias 9 e 12 de setembro. Apesar da velocidade da aquisição, a implementação do projeto na rede municipal de ensino ainda não foi concluída.

Isso porque o contrato entre a Movimenta e a Prefeitura de Bauru previa um "treinamento" aos professores das escolas municipais a ser realizado em três etapas: apresentação de um "panorama geral", "oficina prática" e "apresentação aos brincantes".

Quase um ano depois da aquisição do Palavra Cantada, enquanto isso, o governo ainda não conseguiu finalizar os treinamentos. A iniciativa começou somente neste ano, em março, mas fracassou: o local escolhido pela prefeitura, o ginásio Darcy César Improta, não tinha ventilação, o que causou uma enxurrada de críticas por parte dos professores.

Em 16 de março, então, o governo mandou uma circular para os funcionários da Educação comunicando a suspensão dos treinamentos relacionados ao Palavra Cantada.

No ofício, o diretor de departamento da Secretaria de Educação admite "a necessidade de reorganizar os próximos encontros" e diz que em breve a pasta divulgará nova data para o processo, que ainda está na primeira etapa. Até agora, porém, não houve agendamento.

Sócio da Movimenta Editora até fevereiro deste ano, o empresário Otto Hinrichsen Júnior, morador de Recife (PE), é acusado na Justiça da Paraíba de fraude a licitação no âmbito da "Operação Calvários", deflagrada pelo Gaeco, um braço do Ministério Publico (MP).

Otto não era sócio da Movimenta enquanto pessoa física. Ele, na verdade, é dono da "Avancar Participacoes", que injetou R$ 1,7 milhão na editora.

Segundo a denúncia, Otto era representante da Cruz Vermelha do Brasil, entidade que gerenciou o Hospital do Trauma de João Pessoa por 11 anos. Em 2011, quando médicos do hospital entraram em greve, o então governador Ricardo Coutinho (PSB) implantou o sistema de Organizações Sociais (OSs) no gerenciamento dos hospitais - e encontrou a Cruz Vermelha.

A OS, porém, não é a Cruz Vermelha do sanitarista Oswaldo Cruz. É aí que entra a denúncia do MP: Otto, diz a denúncia, participou de uma negociação que combinou o pagamento de R$ 200 mil em propina para a Cruz Vermelha Brasileira para "emprestar o nome" à entidade que gerenciaria o Hospital do Trauma. O esquema da OS na Paraíba teria desviado R$ 20 milhões dos cofres públicos em favor de agentes políticos, diz o Gaeco. O JC não conseguiu contato com o advogado de Otto. A Movimenta Editora, por sua vez, pediu que a reportagem enviasse um e-mail com os questionamentos. Mas não respondeu às perguntas até a conclusão desta edição.