Diga-me qual é o seu passado e te direi quem és...
Diga-me qual é o seu passado e te direi quem és...
Texto: Renata Meffe
O assunto é instigante: Quem não gostaria de saber o que se passou na sua mais remota infância, na fase intra-uterina e até em uma suposta vida passada? Até o mais cético não poderia deixar de esboçar curiosidade. Mas a técnica da regressão, que já era praticada pelos egípcios, quatro mil anos antes de Cristo, pode ser utilizada para fins mais nobres do que a mera especulação ou satisfação da curiosidade. A regressão de memória para fins terapêuticos, introduzida no Brasil pela médica Maria Júlia Prieto Peres, conhecida como Terapia Regressiva Vivencial Peres ou Terapia Regressiva a Vivências Passadas (TRVP), é aplicada para remover as causas de sintomas patológicos, atenuar ou modificar padrões perturbadores de comportamento e promover o desenvolvimento pessoal do indivíduo.
Lúcia Cirino Tech, terapeuta formada pelo Instituto Nacional de Terapia Regressiva a Vivências Passadas de São Paulo, que atua em Bauru, explica que antes de iniciar o processo de regressão propriamente dito, terapeuta e paciente precisam de algumas sessões para que se detecte o que precisa ser revisto. Paralelamente às regressões, são organizadas, pelo terapeuta, sessões integrativas. "Na regressão, o paciente tem conhecimento das experiências traumáticas do passado, responsáveis por problemas atuais, mas esse é apenas um dos pontos para a transformação", afirma Lúcia.
Ela explica que durante a terapia, o paciente aprende como utilizar o conteúdo da vivência regressiva na solução de problemas do dia-a-dia. "É o que chamamos de redecisão. Ele passa a entender que os traumas vivenciados não exercerão mais influências prejudiciais na fase que atualmente atravessa, porque estão inseridos em outras circunstâncias. A partir daí, passa a contar com novas possibilidades de reorganizar a sua vida", afirma.
Registros
De acordo com Lúcia, a mente humana funciona como uma central registradora de eventos. "Ela grava as experiências, emoções e percepções do indivíduo, como um banco de dados. Através do método da regressão,
é possível recapitular os fatos que deixaram marcas".
Alguém muito ansioso, pode ter nas complicações do parto, a origem do seu problemas. Depressões, fobias, disfunções sexuais e doenças sintomáticas também podem ter suas raízes em traumas passados.
Técnicas
Para que o paciente inicie o processo regressivo, são empregadas técnicas de relaxamento físico e mental, desenvolvidas especificamente para esse fim. "No término da sessão regressiva, o paciente é conduzido, pelo terapeuta, de volta ao seu estado normal de vigília. E sente-se bem", garante. Segundo Lúcia, cerca de 10 sessões regressivas, intercaladas com as de integração, costumam ser suficientes para se trabalhar a fundo um determinado aspecto ou problema do indivíduo. "O tempo varia de acordo com a pessoa e a situação", completa.
Segundo a terapeuta, ao contrário do que o nome pode indicar, a Terapia Regressiva a Vivências Passadas não visa uma suposta vida anterior do indivíduo. "Ao contrário da Terapia de Vidas Passadas (TVP), na TRVP é feito um rastreamento para se detectar a origem do problema. Ele não precisa estar necessariamente em uma suposta vida passada, pode estar na infância, no momento do nascimento, etc."
Mal necessário
Apesar de geralmente as vivências virem acompanhadas de sofrimento, já que se revive situações difíceis ou traumáticas, o resultado final é compensador.
"A mudança interior reflete positivamente no relacionamento familiar, social, profissional, afetivo, etc. Pelo fato do paciente mergulhar profundamente em seu psiquismo, os conhecimentos adquiridos possibilitam mudanças profundas em seu comportamento e em seus valores de vida", garante Lúcia.
Relato resumido de uma vivência regressiva:
Identificação da paciente: A.B., 29 anos, feminina, economista, solteira. Mora com a mãe, com quem tem dificuldade de se relacionar. Não confia nas pessoas em geral e põe barreiras para qualquer tipo de relacionamento interpessoal, o que lhe causa muitos transtornos.
Motivo da consulta: Medo de altura desde a infância, que até há um ano atrás, não lhe trazia maiores problemas, pois, como ela dizia, não olhava pelas janelas de prédios altos, nem olhava para baixo quando caminhava por algum viaduto. A situação começou a ficar crítica quando assumiu um ótimo emprego de secretária executiva, em uma empresa multinacional, e, de sua mesa de trabalho, no 21º andar, avistava parte de uma grande avenida. Isto foi lhe causando angústia, cada vez mais pronunciada.
