Levantei domingo cedo,
calcei as minhas botinas,
Falei pros meus companheiros:
Pode esquentar as turbinas,
Bote óleo no motor,
bote água e gasolina,
Engraxe bem as canelas,
passa sebo e parafina,
Vamos terminar a rota
no lugar que as cobras grossas,
Engole as cobras mais finas.
Descemos Tietê abaixo,
onde o progresso floresce,
Não vou falar de São Paulo
porque todos já conhecem.
Cheguei no rio Paraná
para a balsa atravessar,
É ai que a perna amolece,
Quando o vapor apitou,
a balsa desencostou,
Comecei fazer uma prece.
Eu disse pro co-piloto:
Não agüento mais um assopro,
Você leva a caminhonete.
No Mato Grosso do Sul
a gente ia avançando,
No retrovisor eu via
a fronteira se distanciando.
A nossa caminhonete
parecia um aeroplano.
Um dos companheiros disse:
Tá bonito, estou gostando.
Eu disse: É só o começo,
pelo pouco que conheço
a estrada está começando.
Era quase meio dia
quando entramos em Goiás,
Falo muito desse estado,
porque o trem é bom de mais,
Estradas cheias de curvas,
seus rios de águas turvas
e os verdes buritizais.
Porém o que ainda me inflama,
é a beleza das goianas,
isso eu não esqueço mais.
Eram seis horas da tarde
quando eu vi o Mato Grossão,
De longe eu vi o Araguaia
palpitou meu coração.
Comentei com os companheiros:
Valeu gastar esse dinheiro,
pra sentir essa emoção.
De longe meus olhos viam
terras que conheciam,
Só pela televisão.
Dormimos num hotelzinho
naquelas beiras de rio,
No outro dia bem cedo,
a viagem prosseguiu.
Entre serras e cerrados,
Invernadas campo e gado,
Tamanduá, tatu e bugio
Aves grandes e pequenas,
beija-flor, gavião e ema,
Até onça a gente viu.
Na estrada pra Canarana,
caminhão de boi e banana
Não parava de passar.
O amigo do meu lado,
perguntou com o ar cansado:
_ Falta muito pra chegar?
Eu lhe disse: Não reclamas,
você só chega em Canarana,
Quando essa estrada acabar.
Parei pra almoçar num posto
E ter o carro abastecido
O frentista contou com gosto
O que por ele foi vivido
Prestem atenção neste causo
Diz ele que foi verídico
Certa vez um caminhoneiro
Passou naquela hospedagem
Comprou uma lata de óleo
Pra botar nas engrenagens
Pagou-lhe tudo na nota
Diz que só faria a troca
Com maior quilometragem
Depois de rodar bastante
Já era quase noite escura
Parou pra trocar o óleo
E por ter pouca cultura
Ele fez a operação
Numa linda região
Nas margens dó rio tingura
Depois de trocar o óleo
Jogou o recipiente
Por falta de consciência
Agiu como um delinqüente
De cima da ponte ele viu
A lata sumir no rio
Levada pela corrente
O frentista foi pescar
Já depois de muito tempo
Nas margens do rio tingura
Montou seu acampamento
Jogou o anzol na água
E permaneceu atento
Sentiu algo ser fisgado
Achou que tinha enroscado
Por falta de movimento
Ele recolheu a linha
Lentamente com cuidado
Percebeu que no anzol
Tinha um treco pendurado
Depois que tirou da água
Viu que uma lata enferrujada
Era o que tinha pescado
Resolveu abrir a lata
Pra fazer uma inspeção
Lá dento tinha um pintado
Vejam só que judiação
Cresceu nadando ali dentro
Sempre a mesma posição
Por ter crescido enlatado
Cabeça encontrou com o rabo
Causou-lhe admiração
Lázaro Carneiro é pescador e contador de histórias