Procurou médicos, que lhe receitaram tranquilizantes e ansiolíticos, que a levavam a ter sono pela manhã e faziam-na chegar ao trabalho indisposta ou atrasada.
O processo foi se acentuando, levando-a à ansiedade. Fez psicoterapia durante 10 meses, sem resultados para o seu objetivo: deixar de ter medo de altura. Por indicação de uma amiga, procurou a TRVP.
Regressões:
1ª Vivência: Vivenciou uma cena, onde se vê como um rapaz de cerca de 25 anos, andando tranquilamente em companhia do irmão, olhando as terras que ambos receberam por herança, devido ao recente falecimento do seu pai. Ao chegarem à beira de um precipício, o irmão o empurra traiçoeiramente e ele cai pela ribanceira abaixo, vindo a morrer. Vivencia essa cena com um grito muito alto, manifestando intenso conteúdo emocional de medo e revolta: contrai todo o corpo, apresenta taquicardia, muita ansiedade e expressão de terror.
2ª Vivência: Vivenciou episódio (no útero materno), em que sua mãe cai do ápice de uma escala, com a qual estava arrumando um arranjo de samambaias no teto de sua casa. Ao vivenciar a queda da mãe, o feto capta os seus sentimentos, emoções e sensações e a paciente contrai o corpo. Apresenta taquicardia e muito medo.
3ª Vivência: Nascimento: Vivenciou seu nascimento, sentindo a sua cabeça deslizando da mão da parteira, e também uma sensação de queda, que vivencia com intenso conteúdo emocional.
Momentos mais traumáticos:
Ao ser perguntado pela terapeuta, qual o momento de maior sofrimento, mais doloroso, mais traumático e marcante de todas as vivências que experimentou, a paciente respondeu que foi aquele que sentiu o empurrão traiçoeiro de seu irmão, com a queda no precipício.
Decisão:
A terapeuta pergunta à paciente quais os pensamentos, emoções, sentimentos que experimentou nesse referido momento traumático, que a influenciaram em definir o padrão de comportamento relacionado ao problema de medo de altura, que está trabalhando nessa sessão. Ela responde: "Nunca mais vou me aproximar de lugares altos e nunca mais vou confiar em ninguém".
Redecisão:
A paciente é inquirida se deseja mudar essa decisão, que ficou gravada em sua mente inconsciente, causando-lhe os desajustes atuais. Ela responde afirmativamente. A terapeuta solicita-lhe que elabore uma frase de redecisão, (afirmativa e na 1ª pessoa do presente do indicativo), que sintetize seu momento atual. Ela formula a seguinte frase: "Eu me aproximo de lugares altos, com autoconfiança, cautela e segurança" e "a partir de agora, confio nas pessoas dentro de meu bom senso".
Esta frase é gravada em sua mente inconsciente, e com ela a paciente trabalha orientada pela terapeuta (conforme técnicas específicas) de TRVP, em sua reformulação de padrão de comportamento.
Conclusão: Após várias sessões de regressão e de psicoterapia, a paciente libertou-se do medo de altura e, segundo ela, melhorou muito em sua dificuldade de relacionamento interpessoal (inclusive com a mãe), tornando-se livre, descontraída e alegre. Casou-se dez meses após a terapia, tendo um relacionamento conjugal normal.
O caso foi acompanhado por seis anos, não apresentando recidivas. Foram mencionados nomes, datas e outros dados desconhecidos pela paciente, que posteriormente pesquisados, tiveram confirmação.
Fonte: Instituto Nacional de Terapia de Vivências Passadas
Relato
A psicóloga Vanessa (nome fictício), 32 anos, começou a fazer a terapia regressiva há nove meses e garante estar satisfeita com os resultados. "Às vezes, as seções de regressão são cansativas, mas os resultados aparecem".
Ela está trabalhando o tema rejeição e diz que já sentiu melhoras significativas em sua postura perante as pessoas e fatos. "Não vivenciei nenhuma situação de vida passada, apenas da minha infância, de quando eu era bebê", conta.
De acordo com Vanessa, depois das regressões tudo passa a fazer sentido. "Fica evidente que eu passei mesmo por aquilo, que não se trata de imaginação. Passei a compreender melhor a razão de algumas das minhas atitudes", afirma.
Serviço: A terapeuta Lúcia Cirino Tech atende na rua Araújo Leite, 27-41, sala 18. O telefone é
(014) 223-2776. O telefone do Instituto Nacional de Terapia de Vivências Passadas (INTVP) é (011) 284-8929.